Alemanha detecta escalada da desinformação russa em relação à Ucrânia na Europa

Campanhas do Kremlin têm como objetivo distorcer o que as pessoas pensam e puxar o debate para o lado de Moscou

Um diplomata alemão de alto escalão alertou que as campanhas de desinformação da Rússia estão crescendo na Europa com o objetivo de enfraquecera percepção popular de apoio à Ucrânia. Recentemente, uma rede de milhares de contas falsas tentou fazer os alemães acreditarem que ajudar o país invadido estava prejudicando a Alemanha e potencialmente a conduzindo a um conflito, conforme noticiado pelo jornal Financial Times.

Ralf Beste, chefe do departamento de Cultura e Comunicação do Ministério Federal das Relações Exteriores da Alemanha, enfatizou que a situação é uma ameaça séria que precisa ser tratada com atenção. Ele apontou um “aumento na sofisticação e no impacto” das campanhas russas, destacando que as mensagens estão se tornando mais sutis e plausíveis, o que torna os ataques mais difíceis de enfrentar.

Beste mencionou também a crescente utilização de automação e a migração das conversas para canais privados no Telegram e WhatsApp, o que dificulta o monitoramento e a compreensão das atividades em curso.

Ralf Beste, chefe do departamento de Cultura e Comunicação do Ministério Federal das Relações Exteriores da Alemanha (Foto: WikiCommons)

O departamento liderado por Beste conta com uma equipe dedicada que conduz os esforços do governo alemão para monitorar e deter as operações de desinformação da Rússia no exterior.

A Alemanha está entre os principais alvos da desinformação do Kremlin sobre a guerra na Ucrânia. A explicação é lógica: sob o governo do primeiro-ministro Olaf Scholz, Berlim mudou bastante sua política de segurança e defesa, tornando-se o segundo maior doador de ajuda militar para Kiev, logo atrás de Washington.

As opiniões estão muito divididas sobre essas mudanças, especialmente entre os que apoiam o Partido Social Democrata de Scholz. Muitos alemães estão preocupados com o impacto econômico do afastamento do país do fornecimento de gás russo.

Beste acrescentou que os russos estão procurando lacunas de incerteza ou “sentimentos de inquietação” e estão “tentando ampliá-los”.

Manipulação

Neste ano, o departamento de Cultura e Comunicação descobriu uma das maiores tentativas de manipulação da opinião pública na Alemanha até agora, ocorrida na plataforma de mídia social X, antigo Twitter.

Uma rede de 50 mil contas falsas, postando até 200 mil vezes por dia, tentou convencer os alemães de que a ajuda do governo a Kiev prejudicava a Alemanha e aumentava o risco de uma guerra nuclear. O esquema tentou “camuflar” essas alegações, fazendo-as parecer provenientes de veículos tradicionais no país, como Der Spiegel e Süddeutsche Zeitung. Além disso, procurou amplificar as opiniões anti-Ucrânia existentes para fazê-las parecer mais generalizadas.

Na semana passada, o governo da República Tcheca, junto com outros países europeus, acusou o oligarca ucraniano Viktor Medvedchuk de construir secretamente uma rede de influência entre políticos europeus para espalhar narrativas pró-russas e minar o apoio a Kiev.

Beste explicou que combater esses esforços é desafiador e mostra o avanço da Rússia desde os tempos das conhecidas “fábricas de trolls”, que usavam pessoas reais para espalhar desinformação, muitas vezes de forma evidente.

O diplomata frisou que o desafio vai além da veracidade das informações: envolve distorcer opiniões, influenciar o debate e fazer as pessoas “acreditarem numa realidade diferente”.

Beste comparou as técnicas usadas a “cutucadas”, referindo-se ao conceito de ciência comportamental de usar pequenos sinais sociais para mudar sutilmente a opinião ou a ação. Ele explicou que ao introduzir dúvidas sobre um tópico, como “há cada vez mais dúvidas sobre XYZ”, as pessoas ficam mais receptivas a questionamentos sobre o assunto. Essas campanhas pegam elementos da realidade e os distorcem para criar uma impressão diferente, detalhou.

Tags: