China investe pesado nas frotas comercial e militar, supera Ocidente e domina os mares

Beijing tem a Marinha mais numerosa do mundo e a Guarda Costeira mais poderosa, deixando para trás rivais como EUA e Japão

Os mares do planeta são hoje dominados pela China. O investimento inigualável nas frotas comercial e militar permitiu ao país asiático deixar para trás seus dois maiores concorrentes no setor marítimo, EUA e Japão. A Marinha e a Guarda Costeira chinesas são as maiores do mundo, enquanto a frota pesqueira tem alcance global e pode ser avistada em todas as águas, segundo reportagem da revista Newsweek.

O Exército de Libertação Popular (ELP) chegou a interromper a produção de embarcações para sua Marinha entre 2019 e 2022, mas já retomou o processo. Somente no ano passado, foram colocados na água 30 novos navios, levando a frota para além de 370 unidades. Mais que a poderosa Marinha norte-americana, que conta atualmente com 291.

Segundo o Departamento de Defesa dos EUA, a ampliação da frota militar chinesa não será interrompida, e até 2025 o país tende a alcançar 395 navios, com 435 projetados para 2030. Caminho inverso ao que atualmente seguem as Forças Armadas norte-americanas, que projetam reduzir as unidades a serviço de sua Marinha para 285 até daqui a dois anos.

Mesmo em termos de tonelagem, o que ainda garante vantagem a Washington, Beijing vem diminuindo a diferença, e a projeção é de que em alguns anos assuma a dianteira. O investimento foi igualmente alto em submarinos, totalizando hoje 80 chineses contra 57 norte-americanos.

Navios de guerra da marinha chinesa durante treinamento militar (Foto: eng.chinamil.com.cn)
Disputa territorial

Paralelamente ao investimento na Marinha, Beijing também fortalece sua Guarda Costeira, que tem hoje 150 embarcações. Para se ter ideia do que isso representa, os EUA tem 60, e o Japão, importante aliado norte-americano nos mares, tem 70.

Tamanho poder permite ao governo chinês assediar vizinhos, com quem o país trava disputas territoriais sobretudos no Mar da China Meridional e no Mar da China Oriental. A principal vítima atualmente é a Marinha das Filipinas, que frequentemente denuncia ações hostis de embarcações chinesas.

A situação levou os governos de Japão e Filipinas a fortaleceram seus laços militares, negociando um pacto de defesa voltado a enfrentar a China. Nem o respaldo dos Estados Unidos basta para intimidar a Guarda Costeira chinesa, que tem conseguido se impor para fortalecer as reivindicações do país.

No caso de Filipinas e China, a disputa envolve o Mar da China Meridional, onde ambos reivindicam soberania, bem como VietnãMalásiaBrunei e Taiwan. Todos os países estão de olho nos ricos recursos naturais da hidrovia, pela qual passam anualmente cerca de US$ 3 trilhões em comércio marítimo.

O Japão, por sua vez, questiona os avanços de Beijing no Mar da China Oriental, onde ficam as ilhas Senkaku. Embora esteja sob controle do Japão, o arquipélago é reivindicado pela China, e barcos chineses são constantemente vistos na região, uma forma de pressionar os japoneses em meio à disputa territorial.

Frota pesqueira onipresente

Outro setor no qual são registrados atritos envolvendo a China é o pesqueiro. Barcos de pesca comercial chineses marcam presença em praticamente todas as águas do planeta, acumulando acusações de pesca ilegal e assédio a outras embarcações.

A frota pesqueira chinesa cresceu mais de 500% desde 2013 e tem hoje mais de 500 mil navios. Assim, o país tende a controlar, até o final desta década, uma fatia de 37% de toda a captura mundial de peixes, conforme dados do Banco Mundial. Como os pesqueiros frequentemente contam com o suporte de navios da Guarda Costeira, o enfrentamento é inviável.

Problemas envolvendo pesqueiros chineses foram registrados em setembro deste ano também na costa das Filipinas, onde uma barreira flutuante foi instalada com o objetivo de afastar pescadores locais.

Em Moçambique, na África, o setor da pesca está atualmente em situação crítica, e parte da culpa é da atuação indiscriminada de pesqueiros chineses nas áreas de “maternidade”, onde os peixes deveriam se reproduzir. O problema foi registrado em um relatório do Centro de Integridade Pública (CIP), órgão moçambicano independente de fiscalização da esfera pública, de março deste ano.

Até o Brasil está no mapa da frota pesqueira chinesa. Em agosto, o portal de notícias argentino Infobae relatou que a pesca ilegal chinesa nas águas do Amazonas emergiu como um desafio crítico para a preservação dessa região vital para o equilíbrio global.

Segundo a reportagem, pesqueiros provenientes do gigante asiático estão operando ao largo da costa amazônica do Estado do Pará em busca de peixes, mariscos e água doce, indo além da questão de violação da soberania nacional.

Navios comerciais a serviço do Exército

Embora a atuação da frota comercial chinesa pareça um problema essencialmente econômico, também há um lado militar. Recente estudo realizado pelo projeto Poder da China do think tank Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, na sigla em inglês), de Washington, destacou que navios usados para transportar automóveis elétricos, setor no qual a China é igualmente hegemônica, vêm sendo preparados para servir ao ELP.

No cerne da questão estão os supercargueiros ro-ro (do termo em inglês roll on-roll off, rolar para dentro e para fora). São embarcações especializadas no transporte de veículos, balsas enormes que permitem a entrada e saída de veículos por seus próprios meios, diferente dos cargueiros tradicionais que mantêm os contêineres no convés e precisam de guindastes para o embarque e desembarque.

Beijing vem investindo pesado na produção dessas embarcações, e empresas do país devem entregar 200 novos ro-ros entre 2023 e 2026, o dobro das entregas feitas entre 2015 e 2022. Porém, o ELP notou que eles podem ter funções militares devido à enorme capacidade de transporte de veículos, e alguns já foram modificados para essa função. Inclusive foram avistados em exercícios das Forças Armadas, uma forma de testar sua eficiência em um eventual ataque anfíbio a Taiwan.

Em dezembro do ano passado, relatório do Pentágono, o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, alertou que uma invasão anfíbia em larga escala a Taiwan seria problemática porque sobrecarregaria as forças armadas da China, tamanho o desafio de transportar tropas e equipamentos. “Os ro-ros civis podem ajudar a preencher essa lacuna”, diz o estudo do CSIS.

Até juridicamente o país se movimentou, colocando e vigor em 2016 a Lei de Transporte de Defesa Nacional, segundo a qual empresas chinesas de transporte marítimo devem “fornecer assistência no descanso do pessoal e no reabastecimento para navios, aeronaves e automóveis que participem de resgates internacionais, escoltas marítimas e operações militares na defesa dos interesses nacionais.”

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