Kobi Shabtai, chefe de polícia de Israel, prometeu “tolerância zero” com protestos pró-Palestina no país. Disse, inclusive, que colocaria tais manifestantes “em ônibus” rumo à Faixa de Gaza. A posição radical do Estado judeu parece seguir a cartilha da Rússia, que age da mesma maneira desde o início da guerra na Ucrânia. E a causa israelense tem ganhado apoiadores no Ocidente, com vários países proibindo manifestações em apoio ao povo palestino em meio ao conflito no Oriente Médio.
“Quem quiser se tornar cidadão israelense, que seja bem-vindo”, disse Shabtai em um vídeo publicado na rede social TikTok, conforme informações divulgadas pela agência catari Al Jazeera. “Quaisquer pessoas que queiram se identificar com Gaza são bem-vindas. Vou colocá-las em ônibus que vão para lá agora.”
Na mesma publicação, o chefe de polícia afirmou que Israel terá “tolerância zero para qualquer instância de incitamento ” e que “não haverá autorização para protestos.” Acrescentou que o país está “em estado de guerra” e não permitirá “que todo tipo de pessoa venha e nos teste.”
A intransigência israelense remete à de Moscou, que desencadeou outro grande conflito em curso ao invadir a Ucrânia em 24 de fevereiro de 2022. Desde então, o presidente Vladimir Putin aumentou a censura ao estabelecer uma lei, no início de março do ano passado, que pune quem “desacredita o uso das forças armadas”, um subterfúgio legal para silenciar vozes pró-Kiev e antiguerra.
Dentro dessa severa legislação, os detidos na Rússia têm que pagar multas que chegam a 300 mil rublos (R$ 22 mil). A pena mais rigorosa é aplicada por divulgar “informações sabidamente falsas” sobre o exército e a “operação militar especial” na Ucrânia, eufemismo usado pelo governo para descrever a guerra. A reclusão pode chegar a 15 anos.
Na Rússia, a perseguição aos críticos do governo é uma das principais heranças da guerra. De acordo com a ONG OVD-Info, que monitora a repressão no país, 19.825 foram presas por sua postura antiguerra desde que o conflito estourou.
O comportamento em Israel não é muito diferente. Eli Levy, porta-voz da polícia local, disse na quarta-feira (18) que 63 pessoas haviam sido presas por “incitar o terror”, argumento usado para deter todos aqueles que manifestem apoio aos atos do Hamas, que desencadearam o conflito em 7 de outubro, ou mesmo ao fim da ocupação dos territórios palestinos.
Nem políticos escapam da censura em Israel. O parlamentar de esquerda Olef Cassif foi suspenso por 45 dias por ter condenado o bloqueio total imposto contra a Faixa de Gaza, com o fornecimento de água, energia e gás cortado.
Segundo o jornal The Jerusalem Post, Cassif afirmou que “Israel queria esta violência” e que os defensores da paz deveriam “unir forças para dizer a Israel: ‘Vocês vão acabar com a ocupação agora’”. Ele ainda comparou as ações em Gaza à “solução final” dos nazistas para exterminar os judeus na segunda Guerra Mundial.
Na mesma entrevista em que fez a polêmica declaração, concedida ao site Democracy Now, Cassif deixou claro que não apoia os atos do Hamas, apenas discorda da resposta israelense. “Nada, absolutamente nada, justifica, pode justificar ou legitimar a carnificina que o Hamas cometeu nas cidades, nos kibutz e nas aldeias do sul de Israel. Nada pode justificar isso. É assustador”, afirmou.
Israel também se mexeu juridicamente para facilitar as ações repressivas, estabelecendo o estado de emergência. Isso permite, por exemplo, que as celas de presídios recebam mais gente que o estabelecido em lei, com presos dividindo uma mesma cama. Também foram autorizadas audiências por telefone ou videoconferência, numa projeção de que as detenções aumentarão consideravelmente no país.
Reação ocidental
Países que manifestaram apoio a Israel têm adotado postura semelhante, reprimindo com severidade manifestações pró-Palestina. Na semana passada, a França proibiu tais atos sob o argumento de preservar a ordem pública, segundo o ministro do Interior Gerald Darmanin. De acordo com a rede CNN, quaisquer ações que contrariem o veto serão punidas com prisão.
A Alemanha, outro país que deixou clara sua posição pró-Israel, chegou a prender em Berlim 167 pessoas que participaram de protestos a favor da Palestina, segundo a rede Deutsche Welle (DW). As autoridades, porém, alegam ter agido para conter a violência dos manifestantes, que teriam disparado fogos de artifício e queimado barricadas na capital alemã.
Posteriormente, as autoridades da Alemanha reprimiram duramente protestos realizados em Frankfurt e Nuremberg, onde não houve relatos de violência por parte dos manifestantes. Jatos de água chegaram a ser usados para dispersar a população.
Em Viena, na Áustria, um protesto pró-Palestina foi proibido sob o argumento de que coincidiria com outro pró-Israel, informou a agência Reuters. Gerhard Puerstl, chefe de polícia local, argumentou ainda que o convite para o evento usava uma frase cunhada pelo Hamas, “do rio ao mar”, que poderia ser encarada como um convite à violência.
“A manifestação visa obviamente criar um clima em que o conflito violento nesta região (Oriente Médio) seja trazido para as ruas de Viena”, disse Puerstl.