Ilhas Salomão estão perto de pacto de segurança com a China, diz primeiro-ministro

Países do Indo-Pacífico estão receosos quanto à militarização da região. Premiê nega que base chinesa será construída

O premiê das Ilhas Salomão confirmou na terça-feira (29) que está prestes a assinar um acordo de segurança com a China. Em tom desafiador, as declarações de Manasseh Sogavare, feitas no Parlamento, irritaram os líderes da oposição local. As informações são do jornal The Indian Express.

O anúncio disparou o alarme na vizinha Austrália e em outros aliados ocidentais no Indo-Pacífico e colocou a pequena nação insular no olho do furacão de um debate tenso sobre o futuro da região.

Sogavare, que pela primeira vez falou sobre o vazamento do esboço do acordo com Beijing, definiu como “insultantes” as preocupações australianas e neozelandesas de que o pacto poderia causar instabilidade na segurança da região. O Indo-Pacífico tem preocupações com a influência da China, que aumentou vertiginosamente de uns tempos para cá.

O primeiro-ministro das Ilhas Salomão, Manasseh Sogavare (Foto: WikiCommons)

O documento vazado dá a entender que, com a celebração do acordo, a China poderia basear navios de guerra nas Ilhas Salomão. O rascunho ainda sugere que o país estaria apto a solicitar a Beijing suporte policial e militar, o que indica que tropas chinesas poderiam intervir internamente na ilha no caso de uma hipotética atmosfera de crise. E é justamente esse intercâmbio na vizinhança, bem em frente à porta de Austrália e da Nova Zelândia, que incomoda ambos os países.

“As Ilhas Salomão podem, de acordo com suas próprias necessidades, solicitar à China que envie policiais, policiais armados, militares e outras forças policiais e armadas para as Ilhas Salomão para ajudar na manutenção da ordem social, protegendo a vida e a propriedade das pessoas”, diz o documento, que acrescenta: “Nenhuma das partes deve divulgar as informações de cooperação a terceiros”.

Sogavare não poupou críticas aos responsáveis pelo vazamento do acordo preliminar. “Lunáticos” e “agentes de interferência estrangeira”, acusou o primeiro-ministro, que durante o discurso ainda disse que a busca pela “hegemonia liberal” havia falhado. Ele também condenou as potências estrangeiras por “supor que as Ilhas Salomão não poderiam agir em seus próprios interesses”.

A autoridade também se recusou em fornecer detalhes sobre o acordo que, segundo ele, já está finalizado. Porém, disse que não sofreu pressão de Beijing nem “tem intenção de pedir à China que construa uma base militar”.

As Ilhas Salomão, com população de cerca de 700 mil pessoas, ficam localizadas em território estratégico, bem no centro de um cabo de guerra geopolítico. O país tem se aproximado de Beijing desde 2019, quando mudou o reconhecimento diplomático de Taiwan para a China, sublinhando a crescente influência chinesa em uma região que era tradicionalmente dominada por EUA e Austrália.

‘Amiga de todos’

Sogavare garantiu que estratégia de política externa das Ilhas Salomão é a de “ser amiga de todos e inimiga de ninguém”, o que, segundo ele, manteria a nação afastada de qualquer conflito geopolítico.

Matthew Wale, líder do partido de oposição no Parlamento das Ilhas Salomão, não comprou o discurso do premiê e se disse receoso quanto à utilização do acordo, que poderia “ser usado para qualquer coisa”. O político acrescentou: “Não tem nada a ver com a segurança nacional das Ilhas Salomão”.

A primeira-ministra da Nova Zelândia, Jacinda Ardern, também observa beligerância no pacto: “Vemos esses atos como a potencial militarização da região”.

Por que isso importa?

As Ilhas Salomão vivem um período de intensa agitação social, que especialistas associam a questões étnicas e históricas, à corrupção estatal e ao movimento do governo para estreitar laços com a China. Há três anos, o governo local trocou a aliança diplomática com Taiwan por uma com Beijing.

Para James Batley, um ex-alto comissário australiano para as Ilhas Salomão e especialista em assuntos sobre Ásia-Pacífico da Universidade Nacional Australiana, o desagrado da população em relação à aproximação com a China serviu como gatilho para a desordem popular que explodiu em novembro de 2021.

“Não é política externa em si, mas acho que essa mudança diplomática alimentou as queixas pré-existentes e, em particular, a sensação de que os chineses interferiram na política nas Ilhas Salomão, que o dinheiro chinês de alguma forma fomentou a corrupção, distorceu a forma como a política funciona nas Ilhas Salomão”, disse Batley.

A relação comercial com a China é considerada particularmente predatória pela população local. Mais da metade de todos os frutos do mar, madeira e minerais extraídos do Pacífico em 2019 foi para a China. A estimativa é de que esse processo tenha movimentado US$ 3,3 bilhões, apontou uma análise de dados comerciais do jornal britânico The Guardian.

Para alimentar e gerenciar a população de quase 1,4 bilhão de habitantes, a China tirou do Pacífico mais recursos do que os dez países da região juntos. Nas Ilhas Salomão e em Papua Nova Guiné, por exemplo, mais de 90% do total de madeira exportada foi para os chineses.

Os dados não levam em consideração as exportações ilícitas. Nas Ilhas Salomão, pelo menos 70% das toras são exportadas de madeira ilegal. A falta de leis na China contra esse tipo de importação absorvem o envio devido à alta demanda e proximidade com a região.

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