Médico a serviço da OMS é sequestrado por homens armados no norte do Mali

Cidade de Menaka, onde trabalha a vítima, fica em uma área com forte presença de facções ligadas ao Estado Islâmico

Um grupo de homens armados não identificados sequestrou na segunda-feira (23), no norte do Mali, um médico que serve à OMS (Organização Mundial de Saúde). A informação foi confirmada no dia seguinte por Tedros Ghebreyesus, diretor-geral da entidade, e reproduzida pela agência Associated Press (AP).

A vítima foi identificada como Mahamadou Diawara, que há três anos serve à OMS na cidade de Menaka. Ele atua especialmente em áreas remotas, onde a insegurança é maior devido à atuação de grupos extremistas islâmicos.

Segundo relatou a ONU (Organização das Nações Unidas), o carro onde Diawara estava foi atacado, com o médico sendo levado pelos agressores. Embora tenha sido agredido, o motorista do veículo em que o médico estava não foi raptado e se recupera dos ferimentos.

O chefe da OMS se manifestou através do Twitter. “Lamentamos o sequestro do colega da OMS, Dr. Mahamadou Diawara, que foi retirado de seu carro por agressores não identificados em 23 de janeiro em Menaka, Mali. Estamos trabalhando com as autoridades locais para investigar o sequestro e garantir o rápido retorno de nosso colega para sua família”, disse Tedros.

De acordo com a agência de saúde da ONU, Diawara vinha “liderando esforços para fornecer assistência médica a comunidades que geralmente são remotas e enfrentam riscos de insegurança e violência”. A entidade disse ainda que “o motivo do sequestro não está claro”.

As autoridades malianas também não foram capazes de determinar, ao menos no primeiro momento, se os agressores estão ligados a alguma facção extremista. A região de Menaka, porém, tem forte atuação sobretudo de insurgentes associados ao Estado Islâmico (EI).

“Embora não esteja claro se o grupo é o responsável pelo sequestro, deve haver a preocupação de que ele seja transferido para o grupo em troca de dinheiro”, disse Rida Lyammouri, membro sênior do Centro de Políticas para o Novo Sul, um instituto de pesquisa baseado no Marrocos e focado em políticas econômicas e sociais.

Missão de paz da ONU em Menaka, no Mali, dezembro de 2015 (Foto: Minusma/Flickr)
Por que isso importa?

O Mali vive um período de instabilidade que começou com o golpe de Estado em 2012, quando grupos rebeldes e insurgentes islâmicos tomaram o poder no norte do país. De quebra, a nação, independente desde 1960, viveu em maio de 2021 o terceiro golpe de Estado em um intervalo de apenas dez anos, seguindo o que já havia ocorrido em 2012 e também em 2020.

A mais recente turbulência política começou semanas antes do golpe, com a demissão do primeiro-ministro Moctar Ouane pelo presidente Bah Ndaw. Reconduzido ao cargo pouco depois, Ouane não conseguiu formar um novo governo, e a tensão aumentou com a falta de pagamento dos ingressos dos professores. O maior sindicato da categoria, então, começou a se preparar para uma greve.

Veio a noite do dia 24 de maio, quando o coronel Assimi Goita, vice-presidente do país, destituiu Ndaw e Ouane de seus cargos e ordenou a prisão de ambos na capital Bamako. Segundo ele, os dois líderes civis violaram a carta de transição ao não consultarem os militares na formação do novo governo.

Ao contrário do que ocorreu em golpes anteriores, que contaram com apoio popular, desta vez a maior parte da população rejeitou a tomada de poder por Goita, que derrubou o governo de transição recém-instituído e assumiu o comando do país. A população civil não foi às ruas protestar contra o militar, mas usou as redes sociais para mostrar sua insatisfação.

Em meio à instabilidade política, cresceu no país a presença de grupos jihadistas ligados à Al-Qaeda e principalmente ao Estado Islâmico (EI), o que levou a uma explosão de violência nos confrontos entre extremistas e militares, com milhares de civis entre as vítimas.

Os conflitos, antes concentrados no norte do Mali, se expandiram inclusive para os vizinhos Burkina Faso e Níger. Assim, a região central maliana se tornou um dos pontos mais violentos de todo o Sahel africano, com frequentes assassinatos étnicos e ataques extremistas contra as forças do governo.

A situação tornou-se ainda mais delicada devido à retirada das tropas da França, que até agosto de 2022 colaboravam com o governo nacional nas operações de contraterrorismo. A decisão de Paris de evacuar seus militares gerou dúvidas quanto à capacidade de o país africano sustentar os avanços obtidos na luta contra os insurgentes.

Quem assumiu o espaço deixado pelos franceses foi o Wagner Group, um grupo russo de mercenários que firmou acordo de cooperação com Goita. Fontes sustentam que o pagamento pelos serviços da organização russa seria de US$ 10,8 milhões por mês, dinheiro que viria da extração de minerais.

Segundo o general francês Laurent Michon, comandante da Operação Bakhane das forças armadas da França, a retirada de suas tropas não tem nenhuma relação com a chegada dos mercenários, como se especulava. Ele diz que o governo militar maliano sempre deixou claro seu desejo de “nos ver partir sem demora”.

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