Paraguai fortalece vínculo com Taiwan após eleição, mas pode ser forçado a rever posição

Presidente eleito Santiago Peña tende a manter os laços de quase 70 anos com a ilha, embora fale em ampliar comércio com Beijing

A vitória de Santiago Peña na eleição do Paraguai, no domingo (30), é um alento para Taiwan. O Partido Colorado, que seguirá no poder, tende a manter os laços de quase 70 anos com a ilha autogovernada, afastando assim a chance de redirecionar o relacionamento diplomático para a China, como cogitavam candidatos derrotados. A questão comercial, porém, pode forçar o novo presidente a rever sua posição.

“Temos uma relação diplomática e histórica com Taiwan de mais de 60 anos, baseada em princípios e valores democráticos que acreditamos serem fundamentais para uma sociedade como a paraguaia”, disse Peña, de acordo com a rede Deutsche Welle (DW).

Santiago Peña, presidente do Paraguai (Foto: WikiCommons)

A embaixada taiwnaesa no país sul-americano se manifestou após o pleito. “Parabéns ao povo paraguaio, que mostra ao mundo o poder democrático dos cidadãos por meio de seus votos. Parabenizamos o presidente eleito Santiago Peña e o vice-presidente eleito Pedro Alliana. Continuaremos a trabalhar nesta relação frutífera de parceiros de prosperidade”, diz um texto postado no Facebook.

Apesar do alinhamento diplomático com Taiwan, Peña disse que faz parte de seu plano de governo a ampliação do comércio com a China. Ele não citou como isso será feito, e o desafio tende a ser grande. Isso porque Beijing considera a ilha parte de seu território, por conta do princípio “Uma Só China“, e tem imposto restrições comerciais a nações que reconhecem a autonomia de Taipé.

Diante desse cenário, a posição do novo presidente não será facilmente sustentada. A questão chinesa no Paraguai foi bastante debatida na eleição. Foi puxada pelo lobby agrícola do país, que figura entre os dez maiores exportadores de carne bovina do mundo e é o quarto maior exportador de soja. Isso talvez force o candidato eleito a rever os laços com Taiwan.

O volume comercial entre Assunção e Beijing dobrou nos últimos oito anos e é muito maior do que entre o país sul-americano e os EUA, segundo o Comtrade da ONU (Organização das Nações Unidas), um repositório de dados do comércio internacional. No entanto, isto é impulsionado pelas importações, vez que as exportações a partir do Paraguai rumo à economia número dois do mundo continuam minúsculas.

Com base nesses dados, o rival derrotado de Peña, Efrain Alegre, candidato de centro-esquerda, defendia uma mudança de aliança de Taiwan para a China. Ele alegava justamente que a lealdade à ilha por parte de Assunção dificulta o comércio de soja e carne bovina com Beijing.

Mesmo os EUA e seus aliados da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), que fazem oposição militar à China, mantêm relações diplomáticas exclusivamente com Beijing, em boa parte para sustentar as relações comerciais com a segunda maior economia global. O Paraguai é parte do restrito grupo de 13 países que segue no sentido oposto.

Influência na américa Latina

A vitória de Peña representa um revés em meio a inúmeras vitórias chinesas na América Latina, onde o governo de Xi Jinping vem aumentando cada vez mais sua influência. Recentemente, quem deixou a relação com Taiwan e direcionou-a a Beijing foi Honduras. O governo chinês tinha esperança de fazer o mesmo após o pleito paraguaio.

A situação levou a presidente taiwanesa Tsai Ing-wen a viajar para Guatemala e Belize a fim de dar um gás na relação com os dois últimos parceiros da América Central, sinalizando esforços de seu governo para impedir que novas rupturas diplomáticas aconteçam.

Na visão de David Castrillon-Kerrigan, professor-pesquisador sobre questões relacionadas à China na Universidade Externado da Colômbia, não é só Taiwan que vem sendo derrotada na América Latina. Segundo ele, governo dos EUA está “perdendo o controle” da América Latina.

“Para países como Honduras, não reconhecer o governo de Beijing significava perder oportunidades”, disse Castrillon-Kerrigan, destacando uma situação que agora se repete no Paraguai. “Os Estados Unidos estão definitivamente perdendo influência em todas as frentes, especialmente na frente econômica, mas também diplomática, política e culturalmente”.

Entre 2005 e 2020, os chineses investiram mais de US$ 130 bilhões na América Latina, segundo o Instituto de Paz dos Estados Unidos. O comércio entre a China e a região também disparou, devendo chegar a mais de US$ 700 bilhões até 2035.

Tamanho poder de influência chinês também vem da iniciativa multibilionária Nova Rota da Seda (BRI, na sigla em inglês, de Belt And Road Initiative), que ofereceu aos países em desenvolvimento portos, ferrovias, usinas de energia e outras infraestruturas, financiados por empréstimos concedidos a taxas de mercado. Em meio às tensões crescentes com Washington, essa cifra astronômica investida na América Latina parece dar a Beijing o retorno político esperado.

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