Após perseguir jornalistas, Rússia agora está no encalço dos advogados deles

Há um ano no encalço da imprensa, o Kremlin tem também apertado o cerco contra juristas em sua lista de “agentes estrangeiros”

Yevgeny Smirnov, advogado do jornalista investigativo Ivan Safronov, preso desde julho de 2020 acusado de traição, fugiu da Rússia no final de novembro, tornando-se o segundo defensor a deixar o país nos últimos três meses. Há um ano no encalço da imprensa, o Kremlin tem também apertado o cerco contra causídicos, muitos deles incluídos na lista de “agentes estrangeiros”. As informações são da Radio Free Europe.

Smirnov responde por processos disciplinares impostos pela Ordem dos Advogados da região de Leningrado a mando da FSB (Agência de Segurança Federal, da sigla em inglês). Ele se refugiou na Geórgia no mês passado, de onde continua a trabalhar na defesa de seus clientes. O advogado ainda é acusado pelo serviço de segurança de faltar a seis procedimentos investigativos sem dar justificativas plausíveis.

Para Jeanne Cavelier, chefe do Mesa da ONG Repórteres Sem Fronteiras (RSF) para a Europa Oriental e Ásia Central, tais processos e rótulo “agente estrangeiro” atribuído a advogados “têm como objetivo colocar pressão adicional sobre os jornalistas que eles defendem, isolá-los e dissuadir aqueles que poderiam ajudá-los”.

Evgeny Smirnov, advogado russo que deixou o país devido à perseguição do governo Putin (Foto: reprodução/theins.ru)

“Instamos a Ordem dos Advogados da região de Leningrado e o Ministério da Justiça da Rússia a não cederem à pressão da FSB e a abandonarem todos os processos infundados contra advogados que defendem jornalistas, para que possam exercer sua profissão da maneira prescrita na lei”, disse Cavelier.

Outro advogado exilado em Tiblissi é Ivan Pavlov, ex-diretor da Fundação Anticorrupção (FBK) do oposicionista Alexei Navalny e proeminente defensor de causas de direitos humanos. Ele fugiu para a Geórgia e também responde a processos disciplinares, acusado de divulgação de dados relativos aos caso de Safronov e de ter repassado à inteligência da República Tcheca informações sobre a venda de armas pelo governo russo na África e no Oriente Médio. Pavlov classifica a acusação como de “motivação política”.

Pavlov foi adicionado pelo Ministério da Justiça à lista de “agentes estrangeiros” em novembro junto de quatro associados da Komanda 29, ONG formada por advogados e jornalistas defensores dos direitos humanos.

Os advogados ONG 29 foram precedidos pela chefe do Centro de Defesa da Mídia de Massa (MMDC, da sigla em inglês) Galina Arapova, uma importante aliada jurídica para meios de comunicação em dificuldade, que se tornou a primeira advogada a ser incluída na lista negra do governo russo em 8 de outubro.

Por que isso importa?

Organizações não-governamentais, veículos de imprensa e os colaboradores de ambos têm sido alvo de uma dura repressão do governo Putin, com o respaldo da Justiça do país. A perseguição se escora na “lei do agente estrangeiro”, que foi aprovada em 2012 e modificada diversas vezes, dando às autoridades o poder de acessar todas as informações privadas das instituições e indivíduos listados como “agentes estrangeiros”.

A designação também carrega conotações negativas da era soviética e serve para rotular o que seriam organizações envolvidas em atividades políticas financiadas pelo exterior. A classificação acaba por afastar potenciais parceiros comerciais e anunciantes, muitas vezes sufocando financeiramente as instituições rotuladas.

Órgãos e indivíduos listados e que não atendam às exigências impostas pela lei podem pegar pena de até dois anos de prisão, de acordo com o código penal russo, e as organizações correm o risco de serem proibidas de funcionar. Tal sistema repressivo tem sido a principal arma do Kremlin para calar os críticos, levando a ordens de prisão, casos de exílio forçado e ao fechamento de entidades.

Muitos jornalistas ligados ao oposicionista Alexei Navalny, atualmente preso em Moscou, tiveram suas casas invadidas pela polícia sob ordens de busca e apreensão e também foram adicionados à lista de “agentes estrangeiros”. O advogado Ivan Pavlov foi o mais recente partidário de Navalny a deixar a Rússia em consequência da repressão do Estado escorada na legislação.Facebook

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