Trump reacende disputa pelo Canal do Panamá e amplia tensão com a China

Presidente dos EUA alega presença chinesa e reivindica o controle da hidrovia, gerando reações de Beijing e do governo panamenho

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, voltou a questionar o controle do Canal do Panamá, insinuando que a China exerce influência sobre a hidrovia e sugerindo que Washington poderia reassumi-la. Durante seu segundo discurso de posse, ele afirmou que seu país entregou a operação ao Panamá e agora cogita retomá-lo para evitar que Beijing assuma o controle, gerando reações imediatas dos governos chinês e panamenho e acirrando disputas geopolíticas na região. As informações são da rede Deutsche Welle (DW).

O governo panamenho negou qualquer ingerência chinesa sobre a administração do canal. O presidente José Raúl Mulino rebateu diretamente as insinuações feitas por Trump, afirmando em uma postagem na rede social X, antigo Twitter, que não há “absolutamente nenhuma interferência chinesa” na gestão da hidrovia. A China também criticou as declarações do líder americano, reforçando que seu interesse na região é puramente comercial e parte de relações diplomáticas normais.

A polêmica ocorre em um momento de crescente preocupação dos EUA sobre a influência chinesa na América Latina. O novo secretário de Estado americano, Marco Rubio, já havia alertado durante sua audiência de confirmação no Senado que “um argumento poderia ser feito de que os termos sob os quais o canal foi entregue foram violados”. A afirmação reforça a possibilidade de que Washington volte a pressionar por uma maior presença na gestão da hidrovia, estratégica para o comércio global.

Canal do Panamá: palco de disputa entre Washington e Beijing (Foto: Stan Shebs/WikiCommons)

O Canal do Panamá, inaugurado em 1914 e administrado pelos EUA até 1999, segue sob gestão da Autoridade do Canal do Panamá (ACP), um órgão governamental panamenho. Apesar das alegações americanas, a entidade sempre reforçou sua autonomia e neutralidade. No entanto, a presença econômica chinesa na região aumentou significativamente nos últimos anos, desde que o Panamá estabeleceu relações diplomáticas com Beijing em 2017 e aderiu à Nova Rota da Seda (BRI, na sigla em inglês, de Belt And Road Initiative).

As preocupações americanas se concentram principalmente nos portos de Balboa e Cristóbal, localizados nas duas extremidades do canal, ambos operados por uma subsidiária da empresa Hutchison Port Holdings, de Hong Kong, desde 1997. Analistas especulam que, em um cenário de conflito, Beijing poderia utilizar sua influência econômica e técnica para obstruir o funcionamento da hidrovia.

Em uma audiência no Congresso americano no ano passado, a então chefe do Comando Sul das Forças Armadas dos EUA, general Laura Richardson, alertou que muitos investimentos chineses na região poderiam servir como “pontos de acesso futuro para estratégias navais”, citando o Canal do Panamá como um dos locais críticos. O pesquisador Evan Ellis, do US Army War College, afirmou que, em um eventual conflito na Ásia, a China poderia “fechar o canal de forma não atribuível”, por meio de sabotagem ou bloqueio naval.

Embora Beijing rejeite tais especulações, os laços comerciais entre China e Panamá continuam a se fortalecer. O presidente chinês, Xi Jinping, descreveu a relação bilateral como benéfica para ambos os povos e reafirmou o compromisso de Beijing com a cooperação econômica.

Por outro lado, a postura de Trump sinaliza uma abordagem mais agressiva em relação à influência chinesa na América Latina. Desde que reassumiu a presidência, ele tem adotado medidas duras contra países vizinhos, incluindo a ameaça de impor tarifas de 25% sobre todas as importações do Canadá e do México a partir de 1º de fevereiro.

A postura americana também tem gerado reações na região. A Colômbia conseguiu evitar uma disputa comercial ao aceitar aeronaves militares americanas transportando migrantes deportados. Já a presidente de Honduras, Xiomara Castro, convocou uma reunião urgente da Comunidade dos Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) para discutir as recentes medidas da administração Trump.

Enquanto isso, a China pode tirar proveito da retórica agressiva dos EUA para reforçar sua imagem de parceiro confiável. “Isso abre espaço para a China neutralizar a influência americana e expandir seus interesses políticos e comerciais na América Latina”, avalia Ellis.

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