O Telegram, aplicativo de mensagens instantâneas fundado pelo russo Pavel Durov e amplamente utilizado em todo o mundo, está intimamente ligado a empresas que prestam serviços ao FSB (Serviço Federal de segurança), uma agência de inteligência da Rússia. A revelação é parte de uma investigação publicada nesta semana pelo site russo Important Stories.
Segundo documentos judiciais e registros de rede analisados pelos jornalistas, a infraestrutura do Telegram, incluindo seus servidores e equipamentos de tráfego, está sob responsabilidade da empresa Global Network Management (GNM), registrada em Antígua e Barbuda, mas operada pelo empresário russo Vladimir Vedeneyev. Ele próprio afirma ser a única pessoa com acesso aos servidores do aplicativo em data centers como o de Miami, nos EUA.
Além da GNM, Vedeneyev é também ex-proprietário da operadora russa Globalnet, que afirma ser a única fornecedora de acesso direto ao Telegram na Rússia e na Comunidade dos Estados Independentes (CEI), bloco formado por ex-repúblicas soviéticas. A Globalnet, por sua vez, presta serviços a diversas instituições estatais russas, incluindo o FSB, o Ministério da Defesa e o centro responsável pela segurança cibernética da presidência russa.

Desde 2020, a operadora russa Globalnet passou a operar, a pedido do Roskomnadzor — o órgão estatal que regula e fiscaliza as comunicações, a mídia e a internet na Rússia —, um sistema de inspeção profunda de pacotes de dados (DPI). Essa tecnologia permite monitorar e filtrar o tráfego de rede com alto grau de detalhamento, possibilitando o rastreamento de comunicações em massa.
“Durov chegou a um acordo com o FSB. Solicitações no âmbito de medidas operacionais são transferidas para lá se terroristas ou qualquer outra pessoa estiver sob controle. O Telegram instalou equipamentos para que fosse possível monitorar todos os assuntos perigosos”, afirmou em 2022 o deputado Oleg Matveychev.
A estrutura do aplicativo também levanta preocupações técnicas. O Telegram, diferentemente de concorrentes como WhatsApp e Signal, não utiliza criptografia de ponta a ponta por padrão. Apenas “chats secretos” têm esse tipo de proteção. Segundo o especialista em segurança digital Michal Woźniak, a plataforma transmite, em texto aberto, identificadores de dispositivo, o que permite rastrear usuários com base em tráfego de rede.
“Se alguém tem acesso ao tráfego do Telegram e coopera com os serviços de inteligência russos, isso significa que o identificador do dispositivo se torna um problema realmente grande — uma ferramenta para vigilância global de usuários, independentemente de onde estejam e de qual servidor se conectem”, explicou o especialista em segurança digital Michal “Ryszek” Woźniak.
O histórico de colaboração de Durov com autoridades russas remonta à época do VKontakte, rede social que ele também fundou. Durante os protestos de 2011, em carta enviada ao Kremlin, Durov admitiu que cooperava com o FSB e fornecia informações sobre milhares de usuários: “Se naqueles mesmos dias tivéssemos começado a perder na disputa competitiva devido à falta de algum tipo de serviço para repressões virtuais em massa, teríamos que implementá-lo também. E fiquem tranquilos, nossas repressões teriam sido as mais massivas e sangrentas do mercado.”