TPI prepara emissão de mandados de prisão contra autoridades russas envolvidas na guerra

Entre os alvos da corte de Haia estariam inclusive altas figuras do governo da Rússia, talvez até o presidente Vladimir Putin

O Tribunal Penal Internacional (TPI), sediado em Haia, na Holanda, já se prepara para emitir os primeiros mandados de prisão internacionais contra autoridades russas acusadas de crimes cometidos na guerra da Ucrânia, desencadeada pela agressão da Rússia em 24 de fevereiro de 2022. As informações são do jornal The New York Times.

Embora entre os alvos dos mandados estejam altas figuras do governo russo, talvez até o presidente Vladimir Putin, as fontes ouvidas pela reportagem não citaram nomes.

Uma parte dos mandados está ligada ao suposto sequestro de crianças ucranianas por parte das forças russas, denúncia que surgiu já no início do conflito e cujas evidências vêm se acumulando nas ultimas semanas.

Em fevereiro, um estudo do Laboratório de Pesquisa Humanitária (HRL) da Universidade de Yale revelou que ao menos seis mil crianças ucranianas deslocadas pela guerra vêm sendo mantidas pelo governo russo em campos de reeducação espalhados por diversas regiões da Ucrânia e da Rússia. Kiev diz que o número de vítimas é maior, por volta de 16 mil menores.

Sede do Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia, na Holanda (Foto: Flickr)

As crianças passam por um processo de reeducação pró-Rússia, inclusive com a aplicação de treinamento militar. Os menores invariavelmente são impedidos de retornar à Ucrânia para se juntar aos familiares, com casos extremos de crianças entregues para adoção.

Moscou não esconde a existência dos campos de reeducação, mas oficialmente alega que são acampamentos de verão humanitários voltados a proteger crianças órfãs ou abandonadas em virtude do conflito.

Karim Khan, procurador-geral do TPI, chegou a visitar um orfanato ucraniano no início de março. Publicamente, ele disse que o sequestro de menores por parte de Moscou é uma das prioridades da corte.

O segundo caso a ser aberto pelo TPI, com os consequentes mandados de prisão, está ligado aos ataques realizados por Moscou contra a infraestrutura civil essencial ucraniana, que tem privado os civis locais de aquecimento, água e energia.

Os Estados Unidos coletaram evidências de que o Kremlin bombardeia deliberadamente tais alvos e estudam a possibilidade de compartilhá-las com o tribunal, embora não sejam um Estado-Membro. Por ora, o que impede Washington de fazê-lo é o temor de que isso abra um precedente para que no futuro cidadãos norte-americanos venham a ser julgados pela corte de Haia.

As acusações serão apresentadas a um painel de juízes, que decidirão se os requisitos foram cumpridos ou se ainda são necessárias mais provas. Caso eles optem pela primeira opção, serão emitidos os mandados de prisão, o que aconteceria em “curto prazo”, segundo fonte ouvida pela agência Reuters.

Apesar dos mandados, as prisões são improváveis, pois a Rússia não dá qualquer sinal de que pretenda entregar os réus. Entretanto, a abertura de processos internacionais contra autoridades russas tende a ampliar o isolamento diplomático de Moscou e tornaria muito difícil para os acusados deixar a Rússia.

Tribunal internacional competente

O TPI carece de competência para julgar as autoridades russas, vez que o país não é um membro. A corte também não realiza julgamentos à revelia, o que dificultaria ainda mais a situação, pois o Kremlin não planeja entregar eventuais réus.

Assim, órgãos e governos internacionais atuam para estabelecer mecanismos legais que viabilizem o eventual julgamento de indivíduos acusados de crimes de guerra, crimes contra a humanidade e genocídio na guerra da Ucrânia.

Em fevereiro, a Eurojust (Agência da União Europeia para Cooperação em Justiça Criminal) lançou um sistema que preserva, armazena e analisa de modo seguro evidências de crimes internacionais e será crucial para os esforços de punir o governo russo.

O órgão também disse que em breve será criado o Centro Internacional para Acusação do Crime de Agressão (ICPA, na sigla em inglês), cuja função é “apoiar e aprimorar as investigações sobre o crime de agressão, obtendo evidências importantes e facilitando a construção de casos o mais cedo possível”.

Já o Parlamento da União Europeia (UE) pretende estabelecer um tribunal especial que tenha competência para julgar os líderes políticos e militares da Rússia pelos abusos, contornando assim a falta de competência das cortes existentes, como o TPI.

De acordo com a agência Associated Press (AP), as autoridades ucranianas registraram mais de 71 mil supostos crimes de guerra cometidos pelas forças russas no conflito. Myroslava Krasnoborova, procuradora designada pela Ucrânia para atuar na Eurojust, diz que 99 casos já foram enviados aos tribunais, da Ucrânia com 26 sentenças anunciadas até agora.

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