Farmacêuticas dos EUA fizeram testes clínicos em hospitais militares chineses, dizem deputados

Empresas teriam usado instalações do exército da China em Xinjiang, onde Washington acusa Beijing de genocídio contra os uigures

Dois congressistas norte-americanos, membros do Comitê Seleto da Câmara sobre o Partido Comunista Chinês (PCC), questionaram um órgão governamental dos EUA nesta semana a respeito de testes clínicos supostamente realizados por grandes empresas farmacêuticas do país em Xinjiang, na China, em parceria com o Exército de Libertação Popular (ELP). As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

Os deputado John Moolenaar, do Partido Republicano, e Raja Krishnamoorthi, do Democrata, enviaram uma carta à Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA, na sigla em inglês), órgão do governo dos EUA, questionando sobre a prática, embora não tenham revelado os nomes das empresas suspeitas. Washington acusa Beijing de genocídio na região, onde vive a minoria étnica dos uigures.

Urumqi, capital de Xinjiang, com as montanhas de Yamalik ao fundo (Foto: Wikimedia Commons)

“Por mais de uma década, parece que as empresas biofarmacêuticas dos EUA conduziram testes clínicos com organizações militares da China, e especificamente com centros médicos e hospitais afiliados ao Exército de Libertação Popular (ELP), para determinar a segurança e eficácia de novos candidatos a medicamentos antes da aprovação”, diz o documento

Na carta, os legisladores destacam rapidamente o lado humanitário. “Dada a repressão histórica e a discriminação médica contra minorias étnicas nesta região, há preocupações éticas significativas em torno da realização de ensaios clínicos [em Xinjiang].”

O questionamento central, entretanto, é focado em questões de segurança nacional. Segundo os deputados, a “propriedade intelectual crítica [norte-americana] corre o risco de ser transferida para o ELP ou ser cooptada sob a Lei de Segurança Nacional da República Popular da China (RPC).”

Dois hospitais que levam o nome o ELP são citados pelos congressistas como tendo sediado os testes, um deles para avaliar a eficácia de um medicamento contra Alzheimer. Os autores da carta afirmam que “a transferência de dados de ensaios clínicos em estágio inicial, incluindo a composição química do próprio medicamento, envolve dados extremamente sensíveis.”

Por que isso importa?

A província de Xinjiang faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes linguísticas e étnicas. Ali vive a comunidade uigur, uma minoria muçulmana de raízes turcas que sofre perseguição do governo chinês, com acusações de abusos diversos.

Os uigures, cerca de 11 milhões, enfrentam discriminação da sociedade e do governo chinês e são vistos com desconfiança pela maioria han, que responde por 92% dos chineses. Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Em agosto de 2022, a ONU divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O relatório, porém, não citou a palavra “genocídio” usada por alguns países ocidentais. O governo do presidente Joe Biden, dos EUA, foi o primeiro a usar o termo para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e a Lituânia se juntou ao grupo mais recentemente.

A China nega as acusações de que comete abusos em Xinjiang e diz que as ações do governo na região têm como finalidade a educação contraterrorismo, a fim de conter movimentos separatistas e combater grupos extremistas religiosos que eventualmente venham a planejar ataques terroristas no país. Beijing costuma classificar as denúncias como “a mentira do século”.

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