Teve início na quarta-feira (29), na Costa do Marfim, o julgamento de 18 acusados de participar do massacre ocorrido em 2016 em um resort de praia na cidade de Grand Bassam. A segurança foi reforçada pelas forças armadas no prédio que abriga as sessões em Abidjan, o centro econômico do país. As informações são da agência Reuters.
Embora todos os acusados estejam sendo julgados, apenas quatro deles estão sob custódia. Os demais serão julgados à revelia, vez que continuam foragidos. Todos são estrangeiros, mas as nacionalidades deles não foram reveladas. Acredita-se que o atentado tenha sido planejado no Mali, epicentro da onda jihadista que atinge a África.
As acusações contra os réus incluem terrorismo, homicídio, tentativa de homicídio, abrigo de criminosos e posse ilegal de armas de fogo e munições, segundo o promotor de justiça Richard Adou. A expectativa é de que o julgamento dure várias semanas.
O ataque ao resort deixou 19 pessoas mortas e 33 feridas, tendo sido o primeiro do tipo ocorrido na Costa do Marfim. As vítimas tinham nacionalidades diversas: nove marfinenses, quatro franceses, um libanês, um alemão, um macedônio, um maliano, um nigeriano e uma pessoa não identificada.
Já os autores do massacre eram três seguidores da Al-Qaeda, organização extremista que à época vinham expandindo sua presença no continente africano. Os radicais, que usaram rifles automáticos para disparar contra as pessoas, foram mortos pelas forças de segurança.
Quando assumiu a autoria, a Al-Qaeda alegou que o ataque foi uma resposta às operações antiterrorismo das forças armadas da França no continente africano.

Por que isso importa?
Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, Estado Islâmico (EI) e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito como a África, onde são representadas por grupos afiliados regionais. O Afeganistão, agora sob o comando do Taleban, também é um porto seguro para muitos jihadistas.
Na África Ocidental, em particular, a violência das organizações jihadistas tem aumentado. Nos últimos três anos, foram registrados mais de 5,3 mil ataques terroristas, com a morte de cerca de 16 mil pessoas. A informação foi divulgada no início de maio deste ano pelo ministro da Defesa de Gana, Dominic Nitiwul, durante reunião de representantes dos países da região.
O continente africano ganhou importância em meio às derrotas impostas às grandes organizações jihadistas em outras regiões, caso do Oriente Médio. Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que o grupo dominava desde 2014. O EI, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas do grupo na Síria.
Em fevereiro deste ano, o EI sofreu um duro golpe quando o exército norte-americano anunciou ter matado Abu Ibrahim al-Hashimi al-Qurashi, principal líder da facção. Durante uma operação antiterrorismo dos EUA na Síria, ele explodiu uma bomba que carregava junto ao corpo, matando também mulheres e crianças que o acompanhavam. Já em novembro, o próprio grupo revelou que Abu al-Hassan al-Hashemi al-Qurashi, sucessor de Abu Ibrahim, também foi morto.
No caso da Al-Qaeda, que igualmente mantém facções relevantes na África, a sobrevivência do grupo pode ser explicada também pela tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. “As avaliações dos Estados-Membros até agora sugerem que a Al-Qaeda tem um porto seguro sob o Taleban e maior liberdade de ação”, diz relatório da ONU (Organização das Nações Unidas) divulgado no final de maio.
“A Al-Qaeda permanece no sul e leste do Afeganistão, onde tem uma presença histórica”, diz o relatório. “O grupo supostamente tem de 180 a 400 combatentes, com as estimativas dos Estados-Membros inclinando-se para o número mais baixo”, prossegue o documento, que cita cidadãos de Bangladesh, Índia, Mianmar e Paquistão como sendo integrantes da facção.
O ex-líder da organização Ayman al-Zawahri, inclusive, foi morto em território afegão em um ataque das forças armadas dos EUA no dia 1º de agosto .
Anteriormente, a ONU já havia lembrado que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alegou que um filho de Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.
No Brasil
Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.
Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.
Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.
Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.
Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.
“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.