Rebeldes de Mianmar fazem aceno à China e defendem a anexação de Taiwan

Governo paralelo que desafia a junta diz apoiar o princípio "Uma só China' e mostra que quer Beijing a seu lado caso tome o poder

Em declaração divulgada por conta da virada de ano, o Governo de Unidade Nacional (NUG, na sigla em inglês), que estabeleceu um regime paralelo em desafio à junta militar de Mianmar, fez um aceno à China ao defender a política do país em relação a Taiwan. As informações são da rede Radio Free Asia (RFA).

O grupo de oposição, que é formado por líderes civis birmaneses e ativistas contrários à junta, publicou um declaração que inclui o apoio ao princípio “Uma só China”, segundo o qual Taiwan é território chinês, situação semelhante à de Hong Kong.

Trata-se de uma questão territorial sensível para Beijing, que promete enfrentar com força militar, se necessário, os planos da ilha de formalizar sua independência. apenas 12 nações do mundo atualmente reconhecem Taiwan como território independente, enquanto as demais aderiram ao princípio “Uma só China”.

A fim de evitar desavenças com o poderoso vizinho, o NUG diz na declaração que está empenhado em manter relações amigáveis com Beijing e que, caso assuma formalmente o poder em Mianmar, adotará medidas para salvaguardar os interesses econômicos do gigante asiático, impedindo inclusive a presença em seu território de qualquer organização que represente uma ameaça à segurança da região.

Duwa Lashi La, líder do Governo de Unidade Nacional de Mianmar (Foto: reprodução/Facebook)

Segundo Zin Mar Aung, ministra das Relações Exteriores do NUG, a política externa do grupo vem sendo mal interpretada, sobretudo no que tange à relação com seus vizinhos. Daí a necessidade de se posicionar, deixando claro que a relação sobretudo com o governo chinês é amistosa e de cooperação.

Paralelamente, o grupo ressalta que sua manifestação está em sintonia inclusive com Washington, que reconhece formalmente o princípio “Uma só China”, embora seja o mais importante parceiro comercial de Taiwan, o que é motivo de irritação para o governo chinês.

O aceno à China é também uma forma de competir com a própria junta, que tem no Partido Comunista Chinês (PCC) um de seus mais importantes parceiros, junto da Rússia.

Inicialmente, o golpe de Estado que colocou os militares no poder, em fevereiro de 2021, foi recebido com reprovação pela China, que vinha dialogando para firmar acordos comerciais com o governo eleito e perdeu financeiramente com a queda.

O cenário, entretanto, mudou rapidamente. Para não se distanciar dos militares, Beijing jamais se posicionou contra a prisão da líder democrática Aung San Suu Kyi, que deu início a protestos populares respondidos com violência pelas forças de segurança nacionais.

O governo chinês, na ocasião, classificou a detenção dela e de outros funcionários do governo como uma “remodelação de gabinete”, palavras usadas pela agência de notícias estatal Xinhua. Hoje, apoia o regime inclusive com o fornecimento de armas, desrespeitando um pedido de embargo global feito pela ONU para enfraquecer a junta.

Militares ameaçados

A tentativa de aproximação do NUG ocorre em um momento estratégico para os rebeldes. Para fortalecer sua luta contra a junta, eles formaram uma coalizão batizada de Aliança das Três Irmandades, composta por três grandes milícias: Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar (MDNAA, da sigla em inglês), Exército de Libertação Nacional de Ta’ang (TNLA) e Exército Arakan (AA).

Nos últimos meses, a aliança vem anunciando frequentes conquistas estratégicas, retirando de posições cruciais os soldados das Forças Armadas a serviço da junta. Inclusive, os rebeldes assumiram o controle de instalações militares, ganhando assim acesso a armas e outros equipamentos que acabam sendo empregados na luta.

Em novembro de 2023, Min Aung Hlain, que lidera a junta, admitiu que suas tropas foram forçadas a “abandonar alguns postos” no estado de Shan devido a uma pesada ofensiva rebelde. Foi uma rara confissão de fracasso do ditador que comanda o país desde o golpe de Estado de fevereiro de 2021.

Mais recentemente, em dezembro, em mais uma grande conquista da aliança, dezenas de soldados a serviço da junta teriam sido encurralados e obrigados a fugir do país rumo à Índia. Embora tenham sido autorizados a entrar, Nova Délhi prometeu que os militares seriam enviados de volta a Mianmar.

Na sequência, Duwa Lashi La, líder do NUG, disse que uma vitória definitiva contra os militares surge no horizonte. “Vimos uma deserção em massa e uma rendição de soldados da junta militar sem precedentes. Olhando para isto, pode-se dizer que o fim da junta militar está próximo”, disse ele. “As tropas da junta enfrentam diariamente uma situação em que seus soldados se rendem ou são capturados em batalhas.”

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