Nos últimos anos, juntas militares assumiram o poder em Burkina Faso, no Mali e no Níger através de golpes de Estado, usando como justificativa para a tomada de poder a incapacidade dos governos anteriores de enfrentar a insurgência islâmica. Desde então, a situação só piorou nesses três países, fortalecendo fações da Al-Qaeda e do Estado Islâmico que representam uma ameaça crescente inclusive além das fronteiras africanas.
Em janeiro deste ano, o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, declarou que a África se tornou o “novo epicentro” do terrorismo global. A afirmação foi endossada no recente Índice Global de Terrorismo do Instituto de Economia e Paz (IEP), sediado em Sydney, na Austrália. O documento leva em conta os dados de 2023.
Burkina Faso assumiu a liderança do ranking, com 8.571 pontos, enquanto o Mali aparece na terceira posição, com 7.998. Entre eles está Israel, que saltou 24 posições e passou a ocupar o segundo lugar em razão dos ataques de 7 de outubro de 2023 realizados pelo Hamas.
“O epicentro do terrorismo agora mudou definitivamente do Oriente Médio para a região do Sahel Central da África Subsaariana”, diz o IEP, destacando que o crescimento dos grupos extremistas já vinha sendo notado antes dos golpes de Estado. “O aumento do terrorismo no Sahel nos últimos 15 anos foi dramático, com mortes aumentando 2.860% e incidentes aumentando 1.266% durante este período.”
Os autores do relatório, entretanto, destacam o impacto das tomadas de poder. “Burkina Faso, Mali e Níger são responsáveis pela maioria das mortes por terrorismo na região. Todos os três enfrentam futuros incertos, tendo sofrido com golpes, governança fraca e relações frágeis com países vizinhos, exemplificados por sua recente retirada da CEDEAO.”
De acordo com o relatório do IEP, somente em Burkina Faso foram quase duas mil mortes em ataques terroristas em 258 incidentes registrados no ano passado, quase um quarto de todas as mortes por terrorismo do mundo.
“O impacto do terrorismo em Burkina Faso tem aumentado a cada ano desde 2014, com o terrorismo também aumentando em seus vizinhos, Mali e Níger”, afirma o documento. “Em Burkina Faso, em 2023, as mortes por terrorismo aumentaram 68%, embora os ataques tenham diminuído em 17%.”
A situação nas três nações está relacionada também à expulsão das forças ocidentais pelas juntas militares. Franceses e norte-americanos, que mantinham acordos de segurança com Burkina Faso, Mali e Níger, tiveram que retirar suas tropas, dando espaço a mercenários russos que são agora os principais parceiros desses governos.
Na opinião de analistas ouvidos pela agência Reuters, é uma questão de tempo até que os insurgentes consigam assumir o controle majoritário de um desses países. Se isso vier a ocorrer, a nação em questão poderia se tornar um grande campo de treinamento para terroristas e uma plataforma de lançamento de ataques para além das fronteiras nacionais e até continentais.
“Eu realmente não vejo os regimes em Mali, Níger e Burkina resistindo para sempre. Eventualmente, um deles vai cair ou um deles vai perder uma quantidade substancial de território, o que Burkina Faso já fez”, disse à Reuters o editor do site Long War Journal e especialista em grupos jihadistas Caleb Weiss. “Então, estamos lidando com um Estado jihadista ou vários Estados jihadistas no Sahel.”
A opinião é compartilhada por Seidik Abba, presidente do think tank francês CIRES. “Os dois grandes grupos terroristas veteranos estão ganhando terreno. A ameaça está se espalhando geograficamente“, declarou, referindo-se à Al-Qaeda e ao EI.