China volta a contestar sanções impostas à Rússia e atribui parcialmente a culpa pela guerra à Otan

Beijing diz que não admite ser forçada a "escolher um lado. UE diz esperar que ao menos os chineses não interfiram na punição imposta a Moscou

O Ocidente e a China continuam a manifestar opiniões antagônicas no que tange à guerra na Ucrânia. Sobretudo quando o assunto é o pacote de sanções impostas pela União Europeia (UE) e pelos EUA à Rússia em função do conflito. Isso ficou claro mais uma vez em uma cúpula virtual que reuniu líderes do bloco europeu e do país asiático na última sexta-feira (1º).

Pelo lado da UE, a cúpula contou com o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o líder da política externa do bloco, Josep Borrell. Já a China foi representada pelo presidente Xi Jinping e pelo premiê chinês Li Keqiang, conforme informações da agência Associated Press.

De acordo com von der Leyen, as duas partes “manifestaram pontos de vista claramente opostos” sobre muitos temas debatidos, embora tenham concordado que é do interesse de todos que a guerra seja encerrada. Nesse sentido, Beijing prometeu usar da melhor maneira sua influência e seu poder como membro permanente do Conselho de Segurança da ONU (Organização das Nações Unidas).

O presidentes chinês Xi Jinping e líder russo Vladimir Putin em 2019 (Foto: www.kremlin.ru)

As diferenças entre as partes sempre foram muito claras. No dia anterior ao encontro virtual, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, havia afirmado que o país asiático “desaprova a solução de problemas por meio de sanções e se opõe ainda mais a sanções unilaterais e jurisdições de longo alcance que não têm base no direito internacional”.

Segundo Zhao, Beijing não admite ser forçada a “escolher um lado ou adotar uma abordagem simplista de amigo ou inimigo. Devemos, em particular, resistir ao pensamento da Guerra Fria e ao confronto do bloco”.

Então, o porta-voz tratou de justificar a agressão russa, dizendo que a guerra se explica pela ameaça cada vez maior que a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) representa para Moscou. “Como culpado e principal instigador da crise na Ucrânia, os EUA levaram a Otan a se envolver em cinco rodadas de expansão para o leste nas últimas duas décadas após 1999”, declarou ele.

Von der Leyen, por sua vez, disse esperar que, no mínimo, a China não interfira nas sanções ocidentais, mesmo que não as aprove. Entretanto, tanto ela quanto Michel afirmaram que, durante a cúpula, Beijing não deu nenhuma garantia de que não fornecerá suporte financeiro ou militar à China. Assim, a presidente da Comissão Europeia declarou que uma inciativa chinesa que viesse a contribuir para a manutenção da guerra por parte da Rússia causaria “um grande dano à reputação da China” na Europa.

“O setor empresarial está acompanhando de perto os eventos e avaliando como os países estão se posicionando”, disse von der Leyen. “Esta é uma questão de confiança, de confiabilidade e, claro, de decisões sobre investimentos de longo prazo”.

De um lado, Li afirmou na cúpula que “a China espera que a UE também forneça um ambiente de negócios sólido para as empresas chinesas que investem e se desenvolvem na Europa”. Já a UE contra-argumentou em tom de alerta, lembrando que 13,7% do comércio total da China é feito com o bloco de 27 nações e 12% com os Estados Unidos, contra apenas 2,4% com a Rússia.

Por que isso importa?

A escalada de tensão entre Rússia e Ucrânia, que culminou com a efetiva invasão russa ao país vizinho no dia 24 de fevereiro, remete à anexação da Crimeia pelos russos, em 2014, e à guerra em Donbass, que começou naquele mesmo ano e se estende até hoje.

O conflito armado no leste da Ucrânia opõe o governo central às forças separatistas das autodeclaradas Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, que formam a região de Donbass e foram oficialmente reconhecidas como territórios independentes por Moscou. Foi o suporte aos separatistas que Putin usou como argumento para justificar a invasão, classificada por ele como uma “operação militar especial”.

“Tomei a decisão de uma operação militar especial”, disse Putin pouco depois das 6h de Moscou (0h de Brasília) de 24 de fevereiro, de acordo com o site independente The Moscow Times. Cerca de 30 minutos depois, as primeira explosões foram ouvidas em Kiev, capital ucraniana, e logo em seguida em Mariupol, no leste do país, segundo a agência AFP.

Desde o início da ofensiva, as forças da Rússia caminham para tentar dominar Kiev, que tem sido alvo de constantes bombardeios. O governo da Ucrânia e as nações ocidentais acusam Moscou de atacar inclusive alvos civis, como hospitais e escolas, o que pode ser caracterizado como crime de guerra ou contra a humanidade.

Fora do campo de batalha, o cenário é desfavorável à Rússia, que tem sido alvo de todo tipo de sanções. Além das esperadas punições financeiras impostas pelas principais potencias globais, que já começaram a sufocar a economia russa, o país tem se tornado um pária global. Representantes russos têm sido proibidos de participar de grandes eventos em setores como esporte, cinema e música.

De acordo com o presidente dos EUA, Joe Biden, as punições tendem a aumentar o isolamento da Rússia no mundo. “Ele não tem ideia do que está por vir”, disse o líder norte-americano, referindo-se ao presidente russo Vladimir Putin. “Putin está agora mais isolado do mundo do que jamais esteve”.

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