EUA investigam possível roubo de informações militares confidenciais pela chinesa Huawei

Equipamentos instalados em torres de telefonia perto de bases militares são suspeitos de espionar as forças armadas norte-americanas

Washington está investigando a possibilidade de a empresa chinesa Huawei utilizar equipamentos instalados em torres de telefonia móvel nos EUA para captar dados confidenciais das forças armadas norte-americanas e repassá-las a Beijing. A informação foi confirmada à agência Reuters por duas pessoas familiarizadas com o assunto que pediram anonimato.

Os potenciais alvos seriam bases militares e silos de mísseis, dando ao governo chinês acesso a dados de exercícios militares e prontidão de tropas norte-americanas. A investigação foi aberta no início de 2021 pelo Departamento do Comércio, e a Huawei foi intimada à época para detalhar sua política de compartilhamento de dados com entidades estrangeiras.

Torres de celular no Estado de Utah, nos EUA (Foto: Nils Rasmusson/Unsplash)

Dependendo do resultado da investigação, a Huawei pode ser considerada uma ameaça à segurança nacional dos EUA. Nesse caso, as já existentes restrições impostas à companhia chinesa poderiam aumentar consideravelmente. Num caso extremo, ela poderia ser impedida de operar no país, com todas as empresas que eventualmente usem equipamentos dela sendo obrigadas a trocá-los rapidamente.

Para Jim Lewis, especialista em tecnologia e segurança cibernética do centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês), um think tank de Washington, o risco é real. “Se você pode colocar um receptor em uma torre (de celular), pode coletar sinais, e isso significa que pode obter inteligência. Nenhuma agência de inteligência deixaria passar uma oportunidade como essa”.

Brendan Carr, membro da Comissão Federal de Comunicações dos EUA (FCC, na sigla em inglês), é mais um que enxerga risco na situação. Ele analisa especificamente o caso da base aérea de Malmstrom, no Estado de Montana, que supervisiona campos de mísseis e tem nas proximidades torres de celular com tecnologia Huawei.

Segundo ele, há o risco de que dados de smartphones obtidos pela Huawei possam revelar movimentos de tropas perto dos locais onde a empresa opera: “Há uma preocupação muito real de que parte dessa tecnologia possa ser usada como um sistema de alerta antecipado se acontecer, Deus me livre, um ataque de mísseis ICBM (míssil balístico intercontinental, da sigla em inglês)”.

Questionada sobre as suspeitas, a Embaixada chinesa em Washington se manifestou. “O governo dos EUA abusa do conceito de segurança nacional e poder estatal para fazer tudo para suprimir a Huawei e outras empresas de telecomunicações chinesas sem fornecer nenhuma prova sólida de que constituem uma ameaça à segurança dos EUA e de outros países”.

Por que isso importa?

Huawei enfrenta crescente desconfiança global na construção de redes 5G, com sua presença rejeitada em vários países. Austrália, Nova Zelândia, Canadá, Estados Unidos e Reino Unido, por exemplo, baniram a infraestrutura da fabricante por medo de que a China possa usá-la para espionagem

Sede da chinesa Huawei nos Estados Unidos (Foto: Flickr)

A desconfiança é baseada na suposta proximidade da companhia com o governo chinês. Autoridades ocidentais citam a Lei de Inteligência Nacional da China, de 2017, segundo a qual as empresas nacionais devem “apoiar, cooperar e colaborar com o trabalho de inteligência nacional”, o que poderia forçar a gigante da telefonia a trabalhar a serviço do Partido Comunista Chinês (PCC).

Um caso em particular se enquadra nesse cenário. Em janeiro de 2017, a União Africana descobriu que os servidores de sua sede, na capital etíope Adis Abeba, enviavam diariamente, durante a madrugada, dados sigilosos a um servidor na China e que o prédio estava repleto de microfones escondidos. Os servidores foram trocados, mas um problema semelhante se repetiu em 2020, quando os novos servidores foram invadidos por hackers chineses que roubaram vídeos de vigilância das áreas interna e externa.

Não por coincidência, o prédio havia sido construído com financiamento chinês, por uma construtora chinesa. E os servidores originais, aqueles de 2017, eram chineses. Esse episódio, com o qual Beijing nega ter relação, explica a desconfiança generalizada com a infraestrutura digital proveniente da China.

No Brasil, o aumento da presença da Huawei na rede de telefonia vai na contramão da tendência global. São da empresa chinesa mais de 80% das antenas que retransmitem sinal das atuais redes 2G, 3G e 4G brasileiras. E, de acordo com conteúdo patrocinado publicado em portais como O Globo em maio de 2021, a companhia dizia ser responsável por mais de cem mil quilômetros de fibra óptica no país.

A alternativa encontrada pelo governo brasileiro para reduzir o impacto de eventuais brechas de segurança foi a criação de uma rede 5G governamental exclusiva, sem a presença de infraestrutura chinesa. “Hoje, a Huawei não está apta a participar da rede privativa, segundo o que foi colocado pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e pela nossa portaria”, disse o ministro das Comunicações, Fábio Faria, no início de novembro, quando foi realizado o leilão das bandas de 5G.

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