Quatro anos após golpe, Anistia Internacional cobra ação global contra atrocidades em Mianmar

Organização alerta para crimes contra a humanidade e reforça a necessidade de justiça internacional para responsabilizar os autores

A comunidade internacional deve agir com urgência para garantir a responsabilização por crimes cometidos em Mianmar desde o golpe militar de 1º de fevereiro de 2021, afirmaram 46 organizações em um comunicado divulgado pela ONG Anistia Internacional por conta do quarto aniversário da tomada de poder pelos militares.

Desde a derrubada do governo civil, as forças militares birmanesas mataram mais de seis mil pessoas, prenderam arbitrariamente mais de 20 mil e retomaram execuções judiciais. Além disso, mais de 3,5 milhões de pessoas foram deslocadas internamente. Grupos de direitos humanos documentaram tortura, maus-tratos e ataques indiscriminados que podem configurar crimes de guerra e crimes contra a humanidade.

“A junta militar de Mianmar realizou ataques generalizados e sistemáticos contra a população civil em todo o país, bombardeando escolas, hospitais e edifícios religiosos com total impunidade”, diz a Anistia. “Grupos armados que lutam contra os militares também cometeram violações de direitos humanos. Embora alguns tenham prometido responsabilizar os perpetradores, ainda não se sabe se esses esforços são genuínos e podem atender aos padrões internacionais.”

O ano de 2024 foi o mais violento para a minoria rohingya desde 2017. Homens, mulheres e crianças morreram em bombardeios no estado de Rakhine, onde enfrentam a violência tanto das forças militares quanto do grupo rebelde Exército Arakan.

Protesto em Mianmar pró-democracia e contra militares (Foto: WikiCommons)

Enquanto a junta perde território para forças rebeldes, novos governos locais surgem em áreas controladas por grupos étnicos armados ou pelo Governo de Unidade Nacional, formado por autoridades democraticamente eleitas antes do golpe. Nessas regiões, escolas, hospitais, tribunais e forças policiais estão sendo reestruturados.

A Anistia Internacional cobra que todos os envolvidos no conflito cumpram o direito humanitário internacional e cooperem com mecanismos de justiça global. A organização também pede que países vizinhos e membros da da Associação das Nações do Sudeste Asiático (Asean) aumentem a pressão sobre a junta militar, bloqueando o envio de armas e combustíveis de aviação.

“A Asean deve ir além de seu fracassado consenso de cinco pontos e tomar medidas decisivas para responsabilizar a junta”, afirma a ONG.

Avanço por responsabilização

Os esforços internacionais pela justiça avançam. Em novembro de 2024, o Tribunal Penal Internacional (TPI) solicitou um mandado de prisão contra o general Min Aung Hlaing, líder da junta, por crimes contra a humanidade cometidos contra os rohingyas entre agosto e dezembro de 2017. Outras acusações contra altos comandantes militares devem ser formalizadas em breve.

Se o mandado for concedido, todos os países signatários do TPI terão obrigação de prender qualquer suspeito presente em seu território e entregá-lo à corte para julgamento. “A comunidade internacional não pode permitir que os responsáveis escapem da justiça”, reforça a Anistia.

No entanto, a organização alerta que o pedido atual cobre apenas crimes cometidos até 2017 e ignora as violações ocorridas desde o golpe de 2021. “O promotor do TPI deve demonstrar progresso, incluindo crimes cometidos nos últimos quatro anos”, defende o comunicado.

Governos e entidades internacionais devem apoiar mecanismos de responsabilização mais amplos, como a jurisdição universal e a criação de tribunais híbridos. Além disso, a ONU precisa ampliar sanções, interromper o fornecimento de armas à junta e garantir a participação da sociedade civil na busca por justiça.

Mianmar será tema de discussões na próxima sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, entre 24 de fevereiro e 4 de abril. Para a Anistia Internacional, esse será um momento crucial para acabar com a impunidade e garantir a voz das vítimas e ativistas que seguem resistindo à repressão.

A crise humanitária em Mianmar é fruto de décadas de opressão. Segundo a Anistia Internacional, encerrar esse ciclo exige soluções inovadoras e um compromisso político e financeiro de longo prazo. “O mundo precisa agir agora”, afirma o documento.

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