Equipe de Navalny liga iate de US$ 700 milhões ao presidente da Rússia, Vladimir Putin

Embarcação tem quase exclusivamente tripulantes russos, sendo muitos deles empregados da agência que cuida da segurança pessoal do líder nacional

A equipe de Alexei Navalny, principal opositor do presidente da Rússia, Vladimir Putin, alega que um iate de US$ 700 milhões, o Scheherazade, atualmente ancorado em um porto da região italiana da Toscana, é de propriedade do líder russo. As informações são da rede Radio Free Europe.

Um vídeo publicado no YouTube pela equipe do oposicionista fez a denúncia. Um dos argumentos para associar a embarcação a Putin é o fato de que praticamente toda a tripulação, com exceção do capitão, é composta por cidadãs russos. E muitos deles são funcionários do Serviço Federal de Proteção (FSO, na sigla em russo), responsável pela proteção pessoal do presidente.

Também há registros de que, em duas ocasiões, uma em 2020, outra em 2021, o iate navegou até o Mar Negro, rumo a um resort na cidade russa de Sóchi. Putin tem uma residência oficial em Sóchi, para onde viaja habitualmente.

Assista ao vídeo, que é narrado em russo e tem legendas em inglês.

De acordo com a denúncia, trata-se de uma embarcação de 140 metros de extensão produzida em 2020 na Alemanha. Entretanto, como é praxe no que tange a bens associados a Putin e a oligarcas russos, a propriedade legal do iate é um mistério, vez que o registro envolve uma complexa teia de empresas de fachada e bancos em paraísos fiscais.

No início de março, em meio à operação de governos ocidentais para apreender iates e outros bens de oligarcas russos ligados ao presidente, o jornal The New York Times já havia levantado a possibilidade de que Putin fosse o verdadeiro dono do Scheherazade. À época, o capitão, o britânico Guy Bennett-Pearce, negou a relação entre o líder russo e a embarcação. “Eu nunca o vi. Nunca o conheci”, disse ele, que se recusou a dizer o nome do verdadeiro dono.

Mesmo considerando o mistério que habitualmente envolve iates desse porte, o caso do Scheherazade chama a atenção pelos excessos. Tanto os construtores da embarcação quanto a tripulação tiveram que assinar termos de confidencialidade, e uma grande barreira de metal foi erguida no porto italiano para bloquear a visão do barco. Quem frequenta o local admite que é algo inédito.

Iate Scheherazade, suposta propriedade do presidente russo Vladimir Putin (Foto: Creative Commons)

Corrupção no governo Putin

Segundo a equipe de Navalny, o iate é mais uma prova da corrupção no governo Putin, vez que o valor da embarcação é incompatível com os ganhos do presidente. Oficialmente, o salário dele era de US$ 136 mil em 2020, e a declaração de bens à época registrava apenas um modesto apartamento, dois veículos antigos produzidos ainda nos tempos de União Soviética e um trailer de camping herdado do pai.

Este não é o primeiro iate associado a Putin. Em fevereiro, duas semanas antes da invasão da Ucrânia por tropas russas, outra embarcação, esta de 82 metros de comprimento, deixou o porto de Hamburgo, na Alemanha, rumo a Kaliningrado, na Rússia. à época, a suspeita era de que o presidente movimentou o barco antecipando as sanções que seriam futuramente impostas a ele e a seus aliados.

As denúncias da equipe de Navalny contra os líderes russos começaram em 2017, feitas através da FBK, a fundação anticorrupção do oposicionista. Elas abrangem casos de corrupção desde o governo do então primeiro-ministro Dmitry Medvedev até casos recentes, de legisladores russos donos de propriedades cujos valores seriam incompatíveis com seus rendimentos.

A principal investigação da FBK revelou que Putin seria o proprietário de um “palácio” avaliado em US$ 1,3 bilhão. A megaconstrução teria, entre outros caprichos, uma pista de patinação no gelo e uma sala de pole dance. Embora a denúncia tenha partido da FBK, em janeiro do ano passado, outros veículos de imprensa independentes fizeram suas próprias investigações e confirmaram as acusações.

Por que isso importa?

Navalny ganhou destaque ao organizar manifestações e concorrer a cargos públicos na Rússia. A principal plataforma do oposicionista é o combate à corrupção no governo de Vladimir Putin, em virtude da qual ele uma cobra profunda reforma na estrutura política do país.

Em agosto de 2020, durante viagem à Sibéria, Navalny foi envenenado e passou meses se recuperando em Berlim. Ele voltou a Moscou em 17 de janeiro de 2021 e foi detido ainda no aeroporto. Um mês depois, foi julgado e condenado a dois anos e meio de prisão por violar uma sentença suspensa de 2014, sob acusação de fraude. Promotores alegaram que ele não se apresentou regularmente à polícia em 2020, justamente quando estava em coma pela dose tóxica.

Encarcerado em uma colônia penal de alta segurança, ele chegou a fazer uma greve de fome de 23 dias em abril de 2021, para protestar contra a falta de atendimento médico. Depois, em junho, um tribunal russo proibiu os escritórios regionais de Navalny e sua fundação, a FBK, de funcionarem, classificando-as como “extremistas”.

Em agosto do ano passado, a Justiça russa abriu uma nova acusação criminal contra o oposicionista, o que poder ampliar a sentença de prisão dele em três anos. Ele foi acusado de “incentivar cidadãos a cometerem atos ilegais”, por meio da FBK que ele criou.

Já em setembro de 2021, uma terceira acusação, por “extremismo”, ameaça estender o encarceramento por até uma década, sendo mantido sob custódia no mínimo até o fim da próxima eleição presidencial, em 2024, quando chega ao fim o atual mandato de seis anos de Vladimir Putin no Kremlin.

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