As autoridades de Hong Kong confiscaram os bens do ex-deputado pró-democracia Ted Hui, exilado desde 2020, sob a alegação de que os valores foram obtidos por meio de crimes contra a segurança nacional. A decisão, tomada por um tribunal da cidade, resultou no congelamento de mais de US$ 300 mil. A medida foi solicitada pelo Departamento de Justiça, segundo relatou a rede Radio Free Asia (RFA).
O montante havia sido transferido pelo ex-parlamentar para sua esposa e sua mãe antes de deixar o território, enquanto aguardava julgamento em liberdade. Segundo a acusação, Hui teria forjado documentos e enganado a Justiça para obter permissão para sair de Hong Kong. Após deixar o território, ele foi acusado de incitar secessão, subversão do poder estatal e colaborar com forças estrangeiras para comprometer a segurança nacional.
Hui classificou a decisão como “absurda” e uma forma de “retaliação política” contra sua atuação pró-democracia. “Isso é uma violação flagrante dos meus direitos humanos”, afirmou em comunicado. O governo de Hong Kong, por sua vez, declarou que as críticas à medida são “infundadas” e reforçou que seguirá utilizando “todos os meios legais” para punir indivíduos que representem riscos à segurança do Estado.
A legislação local permite a apreensão de bens de qualquer réu que tenha cometido crimes contra a segurança nacional e tenha transferido ativos a terceiros nos seis anos anteriores ao processo. Com base nessa norma, o governo argumenta que os valores repassados à família de Hui ainda pertenciam a ele e, portanto, podiam ser confiscados.

Hui revelou que, antes de deixar Hong Kong, já havia sofrido bloqueios financeiros, com suas contas bancárias congeladas. Agora, com a nova decisão judicial, ele afirmou que os últimos ativos que possuía no território foram apreendidos. “Isso prova que nossos temores eram justificados. Nenhum dinheiro deixado em Hong Kong está seguro”, declarou.
O ex-parlamentar ressaltou que a quantia transferida para sua família equivaleria a cerca de 10 mil dólares de Hong Kong (R$ 7,3 mil ) por mês ao longo dos seis anos desde que deixou o território. Após o anúncio, ele alertou ao cidadãos que busquem maneiras de mover seus recursos para fora de Hong Kong e evitem confiscos arbitrários.
“O povo de Hong Kong consegue ver claramente o que está acontecendo e certamente levará seu dinheiro para o exterior”, disse ele. “Felizmente, meus pais venderam sua casa em Hong Kong alguns anos atrás e transferiram o dinheiro para outro lugar.”
Por que isso importa?
Após ser transferido do domínio britânico para o chinês, em 1997, Hong Kong passou a operar sob um sistema mais autônomo e diferente do restante da China. Entretanto, apesar da promessa inicial de que as liberdades individuais seriam respeitadas, a submissão a Beijing sempre foi muito forte, o que levou a protestos em massa de 2019.
A resposta chinesa aos protestos veio com autoritarismo, representado pela lei de segurança nacional, que a partir de junho de 2020 deu ao governo de Hong Kong o poder de silenciar a oposição e encarcerar os críticos. O antigo texto vinha sendo usado até março de 2024, quando uma nova lei, ainda mais dura, foi aprovada.
A aprovação do novo texto legal atendeu a uma determinação da Lei Básica, uma espécie de Constituição do território. Ela exigia em seu artigo 23 que um mecanismo legal próprio fosse estabelecido para substituir o anterior, este imposto emergencialmente pela China. A nova versão da lei pune crimes como traição, insurreição, incitação de membros das Forças Armadas ao motim e conluio com forças externas.
Os críticos ao governo local alegam que os direitos de expressão e de associação vêm diminuindo cada vez mais em Hong Kong desde que a antiga lei entrou em vigor, ampliando a repressão aos dissidentes. Já as autoridades locais reforçam a ideia de que a normativa legal é necessária para preservar a estabilidade do território.
O Reino Unido, por sua vez, diz que ela viola o acordo estabelecido quando da entrega do território à China. Isso porque havia uma promessa de que as liberdade individuais, entre elas eleições democráticas, seriam preservadas por ao menos 50 anos. Metade do tempo se passou, e Beijing não cumpriu sua parte no acordo. Muito pelo contrário.
Nos últimos anos, os pedidos por democracia foram silenciados, a liberdade de expressão acabou e a perspectiva é de que isso se mantenha por um “longo prazo”. Nas palavras do presidente Xi Jinping, “qualquer interferência deve ser eliminada.”