Relação com a China estaria por trás dos distúrbios recentes nas Ilhas Salomão

O desagrado da população em relação à aproximação com Beijing teria servido como gatilho para o momento de desordem

Em meio a protestos que emergiram na semana passada em Honiara, capital das Ilhas Salomão, reivindicando a queda do primeiro-ministro Manasseh Sogavare, Papua Nova Guiné somou esforços com a Austrália para enviar policiais e conter a violência vertiginosa no país. O alinhamento do governo com a China seria uma das motivações da revolta popular, segundo a rede Voice of America (VOA).

Sogavare garante que ainda está no controle da situação, mas o apelo aos dois vizinhos na Oceania foi feito para garantir a segurança. A Austrália colaborou com o envio de cerca de 120 policiais federais e soldados. Já Papua Nova Guiné destacou cerca de 35 policiais e agentes penitenciários. Os reforços chegam após dias de selvageria e saques na principal cidade da ilha no Pacífico.

No sábado (27), a polícia informou que três corpos foram encontrados em um prédio incendiado no distrito de Chinatown. A causa das mortes não foi apurada. Durante a semana, as forças de segurança usaram gás lacrimogêneo e balas de borracha para conter uma multidão que tentou invadir o parlamento, num ato de repulsa às políticas promovidas pelo líder eleito pela quarta vez em 2019.

Motins na capital Honiara resultaram em incêndios. Três pessoas foram encontradas mortas em um prédio consumido pelas chamas (Foto: Twitter/Reprodução)

Na opinião de analistas, a agitação salomonense tem “raízes profundas”. Entre as causas do levante popular estão questões que envolvem tensões étnicas históricas, corrupção e o movimento do governo para estreitar laços com Beijing. Há três anos, as Ilhas Salomão trocaram a aliança diplomática com Taiwan por uma com a China.

Interferência chinesa

Para James Batley, um ex-alto comissário australiano para as Ilhas Salomão e especialista para assuntos sobre Ásia-Pacífico da Universidade Nacional Australiana, o desagrado da população em relação à aproximação com a China serviu como gatilho para o momento de desordem.

“Não é política externa em si, mas acho que essa mudança diplomática alimentou as queixas pré-existentes e, em particular, a sensação de que os chineses interferiram na política nas Ilhas Salomão, que o dinheiro chinês de alguma forma fomentou a corrupção, distorceu a forma como a política funciona nas Ilhas Salomão”, disse Batley.

Em 2006, as Ilhas Salomão também registraram distúrbios após as eleições presidenciais. Grande parte da Chinatown de Honiara foi destruída na época devido à especulação de que negócios com a China teriam influenciado o resultado do pleito.

A Austrália liderou uma missão de paz no país em 2003, onde manteve presença de segurança até 2017.

Por que isso importa?

A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória pela população local. Mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 foi para a China. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.

Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou mais recursos do que os dez países do Pacífico junto. Nas Ilhas Salomão e Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.

Os dados não levam em consideração as exportações ilícitas. Nas Ilhas Salomão, por exemplo, pelo menos 70% das toras são exportadas de madeira ilegal. A falta de leis na China contra esse tipo de importação absorvem o envio devido à alta demanda e proximidade com a região.

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