ONU reforça posição ocidental e diz que Rússia viola direito internacional ao anexar regiões ucranianas

Guterres acompanha posicionamento de Biden, Truss e Borrell e diz que ação de Moscou viola a Carta da ONU e o direito internacional

Nesta sexta-feira (30), o presidente russo Vladimir Putin assinou um decreto que oficializa a anexação pela Rússia de quatro regiões ucranianas invadidas pelas tropas de Moscou: Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhya. A assinatura foi acompanhada de um discurso e sucedida por uma cerimônia na Praça Vermelha. A ação foi inicialmente contestada pelo presidente norte-americano Joe Biden, pela premiê britânica Liz Truss e pela União Europeia (UE). Agora foi a vez de a ONU (Organização das Nações Unidas) manifestar oposição.

“Neste momento de perigo, devo enfatizar meu dever como secretário-geral de defender a Carta das Nações Unidas”, disse nesta sexta (30) António Guterres, chefe das Nações Unidas. “A Carta é clara. Qualquer anexação do território de um Estado por outro Estado resultante da ameaça ou uso da força é uma violação dos princípios da Carta da ONU e do direito internacional”.

As quatro regiões criam um corredor terrestre crucial entre a Rússia e a península da Crimeia, anexada por Moscou em 2014. Juntos, esse cinco territórios correspondem a aproximadamente 20% de toda a Ucrânia. No discurso que fez após assinar a anexação, Putin afirmou que o processo é “permanente” e “não negociável”.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin (Foto: Wikimedia Commons)

Moscou justifica a anexação com base em um “referendo” realizado nas regiões, cujos cidadãos teriam “votado” para manifestar sua opinião sobre se juntar ou não à Federação Russa. O processo de votação foi classificado internacionalmente como ilegal e esteve repleto de irregularidades. Foi manipulado por Moscou para dar um ar de legitimidade à anexação. Entre outros abusos, há denúncias de que cidadãos foram forçados a preencher as cédulas sob a mira de armas russas.

De acordo com Guterres, “os chamados ‘referendos’, realizados durante conflitos armados ativos, em áreas ocupadas e fora da estrutura legal e constitucional da Ucrânia, não podem ser considerados uma expressão genuína da vontade popular”. 

Josep Borrell, chefe da diplomacia da UE, usou sua conta no Twitter para condenar a ação russa. “A UE denuncia a realização de “referendos” ilegais e seu resultado falsificado. Esta é mais uma violação da soberania + integridade territorial da Ucrânia, em meio a abusos sistemáticos dos direitos humanos. Elogiamos a coragem dos ucranianos, que continuam a se opor e resistir à invasão russa”.

Biden também se manifestou sobre o “referendo” russo. “Os Estados Unidos nunca reconhecerão o território ucraniano como algo que não seja parte da Ucrânia. Os referendos da Rússia são uma farsa – um falso pretexto para tentar anexar partes da Ucrânia à força em flagrante violação do direito internacional, incluindo a Carta das Nações Unidas”, diz comunicado publicado pela Casa Branca

As palavras foram semelhantes às usadas pela primeira-ministra britânica Liz Truss. Ela também disse que o Reino Unido “nunca aceitará” as quatro regiões “como algo que não seja território ucraniano”. “Putin não pode alterar as fronteiras internacionais usando força bruta. Vamos garantir que ele perca esta guerra ilegal”, disse a premiê, de acordo com a agência Reuters.

Guterres reforçou sua posição. “Qualquer decisão de prosseguir com a anexação das regiões de Donetsk, Luhansk, Kherson e Zaporizhzhya da Ucrânia não teria valor legal e merece ser condenada”, disse. “Isso desrespeita os propósitos e princípios das Nações Unidas. É uma escalada perigosa. Não tem lugar no mundo moderno.   Não deve ser aceito”.

De acordo com o chefe da ONU, a decisão da Rússia “comprometerá ainda mais as perspectivas de paz” e prolongará os impactos da guerra na economia global, especialmente nos países em desenvolvimento. “Agora, mais do que nunca, devemos trabalhar juntos para acabar com essa guerra devastadora e sem sentido e defender a Carta da ONU e o direito internacional”, disse ele.

Sanções a caminho

A primeira reação do Ocidente foi impor novas sanções. Nesta sexta (30), o Departamento do Tesouro norte-americano sancionou 14 pessoas do complexo militar-industrial da Rússia, entre eles dois fornecedores internacionais, três líderes da infraestrutura financeira russa, familiares de altos funcionários estatais e 278 legisladores russos ligados aos “referendos’.

Entre os sancionados aparece Elvira Sakhipzadovna Nabiullina, presidente do Banco Central da Federação Russa (CBR) e ex-assessora de Putin. A mulher e a filha do ministro da Defesa Sergei Shoigu, este sancionado anteriormente, também entraram na lista, que inclui ainda a mulher do ex-presidente Dmitry Medvedev, outro que já estava sob sanção.

“Não vamos ficar parados enquanto Putin tenta fraudulentamente anexar partes da Ucrânia. O Departamento do Tesouro e o governo dos EUA estão tomando medidas radicais hoje para enfraquecer ainda mais o já degradado complexo industrial militar da Rússia e minar sua capacidade de travar sua guerra ilegal”, disse a Secretária do Tesouro Janet L. Yellen. 

As sanções significam que eventuais bens que os sancionados tenham nos EUA devem ser bloqueados e reportados às autoridades. Pessoas e entidades em geral são proibidas de negociar com os sancionados, medidas que praticamente os excluem do sistema financeiro global.

Segundo a rede CNN, dois senadores norte-americanos, o republicano Lindsey Graham e o democrata Richard Blumenthal, querem ampliar as sanções para que atinjam também as nações que eventualmente reconheçam as anexações. Eles redigiram um projeto exigindo que Biden corte imediatamente a ajuda econômica e militar a qualquer país que aprove o processo.

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