EUA estimam que cerca de dois mil militantes do EI estejam ativos no Afeganistão

Combatentes foram libertados de prisões desde a ascensão talibã e se uniram justamente ao maior rival dos radicais afegãos

O governo norte-americano estima que o Afeganistão abrigue atualmente cerca de dois mil combatentes ligados ao Estado Islâmico (EI) e outros cem vinculados à Al-Qaeda. Os números foram citados pelo general Kenneth McKenzie, chefe do Comando Central das forças armadas dos EUA, em entrevista coletiva no Pentágono, na sexta-feira (18). As informações são do site The Print.

McKenzie afirma que a ascensão do Taleban ao poder, consumada no dia 15 de agosto de 2021, com a tomada de Cabul, levou à libertação de milhares de membros das duas organizações extremistas que estavam presos.

“Avaliamos provavelmente em uns dois mil, mais ou menos, os combatentes do EI no Afeganistão. Claro, quando o Taleban abriu as prisões de Pul-e-Charkhi e Parwan, infundiu novos talentos e novas energias no EI, então eles agora estão colhendo o resultado dessa decisão míope”, disse o militar.

Curiosamente, a libertação virou um enorme problema para o próprio Taleban. Isso porque a maioria desses ex-presos se juntou ao Estado Islâmico-Khorasan (EI-K), grupo jihadista que atua em solo afegão e tornou-se o principal rival doméstico dos talibãs, com ataques violentos que vitimaram centenas de pessoas nos últimos meses.

“Acho que o Taleban tentará realizar operações para limitar o EI. Será interessante ver se eles são capazes de fazer isso, porque o EI será um alvo difícil, há mais deles do que houve no passado, eles estão recrutando”, disse McKenzie.

General Kenneth McKenzie, chefe do Comando Central das Forças Armadas dos EUA (Foto: nara.getarchive.net)

O general deixou claro que a preocupação dos EUA com o EI é crescente, vez que o grupo parece cada vez mais preparado para retomar suas atividades no Ocidente e assim realizar novamente ataques em solo norte-americano.

Em setembro do ano passado, durante audiência no Congresso, a principal autoridade contraterrorismo de Washington, Christine Abizaid, disse que o EI-K parecia se aproveitar da notoriedade que ganhou por suas ações no Afeganistão. “Será que ele se tornará mais focado no Ocidente? Ele se tornará mais focado na nossa pátria do que antes?”, questionou ela à época.

A situação da Al-Qaeda é diferente, pois o grupo extremista tem a simpatia do Taleban. Um relatório publicado em fevereiro pelo Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas) destacou a proximidade entre os dois grupos, que só não é explícita para “não comprometer os esforços do Taleban para obter reconhecimento e legitimidade internacionais”.

Por que isso importa?

Embora as ações antiterrorismo globais tenham enfraquecido os dois principais grupos jihadistas do mundo, Estado Islâmico (EI) e Al-Qaeda, ambos conseguem se manter relevantes e atuantes. A estratégia dessas duas organizações para se manterem vivas inclui o recrutamento de novos seguidores através da internet e a forte presença em zonas de conflito, sobretudo na África, onde são representadas por grupos afiliados regionais.

Em 2017, o exército iraquiano anunciou a derrota do EI no Iraque, com a retomada de todos os territórios que a organização dominava desde 2014. O grupo, que chegou a controlar um terço do país, hoje mantém por lá apenas células adormecidas que lançam ataques esporádicos. Já as Forças Democráticas Sírias (FDS), apoiadas pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pelos extremistas na Síria.

Em janeiro deste ano, o exército norte-americano impôs nova derrota ao EI com o anúncio da morte de Amir Muhammad Sa’id Abdal-Rahman al-Mawla, principal líder da facção. Ele morreu durante uma operação antiterrorismo na Síria, em mais um duro golpe contra o grupo, que em 2019 havia perdido o líder anterior, Abu Bakr al-Baghdadi.

No caso da Al-Qaeda, além de igualmente manter facções relevantes na África, também ajudou a fortalecer o grupo a tomada de poder pelo Taleban no Afeganistão. De acordo com a ONU (organização das Nações Unidas), o território afegão pode virar um porto seguro para a organização jihadista e suas afiliadas, bem como “potencial ímã para combatentes terroristas de outras regiões viajarem ao país”.

“Não há sinais recentes de que o Taleban tenha tomado medidas para limitar as atividades de combatentes terroristas estrangeiros no país. Pelo contrário, os grupos terroristas gozam de maior liberdade lá do que em qualquer momento da história recente”, diz relatório da ONU publicado em fevereiro deste ano.

O documento destaca, ainda, que a Al-Qaeda chegou a parabenizar publicamente os talibãs pela ascensão ao poder. E alega que um filho do ex-terrorista Osama Bin Laden, Abdallah, visitou o Afeganistão em outubro de 2021 para reuniões com o Taleban.

No Brasil

Casos mostram que o Brasil é um porto seguro para extremistas. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2001, uma investigação da revista VEJA mostrou que 20 membros terroristas de Al-Qaeda, Hamas e Hezbollah viviam no país, disseminando propaganda terrorista, coletando dinheiro, recrutando novos membros e planejando atos violentos.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao Estado Islâmico foram presos e dois fugiram.

Mais recentemente, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles são acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

Para o tenente-coronel do Exército Brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), o anúncio do Tesouro causa “preocupação enorme”, vez que confirma a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras). “O Estado e a sociedade brasileira estão completamente vulneráveis a atentados terroristas internacionais e inclusive domésticos, exatamente em razão da total disfuncionalidade e do colapso da atual estrutura de Inteligência de Estado vigente no país”. Saiba mais.

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