Taleban anuncia reabertura de universidades públicas, mas mulheres ficam de fora

Repressão de gênero é a principal marca dos radicais que controlam o Afeganistão, onde a educação feminina é restrita

O Taleban anunciou a reabertura de universidades públicas na capital, Cabul, e em várias outras cidades do país. Porém, apenas estudantes do sexo masculino poderão ter aulas. A repressão de gênero tem sido a principal marca dos radicais que controlam o Afeganistão, onde mulheres não têm vez. As informações são da rede Voice of America (VOA).

“De acordo com uma decisão do Conselho Supremo de Educação Superior, os estudos dos alunos do sexo masculino em instituições governamentais de ensino superior nas províncias mais frias começarão oficialmente a partir de 6 de março do ano corrente”, disse em nota o Ministério de Educação Superior talibã, sem fazer menção às acadêmicas do sexo oposto.

O Taleban vem impondo uma série de restrições às mulheres afegãs no ensino superior desde setembro de 2021, quando determinou a segregação de gênero em universidades e faculdades privadas. À época, um decreto do Ministério da Educação estabeleceu que as classes fossem separadas por gênero, ou pelo menos divididas por uma cortina.

Afegãs durante aula de fotojornalismo em um universidade na cidade de Farah, em 2013. Atualmente o curso está proibido (Foto: ResoluteSupportMedia/Flickr)

Em dezembro passado, estudantes do sexo feminino foram proibidas de frequentar as universidades. Dois meses antes, elas haviam sido impedidas de se inscrever em diversas graduações, entre os cursos proibidos estão jornalismo, medicina, engenharia, economia e ciências sociais. As jovens afegãs também foram afetadas pelo fechamento de escolas secundárias.

“Os talibãs estão ficando sem tempo para tomar uma decisão sobre a reabertura de escolas secundárias e universidades para meninas”, disse Orzala Nemat, ativista afegã e pesquisadora da Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres. 

Ela acrescentou: “Esta é a demanda do público em geral, anciãos da comunidade, estudiosos religiosos e até mesmo alguns de seus próprios membros se sentem envergonhados de apoiar este ato anti-islâmico e injustificado”.

As políticas misóginas do governo talibã, que tem como líder supremo o mulá Haibatullah Akhundzada – a principal liderança desde 2016, seja para assuntos políticos, religiosos ou militares –, não são unanimidade dentro da organização, segundo Pashtana Durrani, diretora da Learn Afghanistan, uma ONG que apoia a educação de meninas e mulheres.

“O Taleban está em uma luta interna pelo poder”, disse ela. “Neste momento, a organização está em um impasse onde não pode remover ou acusar Akhundzada, que é um homem que pensa que as mulheres nas escolas e universidades são ‘haram’ [termo islâmico para “proibido”]”, observou Pashtana.

Para Farahnaz Forotan, uma importante jornalista que fugiu do Afeganistão após a tomada de Cabul pelos jihadistas, negar a educação para meninas e mulheres é um jogo de poder sádico de Akhundzada, que terá consequências desastrosas para milhões de afegãos.

“Como um país pobre pode compensar dois anos sem educação para meninas? As perdas são catastróficas e irreparáveis”, refletiu Forotan.

O Taleban é o único regime do mundo que impõe um apartheid de gênero.

Por que isso importa?

A vida das mulheres tem sido particularmente dura no Afeganistão. Aquelas que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.

Na educação, o governo extremista mantém fora da escola cerca de três milhões de meninas acima da sexta série, sob o argumento de que as escolas só serão reabertas quando os radicais tiverem a certeza de um “ambiente seguro”.

Mulheres também não podem sair de casa desacompanhadas, e há relatos de solteiras e viúvas forçadas a se casar com combatentes. Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em partes do país, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.

Há também um código de vestimenta para as mulheres, forçadas a usar o hijab quando estão em público. Como forma de protestar, mulheres afegãs em todo o mundo iniciaram um movimento online, postando fotos nas redes sociais com tradicionais roupas afegãs coloridas, sempre acompanhadas de hashtags como #AfghanistanCulture (cultura afegã) e #DoNotTouchMyClothes (não toque nas minhas roupas).

A repressão de gênero é um das razões citadas pelas nações de todo o mundo para não reconhecerem o Taleban como governantes de direito do Afeganistão. Assim, o país segue isolado da comunidade internacional e afundado na pobreza. O reconhecimento internacional fortaleceria financeiramente um país pobre e sem perspectiva imediata de gerar riqueza.

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