A Justiça de Hong Kong condenou dois jornalistas do extinto jornal digital Stand News pelo crime de sedição. São as primeiras sentenças do gênero impostas a profissionais da imprensa desde que o território retornou ao domínio da China em 1997. As informações são do site Hong Kong Free Press.
Os réus são o ex-editor-chefe da publicação Chung Pui-kuen e o ex-editor-chefe interino Patrick Lam. A pena, que será anunciada no dia 26 de setembro, pode chegar a dois anos de prisão.
A acusação contra os dois se baseia em crime não previsto na antiga versão da lei de segurança nacional, imposta pela China em 2020 em reação aos protestos pró-democracia do ano anterior. Porém, tribunais locais usam os poderes conferidos pela lei para aplicar normas da era colonial que previam a sedição.
A promotoria usou 17 artigos publicados pelo Stand News para justificar a acusação, sendo que 11 deles foram considerados sediciosos. Argumentou que o veículo, com o aval dos editores, tentou incitar o ódio da população contra o governo, citando inclusive entrevistas com manifestantes pró-democracia que agora estão igualmente presos.
Chung foi responsabilizado pela publicação de dez dos 11 artigos considerados sediciosos, enquanto o outro texto foi atribuído a Lam. O juiz Kwok Wai-kin afirmou na sentença que veículo de imprensa “tornou-se até uma ferramenta para difamar e caluniar o governo central”.
Lam, que não compareceu ao julgamento por questões de saúde, escreveu uma carta que foi lida pelo tribunal. Ele citou o Stand News como um pilar da liberdade de imprensa em Hong Kong em meio ao crescimento da repressão no território, na sequência dos protestos populares por democracia em 2019.
“Acredito que a principal razão pela qual o Stand News conseguiu sobreviver por sete anos foi porque os leitores queriam ler notícias que realmente não fossem influenciadas por corporações, poderes ou partidos políticos”, dizia a carta de Lam.
Os dois jornalistas já estão presos, Chung há mais de 11 meses, e Lam há dez. Considerando que o tempo já cumprido será descontado após anuncio das penas, a expectativa é de que até lá já tenham cumprido cerca de metade do tempo de cárcere.
Por que isso importa?
Após ser transferido do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa de 2019.
A resposta de Beijing aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que deu ao governo de Hong Kong poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. O antigo texto vinha sendo usado até março deste ano, quando uma nova lei, ainda mais dura, foi aprovada.
Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação têm diminuído cada vez mais, com o aumento da repressão aos dissidentes graças à lei. Já as autoridades de Hong Kong reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território.
O Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.
Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”