Falha na super vigiada fronteira de Israel pode se repetir nos EUA, alertam especialistas

Soldados, sensores, armas automatizadas e rede de inteligência eletrônica não bastaram para impedir o ataque do Hamas

Quando o Hamas atacou Israel no dia 7 de outubro, matando cerca de 1,2 mil cidadãos israelenses e dando início a uma guerra no Oriente Médio, chamou a atenção a incapacidade do Estado judeu de antecipar o golpe e contê-lo. Nem os avançados sistemas de vigilância da divisa com a Faixa de Gaza foram capazes de frear os invasores, uma falha de segurança que, na opinião de especialistas ouvidos pela revista Newsweek, poderia se repetir nos EUA.

A fronteira de Israel com Gaza tem um muro de cerca de seis metros de altura e bastante profundo, a fim de dificultar a construção de túneis. Há ainda sensores sísmicos e térmicos, radares, centenas de câmeras com visão noturna e armas automatizadas.

Também estão posicionados na divisória soldados muito bem treinados e equipados, que contam com uma rede de inteligência eletrônica capaz de monitorar ligações telefônicas, mensagens de texto e e-mails. Trata-se de tecnologia de última geração idêntica à usada pelos EUA, mas nada disso bastou para detectar os invasores.

Fronteira entre Israel e a Palestina (Foto: Ingmar Zahorsky /Flickr)

No Pentágono, sede do Departamento de Defesa norte-americano, a reação à ineficácia israelenses foi de espanto e preocupação. O sistema tecnológico, que deveria ter emitido sinais de alerta aos militares, não cumpriu sua função, e cerca de 2,5 mil militantes do Hamas penetraram por terra, mar e ar no território israelense, onde permaneceram durante horas, atacando aldeias, postos militares e uma festa de música eletrônica. Além dos mortos, fizeram 240 reféns.

“As lições para o Pentágono são enormes”, diz Amy Nelson, pesquisadora de política externa do grupo de pesquisas Brookings, de Washington. “Os países com as defesas mais tecnológicas e as Forças Armadas mais modernas não vencerão necessariamente a batalha. Os ataques surpresa ainda podem passar.”

Ela adverte que toda tecnologia pode ter sido contornada com bloqueadores portáteis que custam cerca de US$ 800 (R$ 3,89 mil) e podem ser adquiridos por qualquer pessoa. “É uma das primeiras regras da guerra: retire as comunicações do inimigo”, disse.

Já Bradley Bowman, ex-piloto da Força Aérea norte-americana e hoje diretor do Centro de Poder Militar e Político, parte do think tank Fundação para a Defesa das Democracias, destaca a falha humana, ao afirmar que mesmo as mais poderosas Forças Armadas do Oriente Médio, referindo-se a Israel, fracassaram na missão de conter os agressores do Hamas.

“Agora eles estão tentando entender como um adversário bárbaro foi capaz de matar mais judeus num único dia do que em qualquer momento desde o Holocausto”, declarou Bowman.

Outra questão crucial para o sucesso dos invasores foi a falha nos habitualmente eficientes serviços de inteligência de Israel, como destacou Iain Boyd, diretor do Centro de Iniciativas de Segurança Nacional da Universidade do Colorado.

Também o “Domo de Ferro”, avançado sistema de defesa antiaéreo de Israel, acabou superado. O Hamas disparou entre três mil e cinco mil foguetes contra o território israelense e sobrecarregou as defesas do inimigo, que contavam com apenas cerca de mil mísseis capazes de identificar e interceptar os ataques.

“Os interceptadores de Israel custam mais de US$ 50 mil cada”, diz Boyd. “Isso é cem vezes mais do que o custo de um foguete do Hamas. Permitiu que o Hamas dominasse o sistema.”

Para os EUA, mais importante aliado de Israel e igualmente um alvo habitual de extremistas, o perigo é evidente. Algo que de certa forma já havia ficado claro no Afeganistão, onde mesmo toda a tecnologia não bastou para a vitória das tropas norte-americanas, que acabaram por se retirar em agosto de 2021 do país, entregando-o ao governo do Taleban.

“A tecnologia é um multiplicador de forças, mas não é o Santo Graal”, diz Boyd. “O Pentágono está observando o que acontece em Israel e deve pensar sobre as próprias vulnerabilidades.”

Bowman alerta que o perigo para Washington não se limita mais a radicais islâmicos. Os inimigos norte-americanos se multiplicaram nos últimos anos e contam como tecnologias muito mais avançadas que as do Hamas, como mísseis hipersônicos que conseguem driblar qualquer defesa antiaérea, armas nucleares e especialistas em guerra cibernética que frequentemente obtêm sucesso em seus ataques a alvos digitais ocidentais.

“Com a Rússia na Ucrânia, a China ameaçando Taiwan, o Irã se aproximando da capacidade nuclear enquanto ameaça Israel, além da ameaça da Coreia do Norte, estamos no ambiente de segurança mais assustador que já vi na minha vida”, afirmou o ex-piloto da Força Aérea.

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