Ataques a chineses ampliam colaboração entre Islamabad e Beijing na segurança

Violência está relacionada à forte presença econômica de Beijing no Baluchistão, contestada por grupos separatistas

No Paquistão, têm aumentado os atentados cujos alvos são cidadãos chineses. As ações, conduzidas por grupos separatistas do Baluchistão, têm como pano de fundo o Corredor Econômico China-Paquistão (CPEC), que projeta ligar a cidade paquistanesa de Gwadar a Xinjiang, no noroeste da China, por meio de rodovias e ferrovias. Na tentativa de frear a ameaça, Islamabad e Beijing aumentaram a colaboração no campo da segurança, com um atentado sob investigação, algumas prisões anunciadas e acusações direcionadas à Índia, uma rival em comum dos dois governos. As informações são da agência Reuters.

Ao menos dois atentados com vítimas chinesas ocorreram neste ano. Em abril, uma mulher-bomba acionou o dispositivo que carregava em uma mochila e matou quatro pessoas, três delas nascidas na China. Em setembro, mais um cidadão chinês morreu baleado e outros dois ficaram feridos em um ataque realizado em Karachi, cidade mais populosa do país e mesmo palco da ação anterior.

“Ataques contra cidadãos chineses e projetos no Paquistão são de grande preocupação para o governo”, disse o Ministério do Interior paquistanês em comunicado.

O primeiro ataque foi reivindicado pelo Exército de Libertação Balúchi (ELB), um dos muitos grupos separatistas da região, que desde 2019 é considerado pelos EUA uma organização terrorista. Embora nenhum grupo tenha assumido a autoria do segundo atentado, especula-se que tenha sido realizado igualmente por separatistas balúchis.

Outro grupo, o Exército Nacional Balúchi (BLA), publicou um vídeo alertando que a violência não terá fim e que os principais alvos continuarão a ser os chineses. “Presidente da China, você ainda tem tempo para sair do Baluchistão. Caso contrário, você será levado para fora do Baluchistão de uma maneira que nunca esquecerá”, diziam os radicais no vídeo.

Soldado do exército do Paquistão, foto de novembro de 2018 (Foto: Wikimedia Commons)

A fim de investigar os incidentes, Beijing enviou uma equipe ao país vizinho e ofereceu apoio aos serviços de contraterrorismo paquistaneses. Sistemas de câmeras e de recuperação de dados de celulares foram fornecidos para Islamabad melhor equipar suas forças de segurança.

Após uma investigação conjunta, a força-tarefa binacional foi capaz de chegar ao principal suspeito do ataque de abril, que acabou preso em julho. Já a mulher que acionou o dispositivo foi identificada como Hayat, uma professora com mestrado em Zoologia que se radicalizou durante o período em que estudou em Quetta, a capital do Baluchistão.

“Pode ser difícil saber exatamente o que a levou a se juntar à luta armada balúchi”, diz um relatório sem data emitido pelo departamento de contraterrorismo paquistanês. “No entanto, ela permaneceu como membro da Organização de Estudantes Baúchis (BSO, na sigla em inglês) Azad durante sua vida estudantil”.

A facção Azad da BSO foi inclusive banida pelas autoridades locais devido ao extremismo, e hoje atua clandestinamente no campus universitário. Entre outras ações, o grupo realiza um verdadeiro processo de lavagem cerebral que visa a converter simpatizantes.

O Paquistão há anos acusa a Índia de apoiar a insurgência balúchis, o que Nova Délhi nega.

Separatistas x Beijing

A rejeição dos balúchis à China está atrelada à relação comercial entre Beijing e Islamabad, que inclui uma série de projetos de infraestrutura chineses no Baluchistão, inseridos na Nova Rota da Seda (BRI, na sigla em inglês, de Belt And Road Initiative). Trata-se de uma  iniciativa lançada pelo presidente Xi Jinping para financiar obras de infraestrutura no exterior.

O objetivo central da BRI é espalhar influência através do investimento. No total, 140 países foram beneficiados com dinheiro proveniente da iniciativa chinesa até 2020, sendo o maior número da África, 40 nações. Entre 2013 e dezembro de 2020, a China investiu cerca de US$ 770 bilhões nos países participantes da BRI.

No Paquistão, o investimento chinês se concentra no Baluchistão, uma região que se estende por três países, sendo os outros dois Irã e Afeganistão. É uma porção área montanhosa, árida e rica em recursos minerais, cujo nome vem dos balúchis, um povo muçulmano essencialmente sunita que é originário do Irã e habita a área.

A porção paquistanesa é a mais extensa e tem sido palco de muita violência nos últimos anos. Grupos separatistas que atuam na região entraram em conflito com o governo do Paquistão, o que gerou milhares de mortes desde 2004. Organizações extremistas islâmicas ajudam a aumentar a tensão.

A luta dos separatistas é por maior autonomia política em relação a Islamabad e pelo direito de explorar os vastos recursos da região. Isso gerou desavenças particularmente com a China, sob a acusação de que o CPEC, anunciado em 2015 e com um orçamento de US$ 60 bilhões, estaria sugando as riquezas sem melhorar as condições da população local.

Os balúchis argumentam que o projeto bilionário de infraestrutura não tem beneficiado a região, enquanto outras províncias paquistanesas colhem os frutos. O caso gera protestos generalizados, e os chineses são vistos como invasores dispostos a extrair as riquezas locais.

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