Sob influência da China, Ilhas Salomão suspendem visitas de navios dos EUA

Decisão ocorre alguns dias após uma embarcação da guarda costeira dos EUA não conseguir atracar para reabastecimento

O governo das Ilhas Salomão suspendeu temporariamente todas as visitas de embarcações norte-americanas a seus portos, uma medida que aumenta o temor em torno da crescente influência chinesa na pequena nação insular. A informação foi divulgada pela Embaixada dos EUA em Camberra e reproduzida pelo site The Defense Post.

“Os Estados Unidos receberam uma notificação formal do governo das Ilhas Salomão sobre uma moratória em todas as visitas navais, aguardando atualizações nos procedimentos de protocolo”, disse a Embaixada em comunicado.

A decisão ocorre alguns dias após uma embarcação da guarda costeira dos EUA não conseguir atracar nas Ilhas Salomão porque o governo local não respondeu a um pedido de reabastecimento de provisões e combustível.

O USCGC Oliver Henry realizava uma operação de combate à pesca ilegal quando fez o pedido para atracar em Honiara, algo que teria sido acertado previamente. Diante da falta de resposta, rumou para Papua Nova Guiné, onde foi autorizado a parar.

“Os Estados Unidos estão desapontados que o navio da guarda costeira dos EUA não tenha conseguido fazer essa parada planejada em Honiara”, disse o comunicado. “Vamos continuar a acompanhar de perto a situação”.

Posteriormente, o primeiro-ministro Manesseh Sogavare disse que a medida vale para todas as nações, não apenas para os EUA, de acordo com a agência Reuters.

“Pedimos aos nossos parceiros que nos dessem tempo para revisar e colocar em prática nossos novos processos, antes de enviar mais solicitações para que navios militares entrassem no país”, afirmou o premiê. “Isso se aplicará universalmente a todas as embarcações navais visitantes”.

Primeiros-ministros das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare, e da China, Li Keqiang (Foto: fmprc.gov.cn)
Disputa por influência

O episódio ocorre em meio à disputa por influência entre a China e o Ocidente na pequena nação insular. No final de março, vazou uma carta de intenções indicando que Beijing planejava estabelecer uma base militar nas Ilhas Salomão, o que fez soar o alarme na vizinha Austrália e em seus aliados no Indo-Pacífico.

No documento, uma empresa chinesa de engenharia “demonstra intenção de estudar a oportunidade de desenvolver projetos navais e de infraestrutura em terrenos arrendados para a Marinha do Exército de Libertação Popular, para a Província de Isobel, com direitos exclusivos por 75 anos”.

Na mesma época em que a carta veio a público, o premiê das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare, confirmou que estava prestes a assinar um acordo de segurança com a China. Na ocasião, ele definiu como “insultantes” as preocupações australianas e neozelandesas de que o pacto poderia causar instabilidade na segurança da região.

Pouco depois do anúncio, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Wang Wenbin, afirmou que o acordo já havia sido assinado, de acordo com o jornal britânico Guardian. Ele não especificou quando e onde ocorreu a assinatura, que também foi confirmada pela embaixada chinesa em Honiara.

Por que isso importa?

As Ilhas Salomão vivem um período de intensa agitação social, que especialistas associam a questões étnicas e históricas, à corrupção estatal e ao movimento do governo para estreitar laços com a China. Há três anos, o governo local trocou a aliança diplomática com Taiwan por uma com Beijing.

Para James Batley, um ex-alto comissário australiano para as Ilhas Salomão e especialista em assuntos sobre Ásia-Pacífico da Universidade Nacional Australiana, o desagrado da população em relação à aproximação com a China serviu como gatilho para a desordem popular que explodiu em novembro de 2021.

“Não é política externa em si, mas acho que essa mudança diplomática alimentou as queixas pré-existentes e, em particular, a sensação de que os chineses interferiram na política nas Ilhas Salomão, que o dinheiro chinês de alguma forma fomentou a corrupção, distorceu a forma como a política funciona nas Ilhas Salomão”, disse Batley.

A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória pela população local. Mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 foi para a China. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.

Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou do Pacífico mais recursos do que os dez países da região juntos. Nas Ilhas Salomão e em Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.

Os dados não levam em consideração as exportações ilícitas. Nas Ilhas Salomão, pelo menos 70% das toras são exportadas de madeira ilegal. A falta de leis na China contra esse tipo de importação absorvem o envio devido à alta demanda e proximidade com a região.

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