Rússia ameaça barrar imprensa ocidental após veto a emissora estatal na França

Kremlin diz que europeus "estão pisando em seus próprios ideais" após tribunal proibir as transmissões da RT France

O Kremlin ameaçou impedir o trabalho da imprensa ocidental no país nesta quarta-feira (27). A ação seria uma represália pela proibição decretada por um tribunal europeu de transmitir a RT France, emissora estatal russa de língua francesa. As informações são do jornal independente The Moscow Times.

O anúncio partiu do porta-voz do governo Dmitry Peskov, durante coletiva de imprensa na qual definiu a proibição da RT France como “extremamente negativa”. A justificativa foi simples: “Também não vamos deixá-los trabalhar em nosso país”, disse ele, prometendo “pressão semelhante” contra “a mídia ocidental que opera em nosso país”.

A medida é parte das sanções da União Europeia (UE) que pesaram contra Moscou após a invasão das forças russas na Ucrânia. O martelo foi batido pelo Tribunal de Justiça Europeu, em Luxemburgo, que emitiu uma sentença rejeitando o recurso da RT (antiga Russia Today) que questionava a proibição imposta em março sob acusações de que a rede dissemina desinformação.

Presidente Vladimir Putin na programação da rede estatal RT (Foto: Kremlin.ru/Divulgação)

Para Peskov, as sanções à RT e a impossibilidade de operação do canal na Europa são uma demonstração de que “os europeus estão pisando em seus próprios ideais”.

Desde que Moscou mandou suas tropas invadirem o país vizinho no final de fevereiro, o presidente russo Vladimir Putin aumentou sua produção de propaganda e reprimiu ainda mais a liberdade de imprensa no país, inclusive a estrangeira.

Em junho, alegando narrativa “unilateral” por parte do Ocidente, Moscou proibiu a entrada de 29 profissionais de mídia do Reino Unido no país, entre eles âncoras de notícias e editores-chefes, além de membros de organizações de mídia locais. Na lista estão a rede BBC, a emissora Sky News e os jornais Daily TelegraphIndependentGuardian Times.

As promessas do Kremlin de retaliar sanções estrangeiras contra autoridades russas e dar uma resposta a proibições da mídia russa no exterior não vêm de agora, já que repressão à imprensa estrangeira de Putin é anterior à guerra. Antes disso, ele já estava no encalço de diversos importantes jornalistas estrangeiros. Entre eles Andrei Zakharov, correspondente da BBC local, e Sarah Rainsford, também repórter da rede britânica.

Por que isso importa?

Meios de comunicação controlados pelo Kremlin, como Sputnik, RT (ex-Russia Today), Redfish Media Ruptly, marcam presença global e estão disponíveis de forma multilíngue na internet.

Embora sempre tenham atuado a serviço do governo Putin, com certa complacência dos país onde estão presentes, a desconfiança em torno deles cresceu vertiginosamente desde o início do conflito na Ucrânia, no dia 24 de fevereiro. Todos passaram a ser formalmente acusados ​​de sofrer “influência” governamental para a disseminação de conteúdo que visa a favorecer os interesses geopolíticos de Moscou.

Lançado em 2005 como Russia Today, o RT, com aporte financeiro do Kremlin, expandiu-se com canais e sites em idiomas como inglês, francês, espanhol e árabe. A rede não goza de boa fama entre diversos países países, onde é acusada de disseminar desinformação e propaganda ao governo russo.

Nos Estados Unidos, a emissora, a exemplo do que é praticado na Rússia, foi obrigada a se registrar como “agente estrangeiro”. Nas ex-repúblicas soviéticas Lituânia e Letônia, o RT foi banido.

Em setembro de 2021, a Rússia ameaçou bloquear o YouTube em todo o país por conta da exclusão de dois canais estatais em alemão, punição dada por terem violado as diretrizes de desinformação sobre a Covid-19. Um dos canais era justamente a versão alemã da emissora russa RT, e o outro é o DFP (Der Fehlende Part), afiliado ao próprio RT.

Em fevereiro deste ano, antes do início do conflito com a Ucrânia, a Rússia anunciou que havia fechado as portas da sucursal da rede alemã Deutsche Welle (DW) em Moscou, proibiu seus programas e anulou os credenciamentos de seus funcionários. A ação foi uma represália pela proibição decretada por Berlim de transmitir a RT DE, emissora estatal russa de língua alemã. 

Este fechamento marcou a primeira desforra do gênero contra um veículo de imprensa ocidental desde o colapso da União Soviética, em 1991.

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