Navios chineses empregam trabalhadores da Coreia do Norte em condições de trabalho forçado

Testemunhos indicam que alguns norte-coreanos não pisam em terra há oito anos, com salários pagos diretamente ao governo

Um recente relatório da Environmental Justice Foundation (EJF), uma ONG baseada no Reino Unido, denuncia a utilização de trabalho forçado de cidadãos da Coreia do Norte em embarcações chinesas de pesca em águas profundas, prática que viola os direitos humanos e as sanções impostas pela ONU (Organização das Nações Unidas). A investigação detalha a situação de trabalhadores mantidos no mar por anos, segundo relato da rede Radio Free Asia (RFA).

De acordo com o relatório, a frota pesqueira chinesa tem empregado tripulantes norte-coreanos sob condições extremas. Esses trabalhadores são transferidos secretamente entre diferentes navios para evitar a fiscalização em portos estrangeiros, com salários diretamente remetidos ao regime de Pyongyang.

As autoridades das Ilhas Maurício interceptaram seis trabalhadores norte-coreanos em 2022, quando um destes navios atracou em Port Louis e revelou a extensão do problema. A Resolução 2397 do Conselho de Segurança da ONU, adotada em 2017, obrigava a repatriação de todos os norte-coreanos que estivessem gerando renda no exterior até dezembro de 2019, destacando o descumprimento desta medida.

Chineses são responsáveis pela maior fatia de pesca ilegal do mundo (Foto: Wikimedia Commons)

Testemunhos coletados pela EJF indicam que alguns norte-coreanos não pisam em terra há oito anos, com esforços intensos sendo realizados para ocultar sua presença a bordo das embarcações. A prática sugere um nível de cumplicidade e conhecimento tanto dos capitães quanto dos proprietários dos navios, apontando para uma violação deliberada das restrições internacionais.

Lin Jian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, em uma coletiva recente, afirmou desconhecer o relatório, mas reiterou que a China conduz suas atividades de pesca de acordo com as leis e regulamentos internacionais, sem elaborar sobre a cooperação específica com a Coreia do Norte.

“Deixe-me dizer mais amplamente que a China sempre realiza pesca offshore de acordo com leis e regulamentos. A cooperação relevante da China com a RPDC (República Popular Democrática da Coreia, nome oficial da Coreia do Norte) é conduzida dentro da estrutura do direito internacional”, disse Lin.

Por que isso importa?

Além dos abusos aos direitos humanos, os pesqueiros chineses são responsáveis também pela maior fatia de pesca IUU (ilegal, não declarada e não regulamentada, da sigla em inglês) em todo o mundo.

O alerta de diversos governos ao redor do mundo para o avanço das milícias da China em águas internacionais está ancorado em uma prática recorrente de navios pesqueiros chineses que ganhou contornos globais. Primeiro, os navios se afastam das águas nacionais. Já fora da jurisdição, desligam o sistema de rastreamento por satélite e invadem mares proibidos sem serem detectados, uma prática proibida pelas leis internacionais.

A delimitação marítima começou em 1982, na Convenção da ONU sobre o Direito do Mar. À época, os Estados-Membros concordaram em controlar os recursos marítimos dentro de uma ZEE (zona econômica especial) de até 200 milhas marítimas. Além desse raio, são águas internacionais.

Acusadas de pesca ilegal, as embarcações com bandeiras da China não só geram uma crise ambiental, como desafiam as fronteiras geopolíticas. A ilegalidade leva a perdas econômicas dos governos e compromete a subsistência dos pescadores nativos e das empresas da cadeia de abastecimento de pescado locais.

É uma equação simples: sem essa fonte de renda, as regiões atingidas sofrem com o aumento da pobreza. Os países menos desenvolvidos são mais vulneráveis, devido à falta de recursos para combater e monitorar a pesca de forma eficaz.

Tags: