Polícia do Irã prende ao menos uma pessoa durante memorial de adolescente morta

Familiares e amigos se reuniram no 40º dia desde a morte de Armita Garavand, possível vítima de uma agressão da polícia da moralidade

As autoridades iranianas voltaram a agir com truculência em um evento em memória da jovem Armita Garavand, que morreu no final de outubro, aos 17 anos, em razão de ferimentos possivelmente sofridos durante uma ação da polícia da moralidade. Pelo menos uma pessoa foi presa na quinta-feira (8), de acordo com a rede Radio Free Europe (RFE).

Ativistas de direitos humanos alegam que familiares e amigos da jovem se reuniram em torno do túmulo dela por ocasião do 40º dia desde a morte, uma tradição iraniana. Devido à data, a polícia se antecipou e marcou forte presença. Uma mulher identificada como Ariana Akbari, que já havia sido detida antes por participar de protestos populares, foi presa no local.

Armita teria sido agredida pela polícia da moralidade, dentro do metrô de Teerã, sob a alegação de que usava incorretamente o hijab, véu obrigatório para mulheres no Irã. Ela foi levada a um hospital das Forças Armadas, onde entrou em coma e morreu dias depois.

As autoridades iranianas, por sua vez, negam a versão de agressão, que foi confirmada por ao menos uma pessoa que presenciou o episódio. Teerã alega que a jovem sofreu uma queda brusca de pressão, o que teria ocasionado um desmaio e um consequente ferimento na cabeça.

A presença dos policiais no memorial foi uma forma de evitar que novos protestos ocorressem, como os que foram registrados logo após a morte de Armita. Situação semelhante havia ocorrido no funeral da jovem, no qual a proeminente advogada  e ativista dos direitos humanos Nasrin Sotoudeh alega ter sido agredida e presa.

Armita Geravand, iraniana de 16 anos que teria sido agredida por policiais (Foto: reprodução/iranhr.net)
Irã em ebulição

O caso de Armita guarda terríveis semelhanças com o de Mahsa Amini, de 22 anos, que morreu em consequência de suposta agressão da “polícia da moralidade” em 16 de setembro de 2022. Acusada de usar incorretamente as vestimentas obrigatórias, ela foi presa e forçada a entrar em uma viatura, onde teria sido agredida. Entrou em coma, foi internada e morreu após três dias no hospital.

A morte de Mahsa Amini desencadeou protestos populares que tomaram as ruas do Irã a partir de setembro do ano passado. As manifestações começaram no Curdistão, província onde vivia a jovem, e depois se espalharam por todo o país, com gritos de “morte ao ditador” e pedidos pelo fim da república islâmica.

As forças de segurança passaram a reprimir as manifestações de forma violenta, com dezenas de mortes relatadas. A ONG Human Rights Watch (HRW) ainda citou os casos de “centenas de ativistas, jornalistas e defensores de direitos humanos” que, mesmo de fora dos protestos, acabaram presos pelas autoridades, bem como o corte dos serviços de internet e as mídias sociais bloqueadas para reprimir os atos.

No início de outubro de 2022, a HRW ainda publicou um relatório que classifica o regime iraniano como “corrupto e autocrático”, denunciando também os abusos cometidos pelas forças de segurança na repressão aos protestos populares.

Em resposta à onda de manifestações, o governo endureceu ainda mais o já existente código de vestimenta imposto a seus cidadãos, cujas vítimas são sobretudo as mulheres. A chamada lei sobre “hijab e castidade” prevê multas e penas de prisão de até dez anos em caso de violação.

O uso do véu: multa e prisão

O véu é obrigatório no Irã desde 1981, dois anos após a Revolução Islâmica. Pela lei atual, mulheres que aparecerem em locais públicos sem o hijab estão sujeitas a uma pena que varia entre dez dias e dois meses de prisão ou uma multa de até 500 mil riais (R$ 58).

A nova lei, que vinha sendo debatida desde junho, foi abordada pela ONU (Organização das Nações Unidas) no início de setembro. Oito especialistas em direitos humanos foram designados pela entidade para avaliar o texto legal e seus desdobramentos.

“O projeto de lei poderia ser descrito como uma forma de apartheid de gênero, uma vez que as autoridades parecem governar através de discriminação sistêmica, com a intenção de reprimir mulheres e meninas até à submissão total”, disseram os especialistas.

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