Vaticano acusa Beijing de desrespeitar acordo sobre nomeação de bispos católicos

Santa Sé diz que bispo anteriormente nomeado pelo papa foi transferido para uma diocese não reconhecida oficialmente

O Vaticano acusa Beijing de desrespeitar um acordo firmado entre as partes em 2018, segundo o qual todas as nomeações de líderes católicos na China seriam feitas em comum acordo. As informações são do jornal The Washington Post.

De acordo com a Santa Sé, o governo chinês nomeou John Peng Weizhao, até então bispo de Yujiang, para ocupar o cargo de bispo auxiliar de Jiangxi, uma diocese que não é oficialmente reconhecida pela Igreja Católica.

Weizhao havia sido nomeado pelo papa Francisco em 2014, antes mesmo de o acordo entrar em vigor. Então, na última quinta-feira (24), Beijing decidiu pela mudança por conta própria.

“Na verdade, este evento não ocorreu de acordo com o espírito de diálogo”, afirmou o Vaticano em um duro comunicado divulgado no sábado (26), referindo-se ao fato de não ter sido consultado sobre a decisão. No texto, a Santa Sé diz ainda esperar que  “episódios semelhantes não se repitam”.

Zhao Lijian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, se manifestou sobre o episódio na segunda-feira (28) e afirmou desconhecer o problema com o bispo. “A China está disposta a expandir continuamente o consenso amigável com o lado do Vaticano e manter conjuntamente o espírito de nosso acordo provisório”, disse ele.

Beijing e Vaticano não mantêm relações diplomáticas formais desde 1951, em meio à ascensão dos comunistas ao poder e a consequente expulsão dos religiosos estrangeiros do país. Nos últimos anos, porém, as partes retomaram timidamente o diálogo, levando ao acordo de 2018.

Nesse cenário, os católicos chineses se dividem em dois grupos distintos. Uma parte segue o catolicismo sancionado pelo Estado e sujeito às regras do Partido Comunista Chinês (PCC). A outra se mantém leal ao pontífice e pratica a religião de forma clandestina.

Papa Francisco durante a 70ª Assembleia Geral da ONU, setembro de 2015 (Foto: UN Photo/Kim Haughton)
Por que isso importa?

Nos últimos meses, Beijing tem intensificado o controle sobre a religião, como parte de um processo de “sinicização” da fé. No início de dezembro de 2021, no Encontro Nacional Sobre Assuntos Religiosos do PCC, o presidente chinês Xi Jinping havia deixado clara a intenção de colocar a religião sob o guarda-chuva da sigla.

“Devemos manter o trabalho religiosos na direção essencial do partido. Devemos continuar a direcionar nosso país para a sinicização da religião. Devemos continuar a pegar o grande número de crentes religiosos e uni-los em torno do partido e do governo”, disse o líder nacional no evento.

O principal expoente do desafio que os fieis enfrentam na China é a etnia muçulmana dos uigures, que habitam a região autônoma de Xinjiang, no noroeste do país, fazendo fronteira com nações da Ásia Central, com quem divide raízes étnicas e linguísticas.

Em agosto de 2022, a ONU (Organização das Nações Unidas) divulgou um aguardado relatório que fala em “graves violações dos direitos humanos” cometidas em Xinjiang. O documento destaca “padrões de tortura ou maus-tratos, incluindo tratamento médico forçado e condições adversas de detenção”, bem como “alegações de incidentes individuais de violência sexual e de gênero”.

O governo chinês refuta as acusações e classifica como “campos de reeducação” as áreas onde vivem milhões de uigures. O argumento para isolar e vigiar a etnia muçulmana é o da “segurança nacional”, sob a justificativa de evitar a radicalização dos fiéis. Entretanto, para os governos de determinados países ocidentais, como Reino UnidoEstados Unidos e Canadá, a ação da China configura “genocídio”.

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