Rússia fecha sucursal da Deutsche Welle como retaliação à proibição da RT na Alemanha

Medida é a primeira do gênero contra um veículo ocidental desde o fim da União Soviética

A Rússia anunciou nesta quinta-feira (3) que fechou as portas da sucursal da rede alemã Deutsche Welle (DW) em Moscou, proibiu seus programas e anulou os credenciamentos de seus funcionários. A ação é uma represália pela proibição decretada por Berlim de transmitir a RT DE, emissora estatal russa de língua alemã. As informações são da agência catari Al Jazeera.

O fechamento marca a primeira desforra do gênero contra um veículo de imprensa ocidental desde o colapso da União Soviética, em 1991. A medida surge em meio à tensão vertiginosa entre o Kremlin e o Ocidente, particularmente pela possibilidade de uma invasão da Ucrânia, que tem como aliados Estados Unidos e União Europeia (UE).

Em comunicado emitido na quinta, o Ministério das Relações Exteriores da Rússia disse que também “encerrará o satélite e outras transmissões da Deutsche Welle” em todo o território nacional. O órgão governamental acrescentou iniciou o processo para rotular a mídia alemã como “agente estrangeiro” – designação que carrega conotações negativas da era soviética – e que outras medidas serão anunciadas no futuro.

Sede da Deutsche Welle na cidade de Bonn, na Alemanha (Foto: Wikimedia Commons)

O episódio escancara a repressão do governo russo à mídia estrangeira, que já ordenou expulsões de diversos importantes jornalistas estrangeiros. Entre eles Andrei Zakharov, correspondente da BBC local, e Sarah Rainsford, também repórter da rede britânica.

Em Berlim, a justificativa para a proibição da transmissão do canal RT DE dada pelo regulador de difusão na quarta-feira (2) foi a falta de licença de transmissão. Em resposta, a emissora russa de língua alemã alega possuir uma licença sérvia, que lhe dá o direito de transmitir na Alemanha sob a lei europeia.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, observou que a medida “viola a liberdade de expressão”. Já a editora-chefe da RT, Margarita Simonyan, classificou a decisão como “total absurdo”.

Desinformação

Lançado em 2005 como Russia Today, o RT, com aporte financeiro do Kremlin, expandiu-se com canais e sites em idiomas como inglês, francês, espanhol e árabe. A rede não goza de boa fama entre diversos países países, onde é acusada de disseminar desinformação e propaganda ao governo russo.

Nos Estados Unidos, a emissora, a exemplo do que é praticado na Rússia, foi obrigada a se registrar como “agente estrangeiro”. Já no Reino Unido as autoridades ameaçaram cancelar sua licença de transmissão. Em outros países, como as ex-repúblicas soviéticas Lituânia e Letônia, o RT foi banido.

Em setembro, a Rússia ameaçou bloquear o YouTube em todo o país por conta da exclusão de dois canais estatais em alemão, punição dada por terem violado as diretrizes de desinformação sobre a Covid-19. Um dos canais era justamente a versão alemã da emissora russa RT, e o outro é o DFP (Der Fehlende Part), afiliado ao próprio RT.

Por que isso importa?

Jornalistas e veículos de imprensa críticos ao governo da Rússia são alvo de uma perseguição que tem o respaldo da Justiça do país. Em junho, Ivan Pavlov, ex-diretor da Fundação Anticorrupção de Alexei Navalny, entrou para a lista de criminosos procurados do país, sem que o Ministério do Interior tenha especificado o crime que ele cometeu.

Em julho, após a publicação de reportagens desfavoráveis ao presidente Vladimir Putin, o site The Insider e cinco jornalistas do veículo foram listados como “agentes estrangeiros”. A medida seria um ato de vingança contra a mídia independente por ajudar a revelar o papel do Kremlin nos envenenamentos do ex-espião Sergei Skripal, bem como outras tentativas de assassinato pela FSB (Agência Nacional de Segurança, da sigla em inglês).

A designação de “agente estrangeiro” carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. A classificação acaba por afastar potenciais parceiros e anunciantes e muitas vezes sufoca financeiramente os veículos, obrigados ainda a fornecer ao governo relatórios detalhados sobre suas finanças e atividades.

Jornalistas independentes ou representantes de veículos de mídia que tenham se esquivado das exigências três vezes após terem o nome incluído na lista podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo.

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