Ex-mercenário russo que denunciou assassinatos de crianças foi detido e agredido, diz ativista

Vladimir Osechkin, fundador da ONG Gulagu.net, denunciou a prisão de Azamat Uldarov e disse que a vida dele está em perigo

As autoridades da Rússia detiveram na segunda-feira (24) Azamat Uldarov, um ex-integrante do grupo paramilitar privado Wagner Group que foi a público denunciar abusos cometidos pela organização contra civis, inclusive assassinatos de crianças, na Ucrânia. As informações são da rede Radio Free Europe (RFE).

A detenção de Uldarov foi anunciada primeiramente pelo ativista Vladimir Osechkin em sua conta no Facebook. Ele é o fundador da ONG Gulagu.net, uma exilada entidade russa de direitos humanos que entrevistou o ex-mercenário e assim revelou as atrocidades.

De acordo com Osechkin, o homem foi levado na segunda a um órgão público na região de Saratov, onde quatro ex-colegas que o aguardavam o agrediram. Segundo o ativista, o quarteto “pretende matar Uldarov sob as instruções de (Evgney) Prigozhin”, fundador e chefe da organização paramilitar.

“Na entrada do Departamento de Investigação, quatro combatentes do Wagner esperavam por ele. Na presença do Ministério dos Assuntos Internos, deram socos na cara de Azamat e arrancaram o crachá dele, prometendo matar Uldarov pelo seu testemunho”, disse Osechkin.

Combatentes do Wagner Group, organização paramilitar privada aliada ao Kremlin (Foto: VK/reprodução)

Uldarov é um dos dois ex-mercenários, sendo o outro Alexey Savichev, que concederam entrevista à Gulagu.net. Eles denunciaram o Wagner Group por abusos cometidos contra civis na guerra e disseram que foram obrigados a assassinar crianças.

Uma das vítimas de Uldarov teria sido uma menina que tinha entre cinco ou seis anos, cuja morte foi, segundo ele, ordenada por superiores. “(Foi) uma decisão da administração. Eu não tinha permissão para deixar ninguém sair com vida, porque meu comando era matar qualquer coisa no meu caminho”, disse.

O homem citou Prigozhin nominalmente como responsável pelas mortes. “Existe um superior acima de todos os comandantes: é Prigozhin, que nos disse para não deixar ninguém sair de lá e aniquilar todo mundo”, acrescentou.

O empresário chefe do Wagner Group, um antigo aliado de Vladimir Putin, de quem tem se distanciado cada vez mais, contestou as denúncias de assassinatos de crianças, embora não tenha desmentido que Uldarov e Savichev tenham sido membros da organização.

“Posso dizer o seguinte: se pelo menos uma dessas acusações contra mim for confirmada, estou pronto para ser responsabilizado de acordo com qualquer lei”, disse Prigozhin em áudio publicado no canal pessoal dele no Telegram na semana passada, quando a entrevista veio a público.

Na ocasião, a rede CNN, que reproduziu as informações da entrevista, disse que não conseguiu confirmar a identidade dos homens exibidos no vídeo ou as alegações de ambos. Porém, obteve documentos que colocam Uldarov e Savichev na lista de criminosos perdoados por Putin para que fossem à guerra pelo Wagner Group.

No mesmo áudio divulgado no Telegram, Prigozin ainda ameaçou mandar prender os acusadores. “Essas pessoas são nossas inimigas e vamos lidar com elas de uma maneira especial”, disse o empresário. Ele acrescentou que enviaria uma lista com os nomes de “30 ou 40 pessoas que estão cuspindo em mim”, para que fossem então submetidas a “um julgamento justo, por assim dizer”.

Abusos constantes

Osechkin já havia entrevistado outro ex-membro do Wagner Group que se disse disposto a relatar atrocidades cometidas pelos mercenários. Trata-se de Andrei Medvedev, que fugiu da Rússia rumo à Noruega em janeiro e foi preso por violar a lei de imigração.

O homem afirma ter lutado na Ucrânia durante quatro meses, antes de abandonar o front em novembro, quando a organização estendeu o contrato indefinidamente, mesmo contra a vontade dele. Enquanto lutava na região de Donbass, leste ucraniano, ele diz ter testemunhado uma série de crimes de guerra, incluindo execução de desertores pelo serviço de segurança interna do grupo.

As execuções sumárias dos próprios membros do Wagner têm sido amplamente denunciadas, inclusive por ex-integrantes do grupo. O próprio Prigozhin, que chegou a ir pessoalmente aos presídios recrutar criminosos, advertiu em um suposto vídeo, divulgado em setembro de 2022 pela equipe do oposicionista russo Alexei Navalny, que desertores seriam fuzilados.

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