Eurodeputada da Letônia era espiã de Moscou há quase 20 anos, aponta investigação

Tatjana Zdanoka trabalhava para os serviços secretos russos desde 2005, incentivando o 'sentimento pró-Kremlin' no Báltico

Tatjana Zdanoka, membro do Parlamento Europeu (PE) pela Letônia, é acusada de ser uma colaboradora da inteligência russa desde 2005, conforme reportagem publicada na segunda-feira (29) pelo site investigativo The Insider, O trabalho foi feito em conjunto com o Delfi, um dos principais portais nos países bálticos, o Re:Baltica, uma organização de jornalismo investigativo que se concentra na região do Báltico, e o jornal Expressen, da Suécia.

A reportagem afirma que e-mails vazados entre a eurodeputada e dois agentes russos contêm relatos detalhados de suas atividades como legisladora europeia, com foco especial no “incentivo ao sentimento pró-Kremlin” no Báltico.

Nesse período, ela participou de reuniões com os oficiais de inteligência do FSB (Serviço Federal de Segurança), principal agência doméstica de segurança da Rússia e herdeira da antiga KGB dos tempos de União Soviética, em Moscou e Bruxelas. Também solicitou financiamento de fontes russas para suas atividades políticas e eventos em homenagem ao Exército Soviético.

Embora não tenha negado a autenticidade dos e-mails, a parlamentar não comentou detalhadamente o conteúdo.

Tatjana Zdanoka, à esquerda: agente a serviço secreto de Moscou (Foto: WikiCommons)

Diante das notícias, o Parlamento Europeu iniciou investigações internas. A presidente do PE, Roberta Metsola, acatou as acusações, encaminhando o caso para a Comissão Consultiva sobre o Código de Conduta. Isso implica a abertura de investigações, e o assunto também será discutido na Conferência de Presidentes do Parlamento na quarta-feira (31), conforme declarou Juri Laas, porta-voz do órgão, em resposta ao The Insider após a publicação da reportagem.

De origem russa, Tatjana obteve a cidadania letã em 1996, construindo sua carreira política em apoio à Rússia. Em 2009, o então recém-nomeado embaixador russo Georgy Muradov instou russos da Letônia a votarem nela. Em 2014, ela participou como “observadora internacional” no referendo não reconhecido internacionalmente sobre a anexação da Crimeia pela Rússia. Em março de 2022, foi uma das 13 parlamentares europeias que votaram contra a condenação da invasão russa na Ucrânia.

Na Letônia, a eurodeputada é há muito considerada uma agente de influência russa. Ela frequentemente se pronuncia contra o suposto tratamento inadequado dedicado às minorias russas nos Estados bálticos, e sua militância é respaldada por grupos financiados pelo Kremlin. Grande parte de seu trabalho no Parlamento Europeu concentra-se na suposta perseguição à língua russa em território letão.

Por que isso importa?

Letônia e Rússia têm se distanciado cada vez mais, um processo de ruptura diplomática intensificado em razão da guerra na Ucrânia, a ponto de Riga ter expulsado em abril de 2022 alguns diplomatas russos que atuavam no país.

Na ocasião, a Letônia alegou que decidiu “reduzir suas relações diplomáticas com a Federação Russa” em função das inúmeras acusações de crimes de guerra que pesam contra as tropas russas no confronto da Ucrânia, iniciado em 24 de fevereiro de 2022.

Foram sobretudo os abusos cometidos no território ucraniano que levaram Riga a classificar Moscou como ‘Estado patrocinador do terror’. A Letônia ainda levou em consideração, ao adotar tal classificação, o alinhamento do Kremlin com a Síria na guerra civil do país árabe, a derrubada de um avião carregado de civis em Donetsk, tragédia atribuída a um ataque russo, e outros episódios de violência envolvendo o governo russo.

Ao confirmar a ruptura das relações com Moscou, o Saeima, a câmara legislativa letã, incentivou outros países a adotarem medidas semelhantes, bem como pediu à União Europeia (UE) o corte da emissão de vistos de turistas para cidadãos russos e belarussos. Este pedido, entretanto, não foi acatado.

“O Saeima reconhece a violência da Rússia contra civis, que estão sendo perseguidos para fins políticos, como terrorismo, e a Rússia, como um país que apoia o terrorismo, e pede a outros países de pensamento semelhante que expressem tal opinião”, disse comunicado do parlamento na ocasião.

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