A Nova Rota da Seda (BRI, sigla em inglês para Belt and Road Initiative), iniciativa chinesa de investimento global em infraestrutura, tende a “aumentar ainda mais a degradação ambiental e as mudanças climáticas”. A constatação é do think tank canadense Iffras (Fórum Internacional por Direitos e Segurança, da sigla em inglês), conforme relatório publicado na semana passada.
“A Nova Rota da Seda (BRI) tem um grande foco na construção de projetos de energia, e quase 90% deles são intensivos em carbono, operando com combustível fóssil“, diz o documento publicado pelo Iffras. “Dada a magnitude da BRI, que se espalha pelos cinco continentes, o planeta vai sofrer impactos graves e negativos graças ao jeito chinês de construir projetos em que as diretrizes ambientais dificilmente são seguidas”.
A constatação vai na contramão das promessas de Beijing de que a iniciativa seja ambientalmente sustentável. “De 2014 a 2017, 91% dos empréstimos sindicalizados para o setor de energia pelos seis principais bancos chineses, e 61% dos empréstimos do setor de energia financiados inteiramente pelo China Development Bank ou pelo China Exim Bank foram em combustíveis fósseis”, afirma a ONG WRI (Instituto de Recursos Mundiais, da sigla em inglês).
Em países como Indonésia, Egito, Quênia, Bangladesh, Vietnã e Turquia, a BRI está ligada a projetos de usinas de geração de energia movidas a carvão. No final de 2016, a ONG Global Environment Institute (Instituto de Meio Ambiente Global, em tradução literal) registrou 240 projetos movidos a carvão ligados à iniciativa chinesa.
“Os bancos chineses financiaram 60 novas usinas movidas a carvão fora do país. Isso significa que a China tem mais de 70% de participação na construção de usinas a carvão em todo o mundo”, diz o relatório do Iffras. “Todas as 60 usinas iriam emitir 276 megatons de CO2 por ano, o que é equivalente ao que toda a Espanha libera todos os anos”.
A questão ambiental tem gerado rejeição a Beijing em países que antes recebiam o dinheiro chinês de braços abertos. Na Turquia, um grupo de organizações ambientais solicitou aos bancos chineses a redução do investimento na usina a carvão de Adana, por questões de saúde e ambientais. Na Sérvia, a população de Bor protesta constantemente contra a degradação ambiental causada por um projeto chinês de mineração e fundição de cobre.
Outros países têm testemunhado protestos de ativistas ambientais contra as usinas a carvão da BRI. Situações assim foram registradas na Indonésia, no Paquistão, nas Filipinas, na África do Sul e no Vietnã.
Poluição terceirizada
Enquanto investe em energia limpa em seu próprio país, a China despeja a energia suja no exterior. “Embora a China pareça determinada a cumprir as metas do acordo climático de Paris em casa, ela prejudica os esforços para reduzir as emissões globais ao investir simultaneamente em projetos de carvão em todo o mundo”, disse Yossi Cadan, ativista da ONG 350.org.
“Um dos motivos por trás da Nova Rota da Seda é a terceirização da poluição e da degradação ambiental para países mais pobres e distantes, com extrema necessidade de financiamento de infraestrutura e desenvolvimento socioeconômico, cujos governos ignoram os riscos ambientais”, reforça Vuk Vuksanovic, pesquisador da Escola de Economia e Ciências Políticas de Londres.
Os investimentos chineses no exterior através da BRI foram de cerca de US$ 47 bilhões em 2020, 54% a menos do que em 2019, segundo dados da ONG Green BRI Center. Por outro lado, os dados mostram que os projetos verdes aumentaram no ano passado, embora ainda estejam longe do ideal. Os investimentos em energia renovável, pela primeira vez, foram a maioria dos investimentos chineses em energia no exterior: de 38% em 2019 para 57% em 2020.
Por que isso importa?
A BRI foi instituída em 2013 e é uma das bases da política externa do presidente Xi Jinping. O objetivo da iniciativa é espalhar a influência de Beijing através do investimento em projetos em todo o mundo, voltados sobretudo a infraestrutura e transporte.
No total, 140 países foram beneficiados com dinheiro proveniente da iniciativa chinesa até 2020, de acordo com a Green BRI Center. O maior número deles está na África, com 40 nações. Entre 2013 e dezembro de 2020, a China investiu cerca de US$ 770 bilhões nos países participantes da BRI.