Veto ao esporte feminino ameaça presença do Afeganistão nos Jogos Olímpicos

Comitê Olímpico Internacional disse que seu apoio ao comitê afegão dependerá de condições, incluindo a permissão para que as mulheres pratiquem esportes com “acesso seguro e inclusivo” e participem da administração esportiva

O Comitê Olímpico Internacional (COI) deu um ultimato aos governantes talibãs do Afeganistão na terça-feira (6): permitir que mulheres tenham acesso seguro ao esporte é uma condição para a representação do país nos Jogos Olímpicos Paris 2024. As informações são da rede Gandhara.

O aviso veio um dia após um pedido feito à entidade pela ONG de direitos humanos Human Rights Watch (HRW) para que suspendesse o Afeganistão de participar de eventos esportivos imediatamente até que mulheres e meninas possam voltar a praticar esportes no país.

O esporte feminino dentro da nação do Oriente Médio foi desmantelado quando a organização extremista assumiu o poder central em agosto de 2021, após a retirada das tropas dos EUA e aliados de Cabul.

Segundo a HRW, a restrição imposta pelo regime talibã viola a lei internacional de direitos humanos e a Carta Olímpica, documento que guarda os princípios do Olimpismo e exige a não discriminação no esporte.

“Centenas de atletas do sexo feminino optaram por fugir do país em vez de desistir dos esportes que amam, e esse é o trabalho delas”, disse a HRW em seu comunicado.

Afegãs participam de um jogo de exibição de basquete como parte das comemorações do Dia Internacional da Juventude em Cabul (Foto: WikiCommons)

O COI expressou “séria preocupação” e “condenou veementemente” as restrições às mulheres após uma reunião do conselho executivo em Lausanne, na Suíça, onde recebeu um relatório completo sobre o movimento olímpico e esportivo no Afeganistão.

“As equipes que representam o Afeganistão devem incluir atletas do sexo feminino que vivem no país e no exterior”, disse o conselho, acrescentando que “as mulheres devem ser representadas nos órgãos governamentais e na administração”.

O COI, no entanto, não estabeleceu nenhum prazo. Porém, disse que a presença da delegação afegã nas Olimpíadas de Paris em 2024 “dependerá do progresso feito em relação à questão fundamental do acesso seguro ao esporte para mulheres e jovens meninas do país”.

O Afeganistão tem apenas duas medalhas olímpicas em sua história. São dois bronzes conquistados pelo atleta do taekwondo Rohullah Nikpai em Beijing 2008 e Londres 2012. As conquistas de Nikpai no masculino popularizaram o esporte no país, inclusive entre as mulheres. Porém, desde que o Taleban assumiu o poder, a prática deve se restringir aos homens. As atletas treinam clandestinamente.

Direito ao esporte

Em outubro de 1999, o COI suspendeu o comitê olímpico nacional do Afeganistão até 2003, alegando que o Taleban, à época em seu primeiro regime, estava impedindo as mulheres de participar de competições esportivas.

Ao retornar ao poder, os insurgentes fecharam centros de treinamento e ameaçaram atletas com violência, relataram atletas. Como resultado, algumas mulheres e atletas afegãs se esconderam e tentaram destruir evidências de seus laços com o esporte, incluindo medalhas. Muitas atletas permanecem no Afeganistão, incapazes de treinar e praticar esportes com segurança, segundo a HRW.

Minky Worden, diretor de iniciativas globais da ONG, diz que, desde então, milhares de mulheres e meninas tiveram negado o direito de praticar esportes, bem como às oportunidades de educação, bolsas de estudos e “o direito de alcançar o mais alto padrão possível de saúde física e mental que a participação no esporte traz”.

“O COI não deve demorar um dia a mais para remover o Taleban do movimento olímpico, retirar seu status e interromper o financiamento que o COI fornece”, acrescentou.

Por que isso importa?

A vida das mulheres tem sido particularmente dura no Afeganistão. Aquelas que tinham cargos no governo afegão antes da ascensão talibã seguem impedidas de trabalhar, e a cúpula do governo que prometia ser inclusiva é formada somente por homens. A perda do salário por parte de muitas mulheres que sustentavam suas casas tem contribuído para o empobrecimento da população afegã.

Na educação, o governo extremista mantém fora da escola cerca de três milhões de meninas acima da sexta série, sob o argumento de que as escolas só serão reabertas quando os radicais tiverem a certeza de um “ambiente seguro”.

Mulheres também não podem sair de casa desacompanhadas. Para lembrar as afegãs de suas obrigações, os militantes ergueram cartazes em algumas áreas para informar os moradores sobre as regras. Em partes do país, as lojas estão proibidas de vender mercadorias a mulheres desacompanhadas.

Há também um código de vestimenta para as mulheres, forçadas a usar o hijab quando estão em público. Como forma de protestar, mulheres afegãs em todo o mundo iniciaram um movimento online, postando fotos nas redes sociais com tradicionais roupas afegãs coloridas, sempre acompanhadas de hashtags como #AfghanistanCulture (cultura afegã) e #DoNotTouchMyClothes (não toque nas minhas roupas).

A repressão de gênero é um das razões citadas pelas nações de todo o mundo para não reconhecerem o Taleban como governantes de direito do Afeganistão. Assim, o país segue isolado da comunidade internacional e afundado na pobreza. O reconhecimento internacional fortaleceria financeiramente um país pobre e sem perspectiva imediata de gerar riqueza.

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