Relatório de segurança diz que terrorismo é uma ameaça real em Trinidad e Tobago

Onda extremista pode ser impulsionada pela repatriação de radicais locais atualmente detidos em campos da Síria e do Iraque

Um relatório anual de segurança divulgado na terça-feira (17) pela Agência de Serviços Estratégicos (SSA, na sigla em inglês) de Trinidad e Tobago afirma que o país caribenho corre o risco de vivenciar um onda de terrorismo islâmico. As informações são do jornal local Newsday.

De acordo com o documento, a origem do problema são terroristas que deixaram o país para lutar ao lado de grupos radicais na Síria e no Iraque. Mesmo detidos em campos de refugiados no Oriente Médio, suas ideias seduzem simpatizantes na nação caribenha e geram a ameaça de ações terroristas realizadas por esses lobos solitários, possivelmente recrutados pela internet.

“Existem aproximadamente 130 combatentes terroristas estrangeiros (FTFs, na sigla em inglês) locais detidos nos campos da Síria e do Iraque. Números conflitantes estão sempre próximos, dado o fluxo restrito de informações dessas áreas”, diz o relatório, que cita não apenas homens, mas também familiares de extremistas, mulheres e crianças.

Soldados de Belize, Jamaica, Trinidad e Tobago e México em exercício conjunto de segurança em 2017 (Foto: nara.getarchive.net)

Uma preocupação da SSA é a de que a legislação federal venha a permitir a repatriação desses terroristas atualmente detidos na Síria e no Iraque. “Os simpatizantes – incluindo atores locais e radicalizados que defendem e desafiam legalmente o Estado – podem eventualmente se tornar mais desencantados e hostis ao Estado”, diz o texto.

A atenção também se volta a indivíduos que habitualmente são um alvo dos propagandistas de grupos radicais, como imigrantes ilegais, presidiários e membros de famílias historicamente radicais. O relatório diz que essa “continua sendo uma ameaça sempre presente”.

Por ora, como ocorreu em todo o mundo nos últimos anos, a ameaça terrorista é reduzida em Trinidad e Tobago. Mas o cenário pode mudar, conforme os radicais atualmente inativos venham a colocar novos planos em prática.

“A ameaça terrorista local, embora adormecida, pode ressurgir, pois esses atores podem ser galvanizados pelos vários líderes comunitários, possíveis repatriações de FTFs e a percepção de que o Estado é lento em reconhecê-los”, afirma o documento.

Parte desse período de calmaria deve-se justamente ao fato de que muitos radicais passaram o ano de 2020, auge da pandemia de Covid-19, mais preocupados em tentar repatriar os terroristas locais detidos no Oriente Médio.

“Há a expectativa de que alguns políticos em busca de apoio, pessoas influentes na fraternidade jurídica, bem como certos empresários simpatizantes, possam juntar-se ao apelo ao governo na esperança de fornecer o impulso para o repatriamento”, diz o relatório.

Por que isso importa?

Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, Estado Islâmico (EI) e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações para se manterem vivas inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito, sobretudo na África, onde são representadas por grupos afiliados regionais.

Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que a organização dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas na Síria.

Em janeiro deste ano, o exército norte-americano impôs nova derrota ao EI com o anúncio da morte de Amir Muhammad Sa’id Abdal-Rahman al-Mawla, principal líder da facção. Ele morreu durante uma operação antiterrorismo na Síria, em mais um duro golpe contra o grupo, que em 2019 havia perdido o líder anterior, Abu Bakr al-Baghdadi.

No caso da Al-Qaeda, além de igualmente manter facções relevantes na África, também ajudou a fortalecer o grupo a tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. De acordo com a ONU (organização das Nações Unidas), o território afegão pode virar um porto seguro para a organização jihadista e suas afiliadas, bem como “potencial ímã para combatentes terroristas de outras regiões viajarem ao país”.

“Não há sinais recentes de que o Taleban tenha tomado medidas para limitar as atividades de combatentes terroristas estrangeiros no país. Pelo contrário, os grupos terroristas gozam de maior liberdade lá do que em qualquer momento da história recente”, diz relatório da ONU publicado em fevereiro deste ano.

O documento destaca, ainda, que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alega que um filho do ex-terrorista Osama Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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