Sob desconfiança, pressão chinesa impulsiona diálogos pelo fim do conflito em Mianmar

Pressão de Beijing leva insurgentes a considerarem negociações com a junta militar, apesar de ataques aéreos e tensões locais

Grupos insurgentes étnicos de Mianmar consideram negociar com a junta militar ante à pressão da China para encerrar o conflito. Beijing, que possui importantes interesses econômicos na nação do Sudeste Asiático, incluindo oleodutos e projetos de mineração, busca uma solução pacífica para estabilizar o vizinho, abalado desde o golpe militar de 2021. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

Os rebeldes do Exército de Libertação Nacional Ta’ang (TNLA), baseado no estado de Shan, declararam nesta semana que estão disposto a negociar. A declaração destaca a mediação chinesa como positiva e reitera o compromisso do grupo com um sistema de união federal que respeite o direito à autodeterminação das minorias étnicas. “Estamos prontos para cooperar até que as condições favoráveis sejam alcançadas”, afirma o texto.

A China tem adotado uma postura estratégica, mantendo diálogo com rebeldes e o governo militar, mas impondo restrições, como o fechamento de fronteiras e corte de suprimentos essenciais. Analistas avaliam que essa pressão tem surtido efeito.

“A China está pressionando ambos os lados”, observou Hla Kyaw Zaw, especialista em assuntos de Mianmar. “O TNLA também leva em conta o impacto do conflito sobre os civis de sua região.”

O general à frente da junta militar de Mianmar, Min Aung Hlaing (Foto: FMT/Creative Commons)

Apesar da abertura para negociações, os insurgentes pedem que Beijing pressione a junta a cessar ataques aéreos em áreas civis, que, segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), têm causado um aumento significativo no número de vítimas. Contudo, não houve resposta da China quanto a essa demanda.

O líder da junta militar, Min Aung Hlaing, fez novos apelos por paz, afirmando que questões políticas devem ser resolvidas por vias políticas. Entretanto, grupos insurgentes como o TNLA encaram tais iniciativas como fachada, impulsionadas por interesses externos.

“Se os países da região cortarem o fluxo financeiro para o regime, ele enfraquecerá”, defendeu Kyaw Zaw, porta-voz do Governo de Unidade Nacional (NUG, na sigla em inglês), que estabeleceu um regime paralelo em desafio à junta militar

Insatisfação popular

Para os analistas, embora pareça aproximar as partes em conflito de um acordo, a influência da China no conflito paralelamente alimenta o descontentamento popular. “Nem a ONU nem os EUA têm capacidade de conter essa intervenção”, afirmou Sai Kyi Zin Soe, especialista em assuntos birmaneses.

O papel de Beijing, visto como uma ingerência ativa nos assuntos internos de Mianmar, é alvo de protestos, incluindo uma explosão no consulado chinês na cidade de Mandalay. Ainda assim, a influência do aliado forçou o general a considerar a possibilidade de eleições diretas.

Durante visita recente à China, Hlaing, comprometeu-se a finalizar o censo nacional até o final de 2024 e, em seguida, conduzir eleições “livres e justas”. Em reunião com o primeiro-ministro chinês, Li Qiang, em 6 de novembro, Hlaing afirmou que 63% da população já foi recenseada e que o processo será concluído antes do novo ano.

No entanto, os opositores, assim como os rebeldes, questionam a legitimidade das promessas da junta. “Nenhum país que valoriza os direitos humanos pode acreditar que um regime responsável por mortes e opressão em larga escala é capaz de realizar uma eleição justa”, diz Aye Mya Mya Myo, eleita para o Parlamento da região de Yangon em 2020.

Além disso, a junta implementou novas leis de registro eleitoral que desqualificam diversos partidos, incluindo a Liga Nacional pela Democracia (NLD), que venceu as eleições de 2020 com ampla maioria antes de ser deposta pelo golpe. Essa medida é vista como uma tentativa de consolidar o poder militar e limitar a participação de opositores no processo político.

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