EUA anunciam primeiras prisões em operação contra centro de polícia da China em Nova York

As estações, instaladas em diversos países, são suspeitas de ajudar o governo chinês a perseguir e até repatriar dissidentes à força

A Justiça norte-americana determinou na segunda-feira (17) a prisão de dois indivíduos suspeitos de servir a um centro de polícia ilegal estabelecido pelo governo da China em Nova York. Lu Jianwang e Chen Jinping, que vivem na cidade, são acusados ​​de “conspirar para atuar como agentes do governo chinês” e de obstruir a justiça, de acordo com o Departamento de Justiça (DoJ, na sigla em inglês).

A existência dos “centros de serviço da polícia no exterior” foi revelada em um relatório publicado em setembro de 2022 pela ONG de direitos humanos Safeguard Defenders. À época da denúncia, ao menos 54 estações funcionavam em todo o mundo, com o objetivo de assediar cidadãos chineses no exterior. Desde então, diversos países passaram a investigar a prática e a fechar os estabelecimentos.

Nova York, com o Empire State em destaque (Foto:Sam Valadi/Flickr)

“A RPC (República Popular da China), por meio de seu aparato repressivo de segurança, estabeleceu uma presença física secreta na cidade de Nova York para monitorar e intimidar dissidentes e críticos de seu governo”, disse o procurador-geral adjunto Matthew Olsen na segunda-feira. “As ações da RPC vão muito além dos limites da conduta aceitável do Estado-Nação”.

O promotor Breon Peace classificou a estação em questão como uma “delegacia de polícia secreta no meio da cidade de Nova York”, que chegou a ser usada para “localizar um dissidente chinês que vive nos Estados Unidos“.

Na acusação, a promotoria federal diz que Lu “tinha uma relação de confiança de longa data” com autoridades chinesas, em particular o Ministério de Segurança Pública. Ele teria, inclusive, ajudado Beijing a localizar dois cidadãos chineses que vivem nos EUA, enquanto um terceiro indivíduo chegou a retornar à China porque supostamente era procurado por um crime.

“É simplesmente escandaloso que o Ministério de Segurança Pública da China pense que pode estabelecer uma delegacia de polícia secreta e ilegal em solo americano para ajudar em seus esforços de exportar a repressão e subverter nosso estado de direito”, disse Kurt Ronnow, diretor assistente interino da divisão de contraespionagem do FBI, a polícia federal dos EUA.

Rastreamento e perseguição

Segundo a Safeguard Defenders, estações como a de Nova York surgiram como associações comunitárias de cidadãos de uma mesma região chinesa, como o objetivo de fornecer apoio administrativo a turistas e imigrantes, por exemplo na confecção de documentos. Com o tempo, porém, passaram a ser usados para reprimir dissidentes e cidadãos chineses acusados de crimes em seu país.

Na maioria dos casos, os locais operam um sistema online que coloca o cidadão chinês em contato com as autoridades na China. Os indivíduos são muitas vezes convencidos, sob pressão, a retornar ao território chinês para enfrentar a justiça local. Há indícios de envolvimento ativo das estações no rastreamento e na perseguição dos alvos em países estrangeiros.

Mais denúncias

Paralelamente às duas prisões, a Justiça norte-americana apresentou outras denúncias criminais contra 44 chineses ligados à atuação do centro de polícia de Nova York, entre eles funcionários do Ministério de Segurança Pública da China e da Administração do Ciberespaço da China.

Conforme a denúncia, “os réus criaram e usaram contas falsas em redes sociais para assediar e intimidar dissidentes da RPC residentes no exterior e buscaram suprimir a liberdade de expressão dos dissidentes na plataforma de uma empresa de telecomunicações dos EUA” cujo nome não foi revelado.

“O Ministério de Segurança Pública da China usou agentes para atingir pessoas de ascendência chinesa que tiveram a coragem de se manifestar contra o Partido Comunista Chinês (PCC), em um caso, espalhando secretamente propaganda para minar a confiança em nossos processos democráticos. E, em outro, suprimindo a liberdade de expressão de usuários de videoconferência nos EUA”, disse Ronnow.

Chineses repatriados

Dados da Safeguard Defenders apontam que, entre abril de 2021 e julho de 2022, 230 mil chineses “foram devolvidos para enfrentar possíveis acusações criminais na China” com ajuda dos centros de polícia. Os métodos adotados “geralmente incluem ameaças e assédio contra membros da família em casa ou diretamente contra o alvo no exterior, seja por meio online ou físico”. Para todos os efeitos, o governo chinês alega que os repatriados são acusados de algum crime.

Com a ajuda desses centros, Beijing impõe vigilância estatal e persegue inclusive grupos étnicos, com destaque para tibetanos e a minoria muçulmana uigur, bem como suas famílias.

Dois “centros de serviço” chineses operam o Brasil, sendo um em São Paulo e o outro no Rio de Janeiro. Entretanto, a Safeguard Defenders afirma que não há registro de assédio contra chineses nessas estações, que aparentemente vêm sendo usadas somente para dar apoio administrativo a turistas e imigrantes.

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