Hotéis e albergues são alvo de operação para deter russos que evitam o recrutamento

Recrutadores vão em busca de homens que deixam suas residências e buscam hospedagem para se esconder das autoridades

As forças de segurança da Rússia realizaram nos últimos dias uma grande operação para localizar, dentro do próprio território, cidadãos que tentam evitar o recrutamento militar decretado pelo presidente Vladimir Putin no dia 20 de setembro. Hoteis e albergues foram alvo das autoridades russas.

Foi relatada a presença de agentes do governo em dois albergues da rede Travel Inn em Moscou, de acordo com o jornal independente The Moscow Times. Todos os hóspedes que se enquadravam nos critérios de convocação do Kremlin foram enviados a um centro de recrutamento.

Entre os selecionados pelos agentes, aqueles com experiência militar prévia tiveram seus passaportes confiscados de forma a serem impedidos de deixar o país. Para estes, a ordem foi a de retornar no dia seguinte com os itens solicitados pelos recrutadores, possivelmente para que comecem a servir às forças armadas.

De acordo com a agências de notícias VPost, cenas assim têm sido comuns há pelo menos duas semanas não apenas Moscou, com relatos de episódios semelhantes em Vladivostok, no extremo leste do país. Os recrutadores vão em busca de homens que deixam suas residências e usam hotéis e albergues para se esconder das autoridades.

“Voltei à noite para um hotel no centro de Moscou e vi policiais com tablets e pessoas à paisana com papéis no balcão”, conta um jovem que tentava fugir do recrutamento. “Fui passear até a noite, voltei e perguntei à recepcionista o que era. Ela disse que eles vieram do escritório de alistamento policial e militar”.

Para o administrador de uma rede de albergues, a expectativa é a de que o movimento diminua a partir de agora. Como os estabelecimentos exigem que os indivíduos se registrem, aqueles que se enquadram nos critérios de convocação tendem a buscar opções clandestinas de hospedagem.

De acordo com Pavel Chikov, ativista de direitos humanos, a operação realizada pelas autoridades está carregada de irregularidades. Ele afirma que os agentes estatais têm o direito de buscar os candidatos ao recrutamento e entregar a eles a intimação. Mas não podem obrigá-los a comparecer aos centros de recrutamento, como vem ocorrendo.

Quarto de um albergue da rede Travel Inn, em Moscou (Foto: WikiCommons)
Por que isso importa?

Muitos russos não receberam bem a decisão do presidente Vladimir Putin de convocar cerca de 300 mil cidadãos para reforçar as forças armadas na guerra na Ucrânia. A mobilização parcial levou milhares de pessoas a fugir do país.

Muitos cidadãos em idade de recrutamento optaram por deixar o país, com relatos de fronteiras lotadas em países vizinhos como GeórgiaMongólia e Cazaquistão. Voos da Rússia para ArmêniaTurquia e Azerbaijão, países que fazem fronteira com o território russo e não exigem visto de entrada, rapidamente se esgotaram.

Atentas ao problema, as ex-repúblicas soviéticas de LetôniaLituânia e Estônia anunciaram em 19 de setembro, junto da Polônia, a decisão de barrar a maioria dos cidadãos russos que tentassem entrar em seus territórios.

Entre os que ficaram na Rússia, a ideia de aceitar a convocação não é unanimidade, e protestos populares passaram a ser registrados em todos os cantos. Tal movimento não se via desde que a lei foi endurecida para silenciar os dissidentes, em março, quando Moscou passou a punir os cidadãos acusados de “desacreditar o uso das forças armadas”.

Somente na primeira semana que sucedeu o anúncio da mobilização, a ONG OVD-Info, que monitora a repressão estatal na Rússia, registrou quase 2,5 mil detenções em protestos populares contra a decisão do Kremlin. E o número real tende a ser bem maior, vez que são divulgados apenas os dados referentes a nomes que conseguiu confirmar, com base em listas fornecidas pelas autoridades, e que recebeu autorização para divulgar.

Em todo o país, voltaram a ser comuns as cenas de policiais usando a força para deter manifestantes nas ruas, algo que não vinha acontecendo nos meses anteriores. Na Sibéria, autoridades locais relataram que um oficial de recrutamento foi gravemente ferido a bala por um manifestante que também incendiou o escritório onde atuava o funcionário do governo. Episódio parecido ocorreu na cidade de Uryupinsk, na região de Volgogrado, onde um coquetel molotov atingiu um centro de recrutamento.

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