Os rohingya, uma minoria muçulmana originária do estado de Rakhine, em Mianmar, sofre perseguição sistemática no país desde os anos 1960, sem direito a cidadania. Ultimamente, porém, eles atraíram a atenção da junta militar no poder, que sofre com a falta de soldados conforme perde a batalha contra os grupos rebeldes que tentam derrubar o governo. Assim, têm sido recrutados sob a mira de armas para servir às Forças Armadas, segundo relato da rede Radio Free Asia (RFA).
A junta está desesperada em busca de novos combatentes, conforme sofre perdas significativas devido à ofensiva da Tríplice Aliança, uma coalizão rebelde composta por três grupos: o Exército Arakan, o Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar (MNDAA) e o Exército de Libertação Nacional de Ta’ang. Dezenas de cidades foram conquistadas pelas forças de resistência desde outubro de 2023.
Em fevereiro deste ano, Ye Myo Hein, conselheiro do think tank Instituto da Paz dos Estados Unidos, afirmou que a maioria dos batalhões das Forças Armadas atualmente não consegue atingir o efetivo mínimo para operar, que é de 200 militares. Além das baixas infligidas pelos rebeldes, o efetivo reduzido se explica pelo alto número de deserções.
Nas últimas semanas, uma alterativa encontrada pelo governo para driblar o problema foi implementar uma lei exigindo serviço militar obrigatório de dois anos, o que levou milhares de jovens a buscar a brigo na Tailândia para não lutar. Recrutar à forças os rohingya é a opção mais recente.
Segundo um membro da minoria étnica que passou pelo processo de recrutamento forçado, soldados foram até a porta da casa dele armados de rifles e o obrigaram a acompanhá-lo até um destacamento do Exército. Lá, ao lado de outros rohingya, foi informado de que passaria por um treinamento de 14 dias e então formaria uma milícia para enfrentar os rebeldes. Em troca, receberia um salário de um milhão de quiates (R$ 2,3 mil) mensais e o estatuto de cidadão birmanês.
O Islamismo, justamente o que motiva a perseguição contra os rohingya em um país budista, foi citado pelos militares no discurso de recrutamento, sob o argumento de que eles deveriam lutar para preservar sua identidade religiosa e cultural. Poucos, porém, estão dispostos a atender à convocação, e aqueles que conseguem fogem durante o processo de treinamento.
Por que isso importa?
Os rohingyas compõem um grupo étnico muçulmano minoritário de Mianmar, no sudeste da Ásia. Embora vivam nos estados de Rahkine e Chin, no oeste do país, não têm direito à cidadania e são perseguidos pelas autoridades locais, com relatos de assassinatos, estupros e outros abusos.
Investigações indicam que os militares birmaneses foram responsáveis por atrocidades que incluem mutilações, crucificações, queima e afogamento de crianças, numa ação deliberada de “limpeza étnica” hoje classificada globalmente como genocídio. Ativistas de direitos humanos pressionam há tempos por esforços internacionais para responsabilizar Mianmar por crimes contra a humanidade.
Diante desse cenário, cerca de um milhão de pessoas da minoria fugiram para Bangladesh desde 2017, sendo abrigados em precários campos para refugiados como o de Cox’s Bazar, o mais superlotado do mundo.
Outros 600 mil rohingyas continuam em Mianmar, vivendo sob as leis opressivas do governo militar que comanda o país. A perseguição é tão violenta que tornou-se habitual as pessoas lotarem embarcações rumo a Bangladesh, embora as condições que os esperam no destino sejam terríveis e o trajeto até lá seja extremamente perigoso.