EUA e Taiwan veem China ampliar influência na América Latina

China procura reduzir a lista de países que ainda reconhecem Taiwan no continente, e Washington acredita que Paraguai pode ser o próximo alvo

A crescente influência chinesa na América Latina tende a aumentar a lista de países que não reconhecem Taiwan formalmente. Depois de Honduras, que há poucas semanas anunciou que buscaria relações diplomáticas com Beijing, o que implicaria em romper relações com a ilha semiautônoma, o próximo pode ser o Paraguai, reconhece Washington. As informações são da agência Reuters.

Por conta do princípio “Uma Só China“, o país mais populoso do mundo vê a província rebelde como seu território e não permite que os países mantenham relações diplomáticas com ambos. Ainda assim, a presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, viajou nesta semana à Guatemala e a Belize para dar um gás na relação com os dois últimos parceiros da América Central, sinalizando esforços de seu governo para impedir que novas rupturas diplomáticas aconteçam.

Após Honduras deixar Taiwan e se aliar a Beijing, o turbulento território insular ficou com relações diplomáticas formais com apenas 13 países, entre eles o Paraguai.

A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen (Foto: Divulgação/Governo de Taiwan)

Só que, na visão de analistas independentes, o país da América do Sul poderá seguir o mesmo caminho caso as eleições presidenciais de abril sejam vencidas pela oposição ao conservador Mario Abdo Benítez, que já chamou Taiwan de “farol da democracia na região”. Seu adversário, Efraín Alegre, abordou a possibilidade de rever a aliança com a ilha asiática em caso de vitória. A justificativa é comercial: ele tem esperança de aumentar as exportações cruciais de soja e carne bovina.

“O Paraguai está claramente em disputa”, disse Benjamin Gedan, que foi assessor do ex-presidente dos Estados Unidos Barack Obama e atualmente é diretor do programa para a América Latina no centro de estudos Wilson Center, em Washington.

Caso o cenário se concretize, seria outro golpe para os EUA, que vêm tendo pouco êxito em deter a onda de perdas diplomáticas de Taiwan. Também ilustra como a Casa Branca está “perdendo o controle” da América Latina.

Já o candidato de situação no Paraguai, Santiago Pena, do Partido Colorado (ANR-PC), prometeu manter o reconhecimento de Taiwan. Uma delegação multipartidária inclusive visitou a ilha em fevereiro para acalmar o nervosismo taiwanês.

Só que o lobby agrícola tem falado alto. A pressão é intensa nos últimos anos para que o Paraguai, que figura entre os dez maiores exportadores de carne bovina do mundo e é o quarto maior exportador de soja, reveja seus laços com Taiwan, uma democracia pequena, mas vigorosa.

O volume comercial entre Assunção e Beijing dobrou nos últimos oito anos e é muito maior do que com os Estados Unidos para o país sul-americano, como mostram dados do maior repositório de dados do comércio internacional do mundo, o Comtrade da ONU (Organização das Nações Unidas). Porém, isto é impulsionado pelas importações, enquanto as exportações para a economia número 2 do mundo continuam minúsculas.

“Ter relações comerciais com a China vai ser favorável para os produtores e para o país”, disse Eno Michels, presidente da Associação de Produtores de Soja do Paraguai.

Alguns parlamentares norte-americanos estão preocupados com a tendência, que inclui cinco nações nas Américas mudando de aliança em pouco mais de cinco anos.

Entre eles, Mike Gallagher, presidente republicano do Comitê Seleto da Câmara sobre a Competição Estratégica entre os Estados Unidos e o Partido Comunista Chinês (PCC), disse à Reuters que Beijing estava tentando isolar Taiwan, possivelmente como um prelúdio para invadir a ilha, “tirando vantagem de nossa complacência”.

Por outro lado, autoridades dos EUA observam que Taiwan também parece “mais interessada em fortalecer os laços não oficiais com parceiros que pensam da mesma forma na Europa do que em competir para manter o escasso reconhecimento diplomático”, citando os casos da Lituânia e da República Tcheca.

EUA enfraquecido na América Latina

Na visão de David Castrillon-Kerrigan, professor-pesquisador sobre questões relacionadas à China na Universidade Externado da Colômbia, o governo dos EUA está “perdendo o controle” da América Latina.

“Para países como Honduras, não reconhecer o governo de Beijing significava perder oportunidades”, disse Castrillon-Kerrigan. “Os Estados Unidos estão definitivamente perdendo influência em todas as frentes, especialmente na frente econômica, mas também diplomática, política e culturalmente”, acrescentou.

Entre 2005 e 2020, os chineses investiram mais de US$ 130 bilhões na América Latina, segundo o Instituto de Paz dos Estados Unidos. O comércio entre a China e a região também disparou, devendo chegar a mais de US$ 700 bilhões até 2035.

Tamanho poder de influência chinês também vem da iniciativa multibilionária Nova Rota da Seda (BRI, na sigla em inglês, de Belt And Road Initiative), que ofereceu aos países em desenvolvimento portos, ferrovias, usinas de energia e outras infraestruturas, financiados por empréstimos concedidos a taxas de mercado. Em meio a tensões crescentes com Washington, toda essa cifra astronômica investida na América Latina parece estar “se pagando”.

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