Escalada de tensão entre China e Filipinas exige intervenção dos EUA, alertam analistas

Promessa de Washington de defender Manila não basta, e medidas efetivas são necessárias para a situação não fugir ao controle

Nos últimos meses, tornaram-se frequentes os incidentes entre navios da China e das Filipinas no Mar da China Meridional, com ao menos dois episódios de colisões entre embarcações. Segundo analistas ouvidos pela rede CNN, a situação chegou ao limite e exige uma ação mais dura dos EUA, até para evitar que mortes sejam registradas e que isso desencadeie um conflito militar direto com Beijing.

Para os especialistas, o episódio mais preocupante ocorreu no último final de semana, quando um barco da Guarda Costeira chinesa usou canhões de água e colisões propositais para danificar navios filipinos em missões de reabastecimento na Ilhas Spratly, um arquipélago alvo de disputa entre as duas nações.

Situação semelhante havia ocorrido em outubro, quando embarcações chegaram a colidir ao menos duas vezes durante uma tentativa chinesa de obstruir a missão de reabastecimento realizada pelas Filipinas.

Navio da Marinha das Filipinas, em outubro de 2019 (Foto: Flickr)

Segundo Ray Powell, diretor do projeto SeaLight de segurança nacional, da Universidade de Stanford, ocorrências como a do final de semana deixam claro que a qualquer momento vidas podem ser perdidas em função das hostilidades. “O ciclo de escalada é preocupante”, disse ele.

Mais uma vez, como já se tornou frequente, Washington se manifestou após o episódio e deixou clara sua posição. Mas não passou das palavras, o que incomoda alguns especialistas.

“Os Estados Unidos apoiam os nossos aliados filipinos face a estas ações perigosas e ilegais”, afirmou o Departamento de Estado em comunicado. “Estas ações refletem não apenas o desrespeito imprudente pela segurança e pelos meios de subsistência filipinos, mas também pelo direito internacional”.

A porção de terra reivindicada pelos dois países está dentro da Zona Econômica Exclusiva (ZEE) das Filipinas, região que o país chama de Mar das Filipinas Ocidental. A missão regular de reabastecimento, frequentemente assediada por navios chineses, tem como destino um posto militar mantido pelas Filipinas no intuito de formalizar a posse da área, batizada Second Thomas Shoal.

O posto militar nada mais é que um antigo navio encalhado e ocupado por militares filipinos. A China, como parte de sua reivindicação territorial nas Ilhas Spratly, constantemente pede a Manila que remova a embarcação. Como os pedidos não são atendidos, passou a assediar as missões de reabastecimento.

De acordo com Collin Koh, pesquisador da Escola de Estudos Internacionais S. Rajaratnam, de Singapura, o assédio chinês parece mais focado nos EUA que propriamente nas Filipinas. “As ações recentes aparentemente apontam para a tentativa chinesa de investigar fraquezas para explorar e testar até onde Washington iria pelo seu aliado.”

Ele também afirmou que é uma questão de tempo até que mortes sejam registradas no Mar da China Meridional. E acrescentou que um eventual incidente com vítimas, mesmo se causado pelos canhões de água ou pelas colisões propositais geradas pelos navios da Guarda Costeira, podem ser caracterizados como um ataque armado. E isso levaria a uma resposta militar norte-americana.

De acordo com o pesquisador Eric Sayers, a resposta já demorou demais para ser dada. “Eles estimam que não o faremos porque, em grande parte, não o fizemos nos últimos 13 anos, desde que este tipo de comportamento começou”, escreveu ele na rede social X, antigo Twitter, cobrando uma ação mais incisiva capaz de frear os ânimos de Beijing

A posição é semelhante à de Carl Schuster, ex-capitão da Marinha norte-americana que já serviu como diretor de operações do Centro Conjunto de Inteligência do Comando do Pacífico dos EUA. “A menos que [os EUA] posicionem forças, Beijing não verá razão para evitar a escalada”, disse ele.

Por que isso importa?

Na última década, o Mar da China Meridional tem sido palco de inúmeras disputas territoriais entre a China e outros reclamantes do Sudeste Asiático, bem como de uma disputa geopolítica com os Estados Unidos quanto à liberdade de navegação nas águas contestadas. 

Os chineses ampliaram suas reivindicações sobre praticamente todo o Mar da China Meridional e ali ergueram bases insulares em atóis de coral ao longo dos últimos dez anos. Washington deu sua resposta com o envio de navios de guerra à região, no que classifica como “missões de liberdade de operação”.

Embora os EUA não tenham reivindicações territoriais na área, há décadas o governo norte-americano tem enviado navios e aeronaves da Marinha para realizar patrulhas, com o objetivo de promover a navegação livre nas vias marítimas ​​internacionais e no espaço aéreo.

Segundo John C. Aquilino, almirante da Marinha dos Estados Unidos e chefe do Comando Indo-Pacífico, a razão da presença de Washington na região é “prevenir a guerra por meio da dissuasão e promover a paz e a estabilidade, inclusive envolvendo aliados e parceiros americanos em projetos com esse objetivo”.

Já a atuação de Beijing, de acordo com o almirante, é preocupante. “Acho que nos últimos 20 anos testemunhamos o maior acúmulo militar desde a Segunda Guerra Mundial pela República Popular da China”, afirmou. “Eles avançaram todas as suas capacidades, e esse acúmulo de armamento está desestabilizando a região”.

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