Beijing ergue muro e impõe vigilância absoluta para isolar comunidade uigur

Aldeia de Chuluqai, onde vivem 13,5 mil pessoas, tem agora somente um portão de acesso, vigiado 24 horas pela polícia chinesa

A pequena aldeia de Chuluqai, na região de Xinjiang, está agora isolada do resto da China. Um muro foi erguido pelo governo para fechar a comunidade, parte de uma nova política que tende a atingir outros vilarejos. As autoridades impuseram vigilância absoluta aos cerca de 13,5 mil habitantes, que estão entre as vitimas da repressão de Beijing aos uigures, classificada por alguns países e grupos humanitários como genocídio. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

Conforme se acumulam as denúncias de abusos contra os uigures em Xinjiang, Beijing insiste em afirmar que controla a minoria étnica por questão de segurança, sob a justificativa de combater o extremismo religioso. A mais nova medida nesse sentido é o isolamento total das aldeias rurais da região, sendo Chuluqai um dos alvos.

Polícia militar chinesa em Beijing (Foto: PxHere/Divulgação)

A política de isolamento das comunidades estaria em vigor desde 2017 e foi testemunhada por um repórter da Agência France Presse (AFP) que sobrevoou Xinjiang. Ele apurou que os residentes foram inclusive orientados a permanecerem dentro de suas casas, com as portas trancadas, parte das medidas de monitoramento impostas pelas autoridades.

O governo chinês chama a campanha de “Uma aldeia, um portão”, referência à porta única de entrada e saída criada em cada aldeia depois que os muros são erguidos. Uma agente de polícia local ouvida pela RFA admitiu que a nova política está em implantação.

“Não sei quantas aldeias ainda faltam serem cercadas”, disse ela, que não quis ser identificada porque foi instruída a não falar com a imprensa.

Um homem que trabalha como vigia em Chuluqai disse que o portão é “de ferro eletrificado e cercado por muros de dois metros de altura com arame farpado”, sendo guardado por duas pessoas durante o dia e cinco à noite. “Ele abrange todas as partes da aldeia e você só pode entrar e sair por este único portão”, afirmou.

Entradas e saídas também são controladas, inclusive para checar se os pedestres ou motoristas têm algum parente que tenha sido eventualmente preso pelo governo da China. “Os policiais farão as verificações e decidirão se podem entrar ou não”, disse ele.

O mesmo homem afirmou que instalações semelhantes estão sendo erguidas em outras aldeias da região. Segundo ele, estrangeiros são proibidos de entrar, possivelmente uma forma de Beijing manter a comunidade internacional no escuro quanto ao tratamento dispensado aos uigures.

Por que isso importa?

A província de Xinjiang faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século” e diz que os campos de reeducação, para onde muitos uigures eram enviados, foram desativados.

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