Denúncia de que a China espiona os EUA a partir de Cuba gera novo retrocesso na relação entre os países

Episódio coloca em risco a visita de Antony Blinken a Beijing, que marcaria uma possível retomada no diálogo entre chineses e norte-americanos

Na quinta-feira (8), o The Wall Street Journal revelou que a China negocia a instalação de uma base em Cuba para espionar os Estados Unidos, denúncia prontamente negada pelo porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca John Kirby. Porém, a acusação foi reforçada no sábado (10) por outra fonte do governo norte-americano, esta ouvida pelo site Politico. O episódio ampliou a crise diplomática entre os dois países e colocou em risco a visita do secretário de Estado norte-americano Antony Blinken a Beijing, uma rara oportunidade de diálogo entre os dois governos durante o período mais tenso desde que as relações foram retomadas, em 1979.

Segundo a denúncia original, Cuba teria autorizado o governo chinês, mediante pagamento bilionário, a instalar na ilha uma base de onde seria possível interceptar comunicações eletrônicas dos EUA. Tal base ainda não teria sido construída, mas novas revelações feitas posteriormente indicam que Beijing há anos realiza operações de inteligência a partir do território cubano.

A rede CNN foi uma que fez novas revelações complementares à denúncia original. Um funcionário do governo e duas outras fontes anônimas confirmaram que ao menos desde 2019 existe um acordo entre chineses e cubanos para que Beijing opere bases de vigilância na ilha.

Havana, Cuba: base chinesa para espionar os Estados Unidos? (Foto: JF Martin/Unplash)

Max Baucus, que por quase três anos foi embaixador dos EUA na China, durante o governo Obama, se disse “surpreso” com o desmentido de Kirby e declarou que a “presença” chinesa em Cuba não é nova. Embora a capacidade de inteligência da China não seja, segundo ele, “tão forte quanto alguns temem”, fez uma ressalva: “Acho que a China gostaria para torná-la muito mais forte.”

De acordo com uma das fontes ouvidas pela CNN, as instalações de Beijing em Cuba servem para monitorar o tráfego marinho, a base de Guantánamo e as comunicações norte-americanas.

O The Washington Post foi mais um a confirmar a denúncia de espionagem chinesa baseada em Cuba. E igualmente alega que o problema remonta a 2019. “Não é uma ação nova e mais agressiva”, disse uma fonte do governo. “É certamente um padrão de comportamento incômodo e preocupante. Temos um problema com isso e estamos trabalhando para combatê-lo.”

Do lado chinês, sobraram desmentidos. Wang Webin, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, disse que “não estava ciente” de qualquer instalação chinesa operando em Cuba para espionar os EUA.

“É sabido que os EUA são especialistas em perseguir sombras e se intrometer nos assuntos internos de outros países”, disse Wang, que redirecionou a acusação a Washington. “Os EUA são o campeão global de hacking e uma superpotência de vigilância.”

Relações comprometidas

O casos se soma a outros anteriores na lista de incidentes que ajudaram a comprometer a relação entre Beijing e Washington. Nas últimas semanas, um jato da força aérea chinesa interceptou um avião militar de vigilância dos EUA sobre o Mar da China Meridional, manobra perigosa registrada em vídeo pelos norte-americanos. E navios das marinhas dos dois países quase se chocaram no Estreito de Taiwan.

Nenhum episódio, no entanto, gerou tamanha repercussão como o do suposto balão espião chinês que sobrevoou o território norte-americano por oito dias antes de ser derrubado em fevereiro por um caça F-22 na costa da Carolina do Sul. Na ocasião, o incidente levou Blinken a adiar uma visita que faria à China, um desdobramento que pode se repetir agora com a crise de Cuba.

Recentemente, a China rejeitou um convite do secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, para um encontro com a contraparte chinesa em Singapura. Na ocasião, Blinken ressaltou a importância de que sejam estabelecidas “linhas de comunicação regulares e abertas” entre os ministros de Defesa dos dois países, sendo que posteriormente reagendou a visita para 18 de junho.

Agora, porém, o People’s Daily, jornal oficial do Partido Comunista Chinês (PCC), sugeriu que a ida de Blinken talvez tenha que ser adiada. “Desta vez, a mídia dos EUA afirma mais uma vez que Blinken pode visitar a China em breve, enquanto transmite ‘notícias falsas’ de que a China pretende construir uma instalação de espionagem em Cuba”, disse o periódico.

Tags: