EUA prendem adolescente que embarcaria para se juntar ao Estado Islâmico-Khorasan

Vigiado há um ano, jovem foi preso quando tentava embarcar em um voo para se juntar à facção do grupo radical no Afeganistão

Autoridades norte-americanas anunciaram na terça-feira (19) a prisão de um adolescente de 17 anos acusado de fornecer apoio material ao Estado Islâmico (EI). Identificado como Humzah Mashkoor, ele estava na mira do FBI, a polícia federal dos EUA, há cerca de um ano, de acordo com a rede ABC News.

O jovem foi denunciado inicialmente por uma rede social, cujo nome não foi citado pelo Departamento de Justiça. A partir do momento em que constataram a radicalização, agentes disfarçados passaram a se comunicar com ele para construir o flagrante.

Mashkoor usava o apelido online Humzah Afghan e, nas conversas com os agentes através da internet manifestou seu apoio ao EI. Também disse que havia nascido nos EUA, viajado ao Afeganistão com a família e mais tarde retornado ao território norte-americano.

O adolescente foi preso quando tentava embarcar em um voo com o objetivo de se juntar ao Estado Islâmico-Khorasan (EI-K) no Afeganistão. Trata-se da facção associada ao EI em território afegão e que atualmente rivaliza com o próprio Taleban. É responsabilizada pelas mortes de milhares de afegãos em ataques terroristas nos últimos anos.

“Ele indicou o desejo de regressar ao Afeganistão, onde tem família em Nangarhar e outras áreas sob controle talibã. Mashkoor afirmou que anteriormente apoiava o Taleban, mas começou a ‘investigar mais’ ‘o dawlah’ (uma das identificações do EI) depois que eles ‘atacaram o aeroporto e pegaram os soldados talibãs e americanos e os enviaram para Jahanam’ (o inferno islâmico)”, diz a denúncia.

Integrantes dos exércitos dos EUA e do Iraque exibem bandeira do Estado Islâmico (Foto: Flickr)

Para as autoridades dos EUA, a manifestação do jovem foi um claro sinal de apoio ao ataque realizado pelo EI-K contra o aeroporto de Cabul que matou 183 pessoas durante a retirada das tropas estrangeiras do Afeganistão, em 23 de agosto de 2021. Entre os mortos estavam 13 pessoas que serviam às forças norte-americanas.

Nas conversas com o agente disfarçado, Mashkoor teria dito que estava pronto para deixar tudo e todos para trás a fim de juntar ao EI e que cumprira todas as ordens do grupo radical. “Estou preparado para fazer qualquer coisa que eles exijam que eu faça. Só quero ser usado o mais rápido possível, ataques com armas”, disse o jovem, segundo o Departamento de Justiça.

Por que isso importa?

Embora tenha ganhado notoriedade somente após o Taleban ascender ao poder, o EI-K não é novo no cenário afegão. O grupo extremista opera no Afeganistão desde 2015 e surgiu na esteira da criação do EI do Iraque e da Síria. Foi formado originalmente por membros de grupos do Paquistão que migraram para fugir da crescente pressão das forças de segurança paquistanesas. Não há diferença substancial entre as facções, somente o local de origem, a região de Khorasan, originalmente parte do Irã.

Com a ocupação estrangeira no Afeganistão encerrada, e o antigo governo local deposto pelo Taleban, os principais alvos do EI-K têm sido a população civil, sobretudo a minoria xiita, e os próprios talibãs, tratados como apóstatas pelos extremistas, sob a acusação de que abandonaram a jihad por uma negociação diplomática.

Os ataques suicidas são a principal marca do EI-K, que habitualmente tem uma alta taxa de mortes por atentado. O mais violento de todos ocorreu durante a retirada de tropas dos EUA e da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), quando as bombas do grupo mataram 183 pessoas na região do aeroporto de Cabul.

Enquanto o EI-K ganha relevância no Afeganistão, o EI passa por um processo de enfraquecimento global que começou com a derrota em seus dois principais redutos. No Iraque, o Exército iraquiano retomou os territórios que o grupo dominava desde 2014. Já as FDS (Forças Democráticas Sírias), uma milícia curda apoiada pelos EUA, anunciaram em 2019 o fim do “califado” criado pela facão extremista na Síria.

De acordo com relatório divulgado em agosto de 2023 pela ONU (Organização das Nações Unidas), o EI “continua a comandar entre cinco mil e sete mil membros em todo o Iraque e na República Árabe da Síria, a maioria dos quais combatentes.” No entanto, “adotou deliberadamente uma estratégia para reduzir os ataques, a fim de facilitar o recrutamento e a reorganização.”

Atualmente, a maioria dos líderes do EI permanece no noroeste da Síria, mas “o grupo realocou algumas figuras-chave para outros lugares.” Um continente de forte presença da organização é a África, com afiliados locais representando uma ameaça constante aos governos da região.

A avaliação da equipe de monitoramento da ONU, entregue ao Conselho de Segurança no final de julho, surge em meio a mais um momento crucial da luta contra o terrorismo. Desde fevereiro de 2022, o EI sofreu diversos duros golpes, com três líderes da organização mortos em operações de combate ao terrorismo.

O mais recente deles foi Abu al-Hussein al-Husseini al-Qurashi, morto em abril. O governo turco reivindicou a ação, embora a própria organização terrorista alegue que o comandante morreu em confronto com o Hayat Tahrir Al-Sham (HTS), uma organização extremista associada à Al-Qaeda e listada pelo governo norte-americano como terrorista.

“Apesar do progresso feito no direcionamento de suas operações financeiras e quadros de liderança, a ameaça representada pelo Daesh (sigla árabe que identifica o grupo) e suas afiliadas regionais permaneceu alta e dinâmica nas amplas áreas geográficas onde está presente”, diz o relatório, citando a África como uma região de particular preocupação.

Terrorismo no Brasil

Episódios recentes mostram que o Brasil é visto como porto seguro pelos extremistas e é, também, um possível alvo de ataques. Em dezembro de 2013, levantamento do site The Brazil Business indicava a presença de ao menos sete organizações terroristas no Brasil: Al-Qaeda, Jihad Media Battalion, Hezbollah, Hamas, Jihad Islâmica, Al-Gama’a Al-Islamiyya e Grupo Combatente Islâmico Marroquino.

Em 2016, duas semanas antes do início dos Jogos Olímpicos no Rio, a PF prendeu um grupo jihadista islâmico que planejava atentados semelhantes aos dos Jogos de Munique em 1972. Dez suspeitos de serem aliados ao EI foram presos e dois fugiram.

Mais tarde, em dezembro de 2021, três cidadãos estrangeiros que vivem no Brasil foram adicionados à lista de sanções do Tesouro Norte-americano. Eles foram acusados de contribuir para o financiamento da Al-Qaeda, tendo inclusive mantido contato com figuras importantes do grupo terrorista.

A ameaça voltou a ser evidenciada com a prisão, em outubro de 2023, de três indivíduos supostamente ligados ao Hezbollah que operavam no Brasil. Eles atuavam com a divulgação de propaganda do grupo extremista e planejavam atentados contra entidades judaicas.

Para o tenente-coronel do exército brasileiro André Soares, ex-agente da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), tais episódios causam “preocupação enorme”, vez que confirmam a presença do país no mapa das organizações terroristas islâmicas.

“A possibilidade de atentados terroristas em solo brasileiro, perpetrados não apenas por grupos extremistas islâmicos, mas também pelo terrorismo internacional, é real”, diz Soares, mestre em operações militares e autor do livro “Ex-Agente Abre a Caixa-Preta da Abin” (editora Escrituras).

A opinião é compartilhada por Barbara Krysttal, gestora de políticas públicas e analista de inteligência antiterrorismo.

“O Brasil recorrentemente, nos últimos dez, cinco anos, tem tido um aumento significativo de grupos terroristas assediando jovens e cooptando adultos jovens para fazer parte de ações terroristas no mundo todo”, disse ela, que também vê o país sob ameaça de atentados. “Sim, é um polo que tem possibilidade de ser alvo de ações terroristas.”

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