Perseguidos em Mianmar, rohingya agora são obrigados a servir às Forças Armadas

Membros da minoria étnica muçulmana têm sido recrutados sob a mira de armas e treinados para lutar contra grupos rebeldes

Os rohingya, uma minoria muçulmana originária do estado de Rakhine, em Mianmar, sofre perseguição sistemática no país desde os anos 1960, sem direito a cidadania. Ultimamente, porém, eles atraíram a atenção da junta militar no poder, que sofre com a falta de soldados conforme perde a batalha contra os grupos rebeldes que tentam derrubar o governo. Assim, têm sido recrutados sob a mira de armas para servir às Forças Armadas, segundo relato da rede Radio Free Asia (RFA).

A junta está desesperada em busca de novos combatentes, conforme sofre perdas significativas devido à ofensiva da Tríplice Aliança, uma coalizão rebelde composta por três grupos: o Exército Arakan, o Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar (MNDAA) e o Exército de Libertação Nacional de Ta’ang. Dezenas de cidades foram conquistadas pelas forças de resistência desde outubro de 2023.

O general à frente da junta militar de Mianmar após o golpe de 1º de fevereiro de 2021, Min Aung Hlaing, em encontro diplomático em Moscou, Rússia, junho de 2017 (Foto: Divulgação/Vadim Savitsky)

Em fevereiro deste ano, Ye Myo Hein, conselheiro do think tank Instituto da Paz dos Estados Unidos, afirmou que a maioria dos batalhões das Forças Armadas atualmente não consegue atingir o efetivo mínimo para operar, que é de 200 militares. Além das baixas infligidas pelos rebeldes, o efetivo reduzido se explica pelo alto número de deserções.

Nas últimas semanas, uma alterativa encontrada pelo governo para driblar o problema foi implementar uma lei exigindo serviço militar obrigatório de dois anos, o que levou milhares de jovens a buscar a brigo na Tailândia para não lutar. Recrutar à forças os rohingya é a opção mais recente.

Segundo um membro da minoria étnica que passou pelo processo de recrutamento forçado, soldados foram até a porta da casa dele armados de rifles e o obrigaram a acompanhá-lo até um destacamento do Exército. Lá, ao lado de outros rohingya, foi informado de que passaria por um treinamento de 14 dias e então formaria uma milícia para enfrentar os rebeldes. Em troca, receberia um salário de um milhão de quiates (R$ 2,3 mil) mensais e o estatuto de cidadão birmanês.

O Islamismo, justamente o que motiva a perseguição contra os rohingya em um país budista, foi citado pelos militares no discurso de recrutamento, sob o argumento de que eles deveriam lutar para preservar sua identidade religiosa e cultural. Poucos, porém, estão dispostos a atender à convocação, e aqueles que conseguem fogem durante o processo de treinamento.

Por que isso importa?

Os rohingyas compõem um grupo étnico muçulmano minoritário de Mianmar, no sudeste da Ásia. Embora vivam nos estados de Rahkine e Chin, no oeste do país, não têm direito à cidadania e são perseguidos pelas autoridades locais, com relatos de assassinatos, estupros e outros abusos.

Investigações indicam que os militares birmaneses foram responsáveis ​​por atrocidades que incluem mutilações, crucificações, queima e afogamento de crianças, numa ação deliberada de “limpeza étnica” hoje classificada globalmente como genocídio. Ativistas de direitos humanos pressionam há tempos por esforços internacionais para responsabilizar Mianmar por crimes contra a humanidade.

Diante desse cenário, cerca de um milhão de pessoas da minoria fugiram para Bangladesh desde 2017, sendo abrigados em precários campos para refugiados como o de Cox’s Bazar, o mais superlotado do mundo.

Outros 600 mil rohingyas continuam em Mianmar, vivendo sob as leis opressivas do governo militar que comanda o país. A perseguição é tão violenta que tornou-se habitual as pessoas lotarem embarcações rumo a Bangladesh, embora as condições que os esperam no destino sejam terríveis e o trajeto até lá seja extremamente perigoso.

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