Patinadora olímpica dos EUA é alvo de esquema de perseguição a dissidentes chineses

Alysa Liu, que participou dos Jogos Olímpicos de Inverno 2022, esteve na mira de agentes que perseguem ativistas anti-Beijing fora da China

A patinadora olímpica norte-americana Alysa Liu e o pai dela, Arthur Liu, um ex-refugiado político, estão entre os alvos de uma operação de espionagem coordenada pelo governo chinês, segundo o Departamento de Justiça (DOF, da sigla em inglês) dos EUA. A ação teria sido executada por agentes acusados de perseguir e sufocar críticas anti-Beijing feitas por ativistas chineses em território norte-americano. As informações são da agência Associated Press (AP).

Em entrevista concedida na quarta-feira (16), Arthur Liu relatou que foi procurado pelo FBI (Departamento Federal de Investigação, da sigla em inglês) em outubro passado e informado sobre o esquema, mesma época em que sua filha treinava para os Jogos Olímpicos de Inverno em Beijing. Ele não contou nada para Alysa de modo a evitar sustos e distrações em meio à preparação da atleta.

“Acreditamos que Alysa tinha uma chance muito boa de fazer parte da equipe olímpica e realmente estávamos com muito medo”, disse Arthur. A patinadora encerrou sua participação na sétima posição.

A patinadora olímpica americana Alysa Liu e seu pai Arthur Liu (Foto: Arquivo pessoal/Alysa Liu)

O DOJ informou na quarta que cinco homens foram presos, acusados de participarem de um esquema que envolvia perseguição e assédio a dissidentes chineses nos EUA. Arthur Liu disse que ele e sua filha foram incluídos na queixa criminal como “Dissidente 3” e “membro da família”, respectivamente. Ele contou que saiu da China aos 20 anos, depois de participar de protestos contra o Partido Comunista Chinês (PCC) após o massacre da Praça da Paz Celestial em 1989.

O histórico levou Liu a temer pela segurança da filha nos nos Jogos de Inverno de Beijing. Mas, no final, permitiu que ela competisse mediante garantias do DOJ e do Comitê Olímpico dos EUA de que Alysa estaria protegida por dois seguranças em tempo integral durante sua permanência na China.

“Eles provavelmente estão apenas tentando nos intimidar, de alguma forma nos ameaçar para não dizermos nada. Causar problemas a eles e dizer qualquer coisa política ou relacionada a violações de direitos humanos na China”, disse Arthur Liu. “Eu estava preocupado com a segurança dela. O governo dos EUA fez um bom trabalho protegendo-a”.

China contra-ataca

A China falou sobre as acusações por meio do porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Zhao Lijian. Segundo ele, Beijing “não estava ciente dos detalhes” que envolvem as alegações e declarou que o país se “opõe firmemente à calúnia dos EUA” ao fazer uma disso uma questão.

“A China sempre pede aos chineses que cumpram as leis e regulamentos dos países anfitriões, e nunca pediríamos aos nossos cidadãos que se envolvessem em atividades que violem as leis locais”, disse Zhao em coletiva de imprensa na quinta-feira (17), acrescentando que os chamados “esquemas de assédio transnacionais” seriam forjados.

Post no Instagram originou espionagem

Ao chegar aos EUA, Arthur Liu fixou residência na área da baía de São Francisco. Lá, cursou faculdade de Direito e foi responsável pela maturação de uma das atletas mais promissoras do país. Na entrevista, revelou que Alysa só foi conhecer sua terra natal ancestral durante os Jogos de Inverno, em fevereiro deste ano. Segundo ele, a filha teve recepção calorosa do povo e da mídia chineses, que a têm como uma delas.

No entanto, Liu conta que a investigação de espionagem feita pelo DOJ constatou que a postura política da atleta havia sido descoberta pela China através de uma publicação no Instagram, onde Alysa deu sua opinião sobre violações de direitos humanos contra os uigures, minoria étnica que vive na região de Xinjiang.

“Eu meio que aceitei que minha vida fosse assim por causa do que escolhi fazer em 1989: falar contra o governo. E sei que o governo chinês estenderá suas longas mãos a qualquer canto do mundo”, disse Arthur Liu. “Vou continuar a aproveitar a vida e viver a vida como eu quero viver. Não vou deixar isso me derrubar e não vou deixá-los ter sucesso”, disse.

Por que isso importa?

A comunidade uigur habita a região autônoma de Xinjiang, no noroeste da China. A província faz fronteira com países da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas.

Denúncias dão conta de que Beijing usa de tortura, esterilização forçada, trabalho obrigatório e maus tratos para realizar uma limpeza étnica e religiosa em Xinjiang.

Estimativas apontam que um em cada 20 uigures ou cidadãos de minoria étnica já passou por campos de detenção de forma arbitrária desde 2014. O governo chinês admite a existência de tais campos, que abrigam mais de um milhão de pessoas, mas alega que eles servem para educação contraterrorismo.

O governo de Joe Biden, nos EUA, foi o primeiro a usar o termo “genocídio” para descrever as ações da China em relação aos uigures. Em seguida, Reino Unido e Canadá também passaram a usar a designação, e mais recentemente a Lituânia se juntou ao grupo.

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