Sem uma ação coordenada e inovadora, algumas economias do continente africano podem levar “uma geração ou mais” para se recuperar do novo coronavírus, afirmou o presidente de Ruanda Paul Kagame ao jornal britânico “Financial Times”, nesta terça (21). O país foi o primeiro na África a impor a quarentena.
Até esta quinta (23), a África registrou 25,3 mil casos confirmados do Covid-19 e 1,2 mil mortes, de acordo com dados da OMS (Organização Mundial de Saúde).
De acordo com Kagame, as nações africanas precisam de uma ajuda financeira de US$ 100 bilhões ou mais só neste ano. O presidente destaca que a quantia é apenas uma fração do que países desenvolvidos estão injetando em suas economias.
Kagame afirma que aumentar a disponibilidade de DES (Direitos Especiais de Saque) é uma das medidas que podem fazer a diferença rapidamente. O DES é uma espécie de “moeda” do FMI (Fundo Monetário Internacional) para complementar as reservas de países-membros.
O Banco Mundial prevê que o continente africano entrará em recessão pela primeira vez em 25 anos, diante da retração do comércio global nas commodities das quais dependem muitas economias africanas.
Previsões apontam para uma queda no crescimento econômico da África de 2,4% para -2,1%, podendo chegar até a -5,1%, em 2019. Por outro lado, o crescimento populacional no continente chega a 2,7%.
Para o presidente ruandês, é preciso fazer mais que suspender as dívidas dos países africanos até o fim deste ano, como foi anunciado pelo G20 na semana passada. Kagame acredita que é possível ter progresso, se houver ajuda de países como França, Alemanha, China e Estados Unidos.
A secretária-executiva da Comissão Econômica das Nações Unidas para a África, Vera Songwe, alertou para o efeito cascata na economia se nada mais for feito para aliviar o peso da dívida de alguns países africanos.
Coronavírus em Ruanda
Até o fim da semana passada, o país de 12,3 milhões de habitantes registrava 138 casos confirmados para o novo coronavírus. Não há registros de morte. De acordo com Kagame, cerca de mil pessoas são testadas por dia em Ruanda.
Dependente economicamente do turismo, o país africano fechou seu espaço aéreo para voos comerciais no dia 19 de março. Dois dias depois, as fronteiras terrestres foram fechadas e a quarentena foi imposta à população.
As forças de segurança do país atuam nas ruas, prendendo quem viola as medidas de restrição imposta pelo governo. Além dos testes diários, Ruanda trabalha na identificação de pessoas que podem ter tido contato com casos confirmados do Covid-19.
Em todo o continente, já foram registrados mais de 25 mil casos de infecção pelo novo coronavírus e 1,2 mil mortes. A África do Sul lidera o ranking de casos, com 3,6 mil infecções e 65 mortes.
Por outro lado, a Argélia aparece em primeiro lugar no número de mortes: 402, com 2,9 mil pessoas infectadas. O Egito aparece em seguida com 264 fatalidades e 3,4 mil casos. Marrocos registrou 149 mortes e 3,3 mil infecções.
Grandes Lagos Africanos
Apesar do controle da transmissão do novo coronavírus parecer ser efetiva na região dos Grandes Lagos Africanos, o impacto econômico da pandemia ameaça os avanços feitos na região, que reúne países como Ruanda, Congo, Burundi, Sudão do Sul e Uganda.
O alerta foi feito pelo enviado especial da ONU à região, Huang Xia, durante uma reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas nesta quarta (22).
De acordo com dados da OMS, a região dos Grandes Lagos registra 4,7 mil casos confirmados para o Covid-19 e 131 mortes. No entanto, a transmissão do vírus é considerada moderada quando comparada a outras partes do mundo.
O resultado é possível graças às medidas severas de quarentena e de restrição de viagens. “A longo prazo, essas medidas preventivas, combinadas com a realocação de recursos para enfrentar a crise de saúde, podem enfraquecer as já frágeis economias, com possíveis implicações à segurança, paz e desenvolvimento da região”, afirmou Xia.
Impactos positivos
Apesar das preocupações, o enviado especial da ONU à região destacou alguns impactos positivos causados pela pandemia do coronavírus, como a transição política pacífica no Congo e a reaproximação dos governos de Uganda e Ruanda.
Progresso também teria sido feito no combate a grupos armados que atuam no leste do Congo. Mesmo assim, Xia alerta que a atuação desses grupos, incluindo os que exploram recursos naturais ilegalmente, continua sendo um dos maiores desafios para os Grandes Lagos Africanos.