ONU e EUA reagem após milícia atacar cidade que abrigava civis no Sudão

Forças de Apoio Rápido foram alvo de críticas internacionais após ação que expulsou cerca de 300 mil pessoas de Wad Medani

As Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês), milícia armada que desde abril enfrenta as Forças Armadas Sudanesas (SAF, na sigla em inglês) em um conflito que já deslocou sete milhões de pessoas no Sudão, entraram na mira de Washington e da ONU (Organização das Nações Unidas) nesta semana, após atacarem uma cidade no centro-oeste do país.

Wad Medani vinha sendo um refúgio seguro para civis deslocados no país africano, bem como um importante centro para os esforços internacionais de ajuda humanitária. No início do mês, entretanto, as RSF passaram a atacar a cidade, levando os militares regulares a baterem em retirada. Cerca de 300 mil pessoas também foram forçadas a deixar a cidade, o que gerou críticas das Nações Unidas e dos EUA.

“Com esta última onda de combates, o pânico terá se espalhado entre a população civil em Wad Madani, e pessoas foram vistas abandonando a cidade em veículos e a pé, muitas pela segunda vez em apenas alguns meses”, afirmou na terça-feira (19) o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur).

Refugiados do Sudão após cruzarem a fronteira rumo ao Chade (Foto: UNICEF/UN0834340/Le Du)

No texto, o Acnur se diz “preocupado com o aprofundamento da crise dos deslocamentos forçados no Sudão e nos países vizinhos.” E afirma que, devido aos conflitos que atingiram o estado de Al Jazeera, onde fica Wad Medani, a situação humanitária é “terrível”, com centenas de milhares de pessoas que lá chegaram em busca de abrigo forçadas a fugir mais uma vez.

O Departamento de Estado norte-americano também se posicionou. “Um avanço contínuo das RSF gera o risco de baixas civis em massa e perturbações significativas dos esforços de assistência humanitária. O avanço das RSF já causou deslocamento em grande escala de civis vulneráveis ​​do estado de Al Jazeera, muitos dos quais não têm para onde ir, e o fechamento de mercados em Wad Medani, dos quais muitas pessoas dependem”, diz comunicado do órgão diplomático.

O Acnur ainda afirmou que seu plano de emergência para apoiar os refugiados que deixaram o Sudão foi financiado em apenas 38%. Os beneficiários são cerca de 1,8 milhão de pessoas que passaram a viver em países vizinhos, quais sejam ChadeEgitoSudão do SulEtiópia e República Centro-Africana.

Por que isso importa?

O Sudão vive um violento conflito armado que coloca frente a frente dois generais que comandam o país africano desde o golpe de Estado de 2021: Abdel Fattah al-Burhan, chefe das SAF, e Mohamed Hamdan “Hemedti” Daglo, à frente da milícia das RSF.

As tensões decorrem de divergências sobre a incorporação dos combatentes das RSF às Forças Armadas, o que levou a milícia a se insurgir. Hemedti tem entre 70 mil e cem mil homens sob seu comando, de acordo com a rede Deutsche Welle (DW), enquanto al-Burhan lidera um efetivo de cerca de 200 mil.

No dia 16 de abril, um domingo, explosões puderam ser ouvidas no centro da capital Cartum, mais precisamente no entorno do quartel-general militar do Sudão e do palácio presidencial, locais estratégicos reivindicados tanto por militares quanto pelas RSF.

O aeroporto internacional da capital, tomado pela milícia, foi bombardeado com civis dentro. Aeronaves foram destruídas, e caças da força aérea sudanesa e tanques foram usados contra os paramilitares.

Embora as SAF sejam mais bem equipadas e em maior número, as RSF são igualmente bem treinadas, o que equilibra as ações. O balanço de forças apenas prolonga as hostilidades e a violência decorrente, com nenhum dos dois lados conseguindo se impor sobre o inimigo.

Desde que o conflito se espalhou, primeiro pela capital, depois por outras regiões do país, as nações estrangeiras que tinham cidadãos e representantes diplomáticos no Sudão realizaram um processo de evacuação, viabilizado por um frágil cessar-fogo que não foi totalmente respeitado pela partes.

Os números de civis mortos e vítimas de abusos diversos não param de crescer desde então. A situação levou o secretário-geral da ONU (Organização das Nações Unidas), António Guterres, a dizer em julho que o país africano está “à beira de uma guerra civil“, com ao menos sete milhões de pessoas forçadas a deixar suas casas.

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