Cerca 90% da população da Síria está vivendo na pobreza, segundo a ONU

Relatório diz que 12 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar, com 14,6 milhões de civis dependendo de assistência

O nível de sofrimento da população da Síria atingiu um novo patamar, com a escalada recente da violência, o colapso da economia e a piora da crise humanitária. Esta é a conclusão do relatório da Comissão de Inquérito da ONU (Organização das Nações Unidas) sobre a Síria, divulgado nesta quarta-feira (9).  

Após 11 anos de conflito no país, cerca de 90% da população está vivendo na pobreza, segundo a publicação. “A Síria está indo para um novo abismo, com mais bombardeios e ações militares e também mais abduções e assassinatos em zonas de conflito”, diz o documento.  

O presidente da Comissão de Inquérito, o brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, diz que o conflito na Ucrânia também terá impactos para os sírios. “A questão da Ucrânia é realmente muito preocupante porquê o trigo é importado diretamente da Ucrânia. O outro fator são as 7 milhões de pessoas internamente deslocadas. Só na região noroeste, temos mais de 2 milhões de deslocados internos, sendo que metade vive em campos, em uma situação muito precária”. 

Mulher que perdeu o marido em bombardeio em Idlib, fevereiro de 2020 (Foto: Unicef/Khudr Al-Issa)

A rotina de mulheres, crianças e homens continua ainda mais difícil e perigosa. O documento afirma que 12 milhões de pessoas enfrentam insegurança alimentar, e um número sem precedentes de 14,6 milhões de civis dependem de assistência humanitária.  

A violência para a obtenção de dinheiro aumentou ainda mais com a “situação econômica desesperadora”. A Comissão de Inquérito nota sequestros para pedidos de resgate, extorsões e apreensão de propriedades que são confiscadas ou de plantações, para vender as colheitas.  

O documento atribui essas violações a forças do governo sírio e a grupos armados tentando controlar territórios e tendo como alvo as minorias.  

Pior seca 

No campo climático, a Síria está enfrentando a pior seca em décadas. Com a inflação a 140%, o preço das commodities mais básicas já está fora de controle. 

Paulo Sérgio Pinheiro declarou ainda que possíveis sanções “poderão causar o impedimento da ajuda humanitária, com impactos arrasadores para todos, excepto para as elites econômicas e políticas”.  

O relatório aborda também a discriminação baseada em gênero e a violência contra meninas e mulheres. Muitas deslocadas internas estão sem documentos e menores são forçadas a se casarem, enquanto meninos são enviados para o trabalho infantil ou recrutados para o conflito.  

Civis assassinados

O documento nota ainda aumento dos bombardeios entre Exército Nacional Sírio, que tem o apoio turco, e as Forças Democráticas Sírias (FDS) no noroeste do país. Na região noroeste, em Idlib e Alepo, áreas residenciais são alvo de ataques indiscriminados pelas forças pró-governamentais.  

Crianças esperam mantimentos em Al-Hol, nordeste da Síria, abril de 2020 (Foto: Unicef/Deil Souleiman)

Outro integrante da Comissão de Inquérito, Hanny Megally, declarou que “uma noiva foi assassinada no casamento, junto com suas quatro irmãs; um campo de deslocados para viúvas e suas crianças também foi alvo de ataque e menores de idade sofrem com a violência quando caminham para a escola.  

A Comissão de Inquérito também recomenda aos Estados Unidos para realizarem uma investigação independente e imparcial sobre incidentes envolvendo civis durante ações da aliança liderada pelos norte-americanos entre 2018 e 2019. 

Sobre os acampamentos de Al-Hol e Al-Roj, no noroeste do país, o relatório menciona condições cruéis e desumanas dos locais que abrigam 60 mil pessoas, sendo 40 mil crianças. As tensões nos acampamentos são cada vez maiores, incluindo assassinatos e violência em larga escala. Somente no ano passado, mais de 90 pessoas foram mortas em Al-Hol.  

Conteúdo adaptado do material publicado originalmente pela ONU News

Tags: